O Jesus
Real
Teorias que negam que o Jesus da história e o Cristo da fé
sejam o mesmo personagem não têm
fundamento.
Rorigo Pereira
da Silva
Teólogo
Jesus não
nasceu em Belém, a ressurreição não aconteceu de verdade e a maior parte dos
evangelhos não passa de mito! Esta foi a tese de alguns teólogos do século 18,
que, usando métodos e críticas racionalistas, duvidavam da veracidade histórica dos quatro evangelhos cristãos.
Mateus, Marcos, Lucas e João seriam, nessa ótica, meros
roteiristas de uma novela que teria pouco ou nada a
ver com a realidade dos fatos.
De tempo em tempo, o debate acerca de Jesus volta à tona em muitos
círculos acadêmicos. Hoje, com o alcance da midia, o assunto acabou saindo do
rol de especialistas e ganhou terreno na sociedade. Afinal, a história de
Jesus ainda é um tema que mexe com muita gente. Sua doutrina influencia direta
ou indiretamente mais de dois bilhões de pessoas em todo o mundo. Só o Natal,
festa mais popular do cristianismo, movimenta cifras capazes de enlouquecer
qualquer calculadora.
Mas o que poderia ser dito dessa onda de ceticismo em relação aos
evangelhos? Seria a Bíbia apenas um conjunto de lendas com a finalidade de
fazer os crentes acreditarem em fatos que jamais existiram? E curioso o número
cada vez maior de “céticos” que gastam sua vida escrevendo sobre Jesus. Mesmo
negando Sua história ou descrendo de Sua mensagem, eles parecem ser os maiores
aficcionados do Mestre de Nazaré, pois a energia que desprendem discutindo e
montando semináros sobre os evangelhos chega a ser maior do que a de muitos
religiosos de carteirinha. Nem mesmo os Beatles, Elvis ou Hitler tiveram fãs e
inimigos tão dedicados. Pena que suas conclusões não sejam tão razoáveis quanto
seu empreendimento.
Seminário de Jesus — É provável que, dentre os mais conhecidos fõruns de debate promovidos pelos
questionadores da Bíblia, nenhum seja tão famoso e agitador quanto o Jesus Seminar, ou Seminário de Jesus,
realizado duas vezes por ano na América do Norte. Iniciado em 1985 por Robert
W. Funk, professor e fundador do Instituto Teológico Westar da Califórnia, o
Seminário de Jesus já reúne mais de cem membros dispostos a separar, como eles
mesmos dizem, o joio do trigo em termos de conteúdo bíblico, ou seja, apontar o
que é e o que não é histórico em se tratando da vida de Jesus Cristo. Eles
querem “libertar” Jesus dos “mitos”.
Contrariando, porém, sua pretensão acadêmica e sua promessa de imparcialidade,
os membros do Seminário assumem muitas vezes posições tendenciosas que se
valem de métodos altamente questionáveis. Mesmo assim, suas declarações
mescladas de dúvida e sensacionalismo jornalístico acabam influenciando
leitores no mundo inteiro. Nos últimos anos, vários jornais e revistas têm
feito reportagens inspiradas na mesma filosofia cética do Seminário de Jesus,
ainda que esse nome não figure explicitamente em suas
páginas.
Na prateleira dos best-sellers, são
muitos os autores que constroem seu enredo na base da dúvida e do criticismo.
Um exemplo disso foi o lançamento do livro Uma História de Deus, de Karen Armstrong. Nele, a autora
afirma que os evangelhos foram produzidos 40 anos após a morte de Cristo e
que seu conteúdo é uma mistura de poucos fatos históricos e muitos elementos
míticos. Em sua opinião, é este o significado básico que o evangelho nos
apresenta: uma teologia mitológica sobre o Messias e não uma descrição real
dos fatos como aconteceram. O Dr. Paul Barnett, um dos mais hábeis defensores
atuais do Jesus histórico, alerta que “o cristianismo está no momento
enfrentando um de seus mais profundos desafios”. Calcula-se que, da década de
1980 para cá, foram publicados mais de 300 livros e artigos tentando
“redefinir” o Jesus histórico.
Neste mesmo barco da incredulidade encontram-se nomes conhecidos da
teologia como John Dominic Crossan, Robert Eisenman, Haim Cohn e outros que
têm seus livros disponíveis em muitos idiomas, inclusive o português. Sua
análise, contudo, parece muitas vezes uma vitamina de credulidade misturada
com ceticismo, pois defendem a doutrina de Jesus (muitos deles são religiosos)
sem valorizar a história que a sustenta.
Ora, e justamente ai que reside uma amostra de como determinados autores cometem o erro de avaliar a Bíblia com óculos exclusivamente
modernos e ocidentais, ignorando por completo as raízes do tempo e lugar em
que ela foi escrita. Na Grécia e no Oriente Antigo, a palavra evangelho era um termo técnico usado desde Homero para indicar basicamente duas coisas: “boa
noticia” (principalmente sobre vitórias militares) e “recompensa pela boa
noticia”.
No ano 9 a.C., evangelho já era
um termo comum usado em documentos oficiais da Ásia para indicar fatos históricos
como o nascimento de Augusto e o inicio do ano civil. Transformado em estilo literário, evangelho passou a ser uma narrativa que demanda
uma história real por detrás de sua mensagem. Logo, seria forçar o seu
significado
original entendê-lo como novela, parábola ou mito teológico.
Se um judeu, grego ou romano dos
dias de Cristo avançasse no tempo e ouvisse hoje o significado mitológico que
muitos dão à palavra evangelho, ele
certamente estranharia esse conceito. Seria o mesmo que definir o sal como “um
elemento que adoça os sucos”. Ou seja, algo totalmente sem sentido.
Em busca de
evidências — Não é somente de
críticos que se alimenta a bibliografia de Jesus Cristo. Autores como Otto
Borchert, Randall Price e Vitório Messori são alguns dos muitos que ainda
defendem a realidade histórica dos evangelhos. Escrito por vários especialistas,
o recém-lançado Essential Jesus
(Jesus Essencial), sem tradução para o português, é um livro que promete
incomodar os críticos e questionadores, pois fala da Bíblia como livro autêntico
em nada mitológico ou digno de correção.
Para quem não lê em inglês, uma boa dica é o lançamento no Brasil do
livro Em Defesa de Cristo. Seu autor Lee Strobe1, foi por muitos anos ateu e
jornalista investigativo do Chicago
Tribune. Através de entrevistas com os maiores especialistas em arqueologia,
história e línguas antigas, ele investiga detidamente
as provas em favor da existência de Jesus Cristo.
Suas conclusões são simplesmente
fascinantes.
Quanto aos
céticos, é fácil encontrar o motivo racional de seus questionamentos. A história de
um homem que em sã consciência se declara Deus, multiplica pães para milhares,
anda sobre as águas e ainda ressuscita dentre os mortos parece fantástica
demais para a mente de alguns. Mas e quanto aos acadêmicos que ainda insistem
em acreditar nos evangelhos? Em que baseiam sua certeza?
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TRÊS
TESTEMUNHOS
“Escrever a assinatura humana no próprio Tempo, por um nome humano no
cume de sucessivos séculos, é uma façanha maravilhosa. César não conseguiu, nem
Shakespeare, nem Newton. A genialidade é incapaz de conseguir este feito; a
espada é incapaz. Mas este judeu [Jesus] conseguiu.”
W. H. Fitchett, em The Unrealized Logic of Religion (Londres:
Epworth, 1922)
‘Um homem que fosse só um homem, e dissesse as coisas que Jesus disse, fio
seria um grande mestre de moral: seria ou um lunático, em pé de igualdade com
quem diz ser um ovo cozido, ou então seria o Demônio. Cada um de nós tem de optar por uma das alternativas possíveis. Ou este homem era, e é, o Filho de Deus,
ou então foi um louco, ou algo pior.”
C. S. Lewis, em Cristianismo Puro
e Simples (São Paulo: ABU, 1992)
“Eu devo admitir que Jesus modificou muitas de minhas rudes e impalatáveis
noções sobre Deus. Por que eu sou um cristão? Algumas vezes eu me pergunto, e para ser honesto as razões se
reduzem a duas: (1) a falta de alternativas e (2) Jesus. Brilhante, indomável,
suave, criativo, esperto, irredutível, paradoxalmente humilde, Jesus está acima
do escrutínio. Ele é quem eu quero que o meu Deus seja.”
Philip Yncey, em The Jesus I Never Knew (Grand
Rapids: Zondervan,
1995)
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Em primeiro lugar, eles se baseiam na fé, que é um elemento importante no
processo do entendimento. Como disse Anselmo, um teólogo escolástico da Idade
Média, “não procuro entender para crer, mas creio para depois entender; pois
creio de tal modo que, se não cresse, não entenderia”. De fato, mesmo o
pesquisador mais cético deve admitir que sua análise sempre encontrará
elementos que fogem à investigação e necessitam ser aceitos pela lógica
imaginativa, que é um tipo de fé.
Há. porém, outros elementos que podem ser verificados e acabam
contribuindo tremendamente para a confiança no relato dos evangelistas. Logo,
não há nenhuma dívida da fé em relação à racionalidade. Há apenas aqueles
que, mesmo em face de evidências, insistem no vício da negação.
Nas pegadas de Jesus — São muitas as evidências que
ajudam a estabelecer a confiança na história de Cristo. Veja algumas delas:
Preservação do texto original.
Existem hoje cerca de 5.300 manuscritos gregos do Novo Testemento,
8.000 da
Vulgata Latina e 9.300 de outras versões primitivas. Segundo a papirologia (que
estuda documentos antigos), esse é um número muito mais abundante para se
trabalhar do que o segundo mais autenticado documento da antiguidade, que é
a Ilíada
de Homero, da qual só restam 643 manuscritos.
• Existência de Jesus. Referências a
Jesus Cristo são feitas em documentos bem preservados do 1o.
século. Historiadores e políticos romanos como Suetônio, Tácito, Trajano e Plínio
O mencionam pelo nome. E fontes judaicas como o Talmude e Josefo também
parecem aludir à Sua pessoa.
• Fatos comprovados. Várias práticas
descritas nos evangelhos estão hoje confirmadas pela História como
procedimentos reais de 10 século. O censo romano, os impostos e o crurifragíum (quebrar ossos para apressar a morte de um crucificado) são apenas alguns
exemplos.
• Precisão histórica. A descrição
geográfica e política do relato de Lucas é, na opinião de. muitos especialistas,
tremendamente precisa. Mesmo os questionadores admitem isso. Suas referências
a 32 paises, 54 cidades e 9 ilhas não possuem um erro sequer. Seu relato,
segundo o arqueólogo John McRay está mais para um dossiê jurídico do que para
um enredo novelístico.
• Honestidade literária. Para se
tornar uma obra mitológica, os evangelhos precisariam ser bastante modificados
em seu conteúdo atual. Eles contam de um Cristo que teme a própria morte,
conversa com mulheres em público, proclama-Se Deus num ambiente judaico e ainda
termina pendurado numa cruz. Ora, esses não eram, na época, elementos muito
atrativos para uma narrativa mitológica
que se pauta pelo exagero e a ocultação de qualquer coisa que pudesse
escandalizar os leitores.
• Personagens descobertos. Vários nomes citados nos evangelhos, que foram por
algum tempo considerados fictícios pelos críticos, têm sua realidade histórica comprovada pelos arqueólogos.
Herodes, Pilatos, Caifás e João Batista são alguns dos que já saíram da lista
de mitos idealizada pelos questionadores.
Pelo visto, o debate sobre Jesus promete ser longo e cada vez mais intenso.
Hoje, mais do que nunca, procede repetir a pergunta do Mestre direcionada a
Seus discípulos: “Quem dizem as pessoas que é o Filho do homem?” E,
depois de algumas respostas, a mais importante de todas as perguntas: “E
vós, quem dizeis que Eu sou?”
Como disse o próprio Jesus, em João 8:24, se não
crermos que Ele é quem diz ser, morreremos todos em nossos pecados.
Sinais dos Tempos
Novembro-Dezembro/2002
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