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domingo, 10 de agosto de 2014

ENTREVISTAS - ADRA E O APOIO AOS NECESSITADOS


Charles Sandefur

Amor Compartilhado


Líder comunitário conta como o ideal cristão tranforma-se em assistência e desenvolvimento em 125 países


Crada em 1956, nos Estados Unidos, a Adra (Agência Ad­ventista de Desenvolvimen­to e Recursos Assistenciais) é unia organização sem fins lucrativos que atualmente está presente em 125 países, inclusive no Brasil. Realiza ati­vidades múltiplas, como a prestação de socorro emergencial em casos de de­sastres naturais, e a implantação de projetos de desenvolvimento comuni­tário em regiões carentes. Em 2001, ela aplicou 74 milhões de dólares em pro­gramas de assistência e desenvolvi­mento, beneficiando 30 milhões de pessoas. Durante uma recente passa­gem pelo Brasil, Charles Sandefur, que assumiu a presidência mundial da en­tidade em março, falou à revista Sinais sobre os desafios e a filosofia que nor-teia o trabalho da agência.

Sinais: Cristo afirmou que o evangelho devena ser pregado a todo o mundo e então viria o fim. Por que, alein de evangelizar, o cristão precisa se preocu­par com os problemas sociais?
Sandefur: Além de pregar o evangelho, Cristo nos pede para demonstrar Seu amor e agir do modo como agiu. Isso significa servir aos pobres, curar os doentes e atender às necessidades das pessoas. O cristão prega por meio de palavras e ações. Essa é a razão por que a Adra procura mostrar esse amor ao redor do mundo. Acreditamos que isso é parte da proclamação do caráter de Deus. Mostrar como Deus é signifi­ca demonstrar o Seu amor na prática.

Sinais: Desde Platão, filósofos e pensadores idealizam sociedades justas. Hoje mais de 1,3 bilhão de pessoas vivem com menos de um dólar por dia. A pobreza tem solução?
 Sandefur: A solução está além da capaci­dade humana. Deus não espera que todo o pecado e o efeito do pecado se­jam eliminados antes da volta de Jesus. Não iremos solucionar todos os proble­mas do mundo. Mas isso não nos impe­de de fazer tudo o que pudermos para aliviar o sofrimento humano. Sempre haverá pessoas doentes, mas isso não significa que não devamos manter hos­1 pitais. Contudo, podemos também olhar o cenário por um prisma positivo. Embora haja um bilhão de pessoas vi­vendo com menos de um dólar por dia, há muito mais pessoas fora da pobreza agora do que em qualquer outra época.

Sinais: Se a pobreza não tem solução hu­mana definitiva, o que os cristãos po­dem fazer hoje para cumprir a ordem de Cristo: “Vende os teus bens, dei aos pobres... e segue-me” (Mat. 19:21)?
Sandefur: Temos a tendência de ignorar muitas coisas que Jesus ordenou Essa frase é uma das que os cristãos gostam de ignorar. Mas ela se encontra na Bíblia e se aplica a nós. Deve­mos servir nossos semelhantes de todo o coração. Não devemos nos en­riquecer às custas dos pobres. Deve­mos ser administradores generosos dos próprios bens, vivendo uma vida modesta, em simplicidade, para que possamos compartilhar nossos talen­tos e bens com os outros.

Sinais: crentes que relacionam a po­breza à ausência das bênçãos divinas. O que o senhor pensa sobre isso?
Sandefur:    Deus não considera quanto dinheiro você tem. Ele olha para o co­ração. Temos a tendência de avaliar as pessoas pelo que possuem, o seu em­prego, o salário que recebem, e às x’e­zes a sua fé e o tanto de dinheiro que dão à igreja. Deus, porém, não leva nada disso em consideração. Ele amou a viúva que tinha apenas duas moedas tanto quanto amou a José de Arimatéia ou Nicodemos, que eram ricos.

Sinais:  Jesus nos aconselha a fazer o bem com a maior discrição possível. Mas sem o marketing social, o trabalho de entidades corno a Adra fica bastante li­mitado. Como conciliar essa questão?
 Sandefur: Quando você menciona o que 1 unia entidade está fazendo em favor dos pobres, você se refere ao que um grupo está fazendo. Creio que Mateus 6:3 (“Não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita”) significa que não devemos nos gabar acerca de algo que fizemos pes­soalmente. Isso nos protege do orgulho. Mas quando deixamos o mundo, a igre­ja, os vizinhos e os doadores saberem o que estamos fazendo, estamos lhes ofere­cendo uma oportunidade de ajudar. Es­tamos mostrando o que as pessoas fazem em resposta ao chamado de Deus e o que Deus faz por intermédio delas.

Sinais: Nos ultimos anos, enquanto a re­gulamentação dos Estados diminuiu na sociedade, cresceu a atuação de entida­des  filantrópicas. Como a Adra se situa nesse processo?
Sandefur :  A realidade comprova que as organizações sem fins lucrativos, prin­cipalmente as organizações cristãs, ofe­recem elementos adicionais, corno amor e dedicação, que tomam o traba­lho mais eficiente. Em Papua-Nova Guiné, por exemplo, o governo está re­conhecendo cada vez mais a necessida­de das igrejas se envolverem no cuida­do da sociedade. É o que a Adra sabe fazer muito bem. Existem outras orga­nizações que talvez tenham uma equi­pe mais sofisticada e prédios maiores. Mas ninguém faz um trabalho mais impressionante e eficiente do que a Adra, em nível local. Os adventistas do sétimo dia têm mais de 100 mil igrejas ao. redor do mundo, fato que permite uma boa articulação local. E os gover­nos não conseguem fazer isso.

Sinais:       Grande parte dos recursos da Adra Internacional, pelo relatório de 2001, vem do governo norte-amencano. As entidades filantrópicas religiosas pre­cisam ter critérios e cuidados especiais para se relacionar com os políticos?
Sandefur:  Pelo menos 20 governos ao re­dor do mundo fazem doações para pro­jetos da Adra. Acreditamos que isso re­presenta uma tremenda oportunidade, pois ajuda nosso ministério a se expan­dir. É por isso isso que aceitamos de bom grado, quando adequado, recursos governamentais para desenvolvermos algo mais do que simplesmente doação de alimento ou de dinheiro. Somos do­tados de talentos concedidos por Deus e tornamos o dinheiro do governo efi­caz no auxílio á comunidade. Mas esta­mos conscientes de que jamais pode­mos sacrificar ou comprometer nossos valores cristãos. Isso significa que nem sempre aceitamos toda oportunidade que nos é apresentada. Elas devem se enquadrar em nossa missão. A distin­ção entre Igreja e Estado deve ser man­tida, mas isso não impede a cooperação em áreas de interesse comum.

Sinais:       Muitas entidades filantrópicas, como a Adra, seio ligadas a alguma deno­minação religiosa. A seu ver; algum pro­blema em associar assistência social com proselitismo? Qual é a postura da Adra?
Sandefur: Precisamos ter alguns cuida­dos. O auxilio humanitário faz parte de um testemunho abrangente da igreja. Não devemos prestar assistência sim­plesmente como um expediente de re­lações públicas, para que as pessoas gostem de nós. E jamais devemos pres­tar auxílio humanitário apenas como uma forma de atrair pessoas à igreja. Se Deus nos amou incondicionalmente, devemos amar as pessoas de maneira incondicional também. Não podemos exigir que ninguém se torne cristão a fim de podermos ajudá-lo. Fornece­mos alimento porque as pessoas preci­sam dele; fornecemos vacinas porque elas precisam de vacinas. Porém, quan­do nos perguntam por que fazemos isso, nossa primeira resposta é que o fazemos por causa do amor de Jesus.

Sinais:       Entre os 125 países em que a Adra está presente, que regido represen­ta o maior desafio para a entidade?
Sandefur: Um dos maiores desafios atualmente está na África. Os índices de alfabetização e a renda per capita são extremamente baixos. E agora há uma nova situação que ultrapassa to­das as outras: a Aids. Ela cresce assus­tadoramente. Na maioria dos países, durante os últimos 10 anos, a longe­vidade foi reduzida em 15 ou 20 anos. Existem vilarejos onde pratica­mente todos os adultos morreram e só as crianças sobrevivem. Nesses lu­gares, a Adra procura renovar a espe­rança e mostrar o amor de Deus. Além disso, trabalhamos na preven­ção. Esse se tornou nosso novo e grande desafio, em nível mundial.

Sinais: Como tem sido a relação com os países de governo islâmico?
Sandefur: Tive a oportunidade de visitar dois países muçulmanos nos últimos meses. No Azerbaijão, na Ásia Central, há bem pouca presença cristã. Ali esta­mos realizando programas de saúde e de microempresas, e dirigimos duas escolas vocacionais, com aproximada­mente mil alunos. Dissemos às autori­dades governamentais que somos cris­tãos e não estamos ali para fazer prosélitos. Pretendemos compartilhar nossa preocupação pelo bem-estar das pessoas. O governo nos estendeu as  boas-vindas, embora cautelosamente.
Há alguns países muçulmanos onde ainda não temos presença alguma, mas espero que num futuro breve a Adra consiga se estabelecer neles, por­que nossa missão não exclui ninguém. Trabalhei em um pais muçulmano du­rante quatro anos e fiz muitos amigos.

Sinais: Varias universidades no mundo, algumas em convênio com a Adra, ofe­recem cursos de MBA em filantropia. Na atualidade, ter boa vontade não é mais suficiente para fazer o bem?
Sandefur: O trabalho da Adra é muito especializado. E proporcionamos qualificação porque cremos que a educação superior ajuda a pessoa a ter mais eficiência no trabalho. Meu sonho é ver jovens ingressarem no serviço humanitário. Temos ajudado a patrocinar o estudo de alguns jo­vens pois cremos que uma boa educa­ção faz grande diferença.

Sinais: As pessoas que vivem na pobreza têm necessidades urgentes, mas que nascem de problemas estruturais com­plexos. É possível buscar soluções para essa dupla exigência?
Sandefur: Essa é a diferença clássica en­tre desenvolvimento e assistência. As­sistência é um trabalho imediato. Por exemplo, prestar assistência para ame­nizar os efeitos de uma calamidade como um furacão, ou uma desastrosa queda na situação econômica de um pais. A Adra executa serviços assisten­ciais no mundo inteiro. E seria fácil fa­zer só esse tipo de trabalho. Mas nós também queremos fazer programas e projetos a longo prazo, que realmente causarão impacto na vida de alguém. Gastamos a maior parte de nossos re­cursos e tempo em desenvolvimento —  projetos de longo prazo e de longo al­cance. Visitei um deles no Brasil: um núcleo de apoio à criança. Elas são acompanhadas por vários anos. Isso é desenvolvimento. É o que causa verda­deira mudança na vida das pessoas.


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