Amor pelos muçulmanos
Missionário brasileiro fala de seu trabalho no
Senegal e na Mauritânia
Paulo Roberto Bechara tem 40 anos
e há mais de 5 trabalha como missionário entre a população muçulmana do Senegal
e da Mauritânia. Filho de pastor, iniciou seus estudos teológicos na
Universidade Andrews, EUA. Em seguida, foi para a Áustria estudar a língua
alemã e dar continuidade aos estudos de Teologia. Completou a faculdade no
Brasil, iniciando seus trabalhos como pastor em Curitiba. Trabalhou
posteriormente no Instituto Adventista Cruzeiro do Sul, no Rio Grande do Sul, e
em Campo Grande, MS, de onde saiu para servir como missionário no Senegal,
África.
É
casado com Selma Augusta e tem três filhos: Aline Cristina, de 3 anos, Paulo Ricardo,
7, e Tiago Augusto, 8 meses (este nascido em Dakar, no Senegal).
Sinais: Como
são os países nos quais você trabalha?
Paulo Bechara: O Senegal, que foi colônia francesa até 1960, tem 9 milhões de
habitantes. Cerca de 95% dos senegaleses são muçulmanos. F um povo
extremamente hospitaleiro, mas fechado á religião. (3 islamismo, presente no Senegal desde 1300, é bastante peculiar ali, pois eles seguem
líderes espirituais locais, os marabus. Por isso, o lslã do Senegal é menos
ortodoxo, porém muito fervoroso. Os homens têm duas ou três esposas, mas há
uma tendência em não se aceitar mais a poligamia, especialmente por parte das
moças que estudam nas universidades. Por isso mesmo, os muçulmanos mais conservadores não concordam que as
mulheres estudem. Há 37 línguas no Senegal, das quais seis são reconhecidas
pelo governo. Na capital se fala francês.
Sinais: Como
foi seu preparo e adaptaçcio para o trabalho missionário?
Paulo Bechara: Aprendemos no campo missionário, inclusive a língua francesa. Atualmente
os missionários se preparam no Canadá. Tivemos muitos choques culturais, e
hoje rimos dos erros que cometemos. Precisamos ouvir as pessoas e aprender com
elas. Você às vezes pensa que tem as respostas para tudo dentro de sua cultura,
mas não é assim.
Sinais: Quais os maiores desafios em partilhar
o evangelho com os muçulmanos?
Paulo Bechara: É aprender que existem coisas a aprender com eles. Para dar seu
testemunho, você precisa estar disposto a ouvir o testemunho deles. Não estamos
contra o islamismo, estamos procurando pontes de ligação. Muitos muçulmanos
deixaram de ouvir o evangelho por causa de preconceitos e verdades ditas fora
do tempo. E quando o muçulmano suspeita que alguma coisa não está de acordo com
sua mentalidade, ele se fecha.
Os
muçulmanos acreditam no mesmo Deus que nós. Allah vem da mesma raiz de Elohim, em hebraico, traduzido na Bíblia
como “Deus”. Os árabes cristãos utilizam o mesmo termo Allah para Deus. Os
muçulmanos também acreditam que os anjos existem, acreditam nos profetas e nos
livros sagrados. Crêem que o dia do Julgamento virá e que devemos nos preparar
para ele. São fiéis na oração, no jejum e na hospitalidade. Praticam boas
obras, especialmente para com os desfavorecidos. A sexta-feira (Al-Jummah) é o dia da oração, mas o
sábado também está presente no Alcorão como o dia santificado por Deus e dia
de guarda para judeus, cristãos e “piedosos de hoje” [muçulmanos]. Os
muçulmanos também acreditam que Jesus foi um grande profeta. Creio que essas
são boas “pontes” entre nós e eles.
Sinais: O
que você tem aprendido com os muçulmanos?
Paulo Bechara: O respeito pelas horas de oração e a devoção. Os jovens, se não vão às
mesquitas, oram em casa. Para eles, a forma da oração é tão importante quanto
a oração em si mesma. Por isso, estamos tomando algumas providências a fim de
orar como eles. Também temos aprendido muito sobre o senso de comunidade e
partilha. Na fronteira entre o Senegal e a Mauritânia, vi algo incrível. Eu
tinha dois sanduíches preparados por minha esposa, e, quando estava para comer
um deles, um garotinho ficou me observando. Não resisti e dei o lanche para
ele. E foi ai que fiquei surpreso: uns trinta outros garotos apareceram e o
menino distribuiu pedaços para eles, ficando com o último pedaço para si.
Sinais: Como os muçulmanos vêem Jesus?
Paulo Bechara: Como profeta é perfeitamente
aceito. Mas ainda não aceitam Jesus como divino. Acredito que, como para os
discípulos foi um processo lento, em que o Espírito Santo trabalhou com eles
para que entendessem, Ele também está trabalhando com os muçulmanos nesse
sentido.
É
empolgante acompanhá-los na descoberta deste “Grande Profeta” chamado pelo
Alcorão de Jesus, filho de Maria, o Messias. Embora o Alcorão não defina o
termo “Messias” como a Bíblia o faz, títulos divinos são atribuidos a Jesus
naquele livro: “A Palavra de Deus” e “Espírito de Deus”. Pela ação do Espírito
Santo, muçulmanos estão descobrindo quem é Jesus através de uma busca que se inicia no Alcorão e se segue pela Taurat (Torah), Zaboor (escritos de Davi), os profetas e o Injil
(evangelhos). Por isso mesmo, temos usado o Alcorão como ponte para as
Escrituras, buscando respostas bíblicas dentro do Alcorão. Temos sido facilitadores
dessa busca, não focalizando as contradições logo de inicio.
Sinais: Que atitude os cristãos devem ter com os muçulmanos?
Paulo Bechara: Se queremos alcançar muçulmanos para o Messias através de um diálogo
frutífero, precisamos orar por eles fervorosa e sistematicamente. Alguns de
nós podem ir além: ler o Alcorão e encontrá-los onde eles estão, contando
histórias bíblicas a partir do livro deles, expressando verdades bíblicas com
uma linguagem corânica. A Bíblia abre espaço para escolhermos nossa postura de
oração de acordo com o contexto e o lugar onde estamos.
Para o
muçulmano, a forma de orar é tão
importante quanto a oração. Por que não orar com eles á sua maneira de se prostrarem? Porventura
ao verem nossos irmãos muçulmanos o exemplo de pessoas piedosas curvando-se
perante Deus corno eles o fazem, não poderiam ser levados pela fé, passo a
passo, em direção ao Messias enviado de Deus para nos salvar?
Outro
aspecto importante é o cultural.
Quando Jesus Se revelou como Messias à mulher samaritana, ela O aceitou
plenamente e decidiu ser Sua seguidora, dentro de sua própria cultura; e Jesus
a aceitou dessa maneira. Aliás, ela foi muito mais eficiente assim,
testificando de Jesus aos seus conterrãneos numa linguagem entendida por eles.
Acreditamos que o mesmo princípio se aplica aos dias de hoje. O muçulmano toma
decisões baseado na comunidade. Nesse contexto, a decisão da comunidade é mais
importante do que a decisão individual. No passado, ao recebermos um muçulmano
na comunidade cristã, nós o encorajávamos a mudar de nome, de roupa e de
mentalidade. Tomando-se cristão, ele se desligava de todo vinculo com sua comunidade
anterior e se tomava persona non grata, um
marginalizado para sempre. Hoje estamos aprendendo que se houver respeito pela
sua mentalidade e a cultura local, e um muçulmano aceitar a Jesus Cristo como Messias e Senhor, pela graça de
Deus, é possível ser uma testemunha fiel e eficiente (sem comprometer a
verdade) dentro de sua própria comunidade, como o foi a mulher samaritana.
Dentro de uma cultura, somente elementos que contradizem o evangelho devem ser
colocados de lado; os outros podem ser mantidos, pois fazem parte da pessoa e
da comunidade local.
Uma
pergunta relevante para missionários no além-mar e missionarios em sua
própria terra: “Quanto do evangelho que prego hoje é o evangelho puro e quanto é minha própria cultura ‘de carona’ com o
evangelho?” Deus ama a todos os povos. A peculiaridade e beleza de grupos
étnicos ao redor do mundo, suas culturas e mentalidades
diversas são um reflexo do amor de Deus — o Deus que não faz diferença
entre as pessoas.
Sinais: O distanciamento do cristianismo popular em relação à Bíblia também
se constitui numa barreira?
Paulo Bechara: Sem dúvida. Para nos cristianismo é algo maravilhoso; para eles, éum mau exemplo de pessoas que bebem e comem carnes
imundas. Por isso, estamos tentando levá-los a Cristo, dizendo: “Sejam
muçulmanos como vocês são e não joguem fora esse fundamento que têm,
construam sobre esse fundamento. Sejam muçulmanos messiânicos.”
Sinais: Qual
o momento mais feliz e o mais difícil nesses seus cinco anos e meio de ministério
na África?
Paulo Rachara: O momento mais difícil foi nossa adaptação á
cultura local, especialmente no inicio. E o momento
mais feliz foi a inauguração da Casa de Oração em Kolda, no sul do Senegal. No
dia 9 de setembro do ano passado, cerca de 50 muçulmanos vieram de várias
partes da cidade de Kolda para orar e adorar a Deus conosco. Retiramos nossos
calçados para entrar na Casa de Oração e nos assentamos em tapetes de plástico
para ouvir a pregação da Palavra de Deus. Cada sábado de manhã e outras vezes
na semana, nos prostramos em oração e nos reunimos para a adoração de Allah. É
impressionante ver como os muçulmanos nos olham como crentes tementes a Deus
quando damos alguns passos em direção ao coração deles.
CONTATO
Profissionais
da Área médica ou outras áreas que queiram ser voluntários por uma semana, um mês ou um
ano, ou queiram ajudar de
outra forma, podem entrar em contato com o pastor Paulo Bechara pelo e-mail: paulo.bechara@usa.net.
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