Embora o Concilio de Nicéia tenha
proclamado que Jesus era plenamente Deus, a igreja ainda precisava compreender
sua natureza humana. De que maneira o humano e o divino se inter-relacionavam
no Filho?
A resposta viria por meio de um dos
mais exaltados jogos de poder da igreja.
Conforme a igreja crescia, as
principais cidades do império recebiam influência teológica (e, por causa
disso, seus arcebispos foram chamados patriarcas). Alexandria e Roma geralmente
ficavam no mesmo lado das questões, opondo-se a Antioquia e Constantinopla. A
combinação de política e teologia era algo especialmente poderoso.
A influência grega permeava os pensamentos
da Escola Alexandrina. Muitas pessoas de Alexandria tinham um histórico
filosófico de origem grega. Teológicamente, acreditavam que Jesus fora
plenamente humano, mas eles tinham a tendência de enfatizar mais o Cristo como
Palavra divina (Logos) que o Jesus humano. Quando essa questão era
levada ao extremo, existia a tendência de obscurecer a humanidade de Jesus a
favor de sua divindade. Apolinário, um dos principais defensores de Alexandria,
lutara bravamente contra heresias como o arianismo e o maniqueísmo. Contudo,
cometeu um deslize, equivocando ao afirmar que, na encarnação, o Logos divino
substituíra a alma humana, de modo que a humanidade de Cristo fora apenas
corpórea. Em 381, o Segundo Concilio Ecumênico condenou esse ensinamento.
A Escola de Antioquia apresentava a
tendência de se concentrar na humanidade de Jesus. Embora Jesus fosse divino,
eles diziam que sua humanidade fora completa e normal.
Ao envolver-se em uma disputa sobre a
veneração de Maria, Nestó-rio, patriarca de Constantinopla, atacou a oposição
de Apolinário. Para ele, a idéia de que Maria fora a "Portadora de
Deus" era muito parecida com a idéia de Apolinário. Cirilo, patriarca de
Alexandria, ansioso por abalar o poder de Constantinopla, acusou o patriarca de
dizer que Jesus tinha duas naturezas distintas em seu corpo.
Em 431, no Terceiro Concilio
Ecumênico em Efeso, o maquinador Cirilo conseguiu que Nestório fosse deposto
antes que ele e seus amigos pudessem chegar ao local das reuniões. Quando os clérigos
ausentes chegaram, condenaram Cirilo e seus seguidores sob a liderança de João,
o patriarca de Antioquia. O imperador Teodósio, que convocara o concilio, foi
pressionado e terminou por exilar Nestório.
Adicione a essa situação volátil um
clérigo que levava a ênfase alexandrina às últimas conseqüências. Eutíquio,
chefe de um mosteiro próximo a Constantinopla, ensinava uma idéia que passou a
ser chamada monofisismo (de mono, "um", e physis, "natureza").
Esse ponto de vista sustentava que a natureza de Cristo estava perdida na
divindade, "assim como uma gota d'água que cai no mar é absorvida por
ele".
O patriarca Flaviano de Constantinopla
condenou Eutíquio por heresia, mas o patriarca Dióscoro, de Alexandria, o
apoiou. A pedido de Dióscoro, Teodósio convocou outro concilio, que se reuniu
em Efeso, em 449. Esse concilio proclamou que Eutíquio não era herege, mas
muitas igrejas consideraram esse concilio inválido. O papa Leão ι rotulou
aquele encontro de "Sínodo de Ladrões" e, atualmente, ele não é
considerado um concilio ecumênico válido.
Leão pediu ao imperador que convocasse outro
concilio de modo que a igreja, como um todo, fosse representada. Esse concilio
aconteceu na cidade de Calcedonia, próxima de Constantinopla, no ano de 451,
atraindo cerca de quatrocentos bispos, freqüência superior à de qualquer outro
concilio já realizado até aqueles dias. Dióscoro sempre foi uma figura um tanto
sinistra. Agora, nesse concilio, ele foi excomungado da igreja com resultado de
suas ações no "Sínodo de Ladrões".
Durante o Concilio de Calcedonia foi
lida uma afirmação sobre a natureza de Cristo, chamada tomo [carta
dogmática], de autoria do papa Leão i. Os bispos incorporaram seu ensinamento à
declaração de fé que foi chamada de Definição de fé de Calcedonia, Nessa
Definição defé, Cristo "reconhecidamente tem duas naturezas, sem
confusão, sem mudança, sem divisão, sem separação [...] a propriedade
característica de cada natureza é preservada e se reúne para formar uma
pessoa". Essa concepção condenava as idéias de Apolinário e Eutíquio, além
das posições atribuídas a Nestório.
Calcedonia foi o primeiro concilio no qual o
papa exerceu papel importante. Cada vez mais o foco da batalha seria entre Roma
e Constantino-pla. Calcedonia foi o último concilio que tanto o Ocidente quanto
o Oriente consideraram oficial, com relação à definição dos ensinamentos
corretos. Esse também foi o último em que todas as regiões foram representadas
e conseguiram concordar em questões fundamentais.
Embora Calcedonia não tenha resolvido
o problema de como Jesus era tanto Deus quanto homem, esse concilio estabeleceu
limites ao definir como incorretas certas interpretações. O concilio, ao
referir-se à posição adotada por Apolinário e Eutíquio, disse: "Qualquer
que tenha sido a maneira como isso ocorreu, sabemos que não aconteceu dessa
maneira".
FONTE : OS 100 ACONTECIMENTOS MAIS IMPORTANTES DO CRISTIANISMO
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