Na edição anterior vimos que o Apocalipse foi escrito
num momento crucial da história do cristianismo. O fim do primeiro século se
aproximava e a grande maioria daqueles que haviam conhecido pessoalmente a
Jesus já não estavam vivos. Do corpo apostólico, apenas João ainda vivia, mas
não por muito tempo mais, em vista da idade avançada.
Duas situações adversas colocavam em risco a
estabilidade e o progresso da Igreja. De um lado, estava o insidioso gnosticismo,
com sua atraente proposta de posse da verdadeira vida por meio da gnosis, ou
o conhecimento dos mistérios de Deus e de Seus propósitos. Ele fazia suas incursões
e ganhava a cada dia novos adeptos dentre professos cristãos. A verdadeira fé
estava sendo minada, e muitos simplesmente não se apercebiam do perigo.
Encantavam-se com a idéia gnóstica de possuírem uma alma imortal, e com a
perspectiva de, pela morte, terem-na libertada para o desfruto pleno da
imortalidade. Assim perdiam de vista o único recurso de salvação.
A Igreja necessitava de uma nova “revelação de Jesus
Cristo” como Senhor da glória e Salvador exclusivo. Essa revelação se tornou
possível com o Apocalipse (ver Apocalipse 1:1). Esse livro faz coro com o
restante do Novo Testamento ao afirmar que a única morte que nos liberta é a de
Jesus (Apocalipse 1:5). e que a ressurreição no dia de Sua vinda é o único
portal para a imortalidade (Apocalipse 20:6).
Outra situação, agora de caráter externo, igualmente
ameaçava a Igreja: a intolerância imperial. Os fogos da perseguição já se
avivavam, e a Igreja necessitava de um novo fortalecimento tal como apenas a
mensagem do Apocalipse poderia oferecer.
CULTO AO IMPERADOR
Um dos últimos imperadores de Roma, no primeiro século,
chamava-se Domiciano. Entre outros abusos, ele reacendeu a prática do culto ao
imperador, intensificando urna situação que inevitavelmente resultou em
perseguição contra os seguidores de Cristo. A partir do segundo Século a.C., quando os exércitos romanos avançaram
com suas campanhas para a formação de um grande império, já deparavam uma
variedade de cultos e crendices religiosas. Cada nação conquistada possuía seus
próprios deuses, a quem adorava de forma específica. Cedo os conquistadores
entenderam que a tolerância religiosa seria conveniente, desde que
condicionada ao reconhecimento da “divindade” de Roma.
Com o tempo, o culto a Roma foi suplantado pela adoração
aos imperadores mortos, e então àquele que exercia o domínio. Com isso, os
romanos alegavam que, muito ao contrário de proibirem o culto local, estavam na
verdade incrementando-o. Mas o que de fato queriam era a unificação religiosa e
política do Império
Tal condição foi acatada como verdadeiro privilégio na
região da Asia Menor, cujos habitantes devotavam grande estima pelos
mandatários romanos. Em 195 a.C., um templo foi levantado em Esmirna em homenagem
à deusa Roma. No ano 29 a.C., sob a liderança de César Augusto, outro templo
foi erigido, agora em Éfeso, para a adoração conjunta de Roma e Júlio César,
enquanto que um terceiro era construído em Pergamo em homenagem ao próprio
Augusto.
Tibério sucedeu a esse imperador e foi substituído, em 37
d.C., por Calígula um desequilibrado mental que pretendeu deificação absoluta.
Após a morte de Calígula em 41, o culto ao imperador caiu em desuso, até que
Domiciano, 40 anos mais tarde, começou a reinar, e o reativou. Suetônio,
historiador romano, registra que Domiciano expedia os decretos imperiais
encabeçando-os com os termos: “O vosso senhor e vosso deus Domiciano assim
ordena...”
APOIO
INDISPENSÁVEL
As províncias romanas da Ásia, precisamente onde agora
se localizavam as sete igrejas referidas no Apocalipse e às quais o livro foi
particularmente endereçado, novamente acataram com entusiasmo o referido
culto, e os cristãos ali defrontaram um momento critico. Na verdade, em todos
os lugares eles sofreram os efeitos da determinação imperial, e começaram a
ser perseguidos. Mas isso ocorreu, em especial, na Ásia. O momento era
realmente difícil. Como afirmamos, a Igreja entrava para o segundo século e
não podia então nem mesmo contar com o precioso apoio espiritual dos apóstolos,
já que quase todos estavam mortos. Restava apenas o idoso João. Mas como
receber nesse momento o apoio apostólico indispensável, se o único apóstolo
sobrevivente fora banido para a colônia penal de Patmos, justamente por
decreto de Domiciano, o perseguidor da Igreja?
Foi nessa hora decisiva que Deus atuou em beneficio do
Seu povo, dando a João as revelações que proveram o conteúdo do Apocalipse.
Fazia-se necessário um novo vislumbre do Cristo glorificado, um vislumbre que
viesse fortalecer a Igreja na certeza do Seu amor, sabedoria e poder.
Outorgando o Apocalipse, Deus deu à Sua atribulada Igreja um vislumbre das
realidades celestiais. Jesus transcendia em glória, majestade e poder,
infinitamente mais do que o maior imperador terreno. E o que era mais
importante, cristãos poderiam contar com o Seu desvelo, interesse, e direção.
Mesmo diante da morte não deveriam temer, pois o Senhor, a quem serviam, havia
triunfado sobre ela e sobre todos os demais inimigos. Esse triunfo pertencia
também a ele “Não temas as coisas que tens de sofrer... Sê fiel até à morte, e
dar-te-ei a coroa da vida” (Apocalipse 2:10).
AUXÍLIO ATUAL
Ser cristão hoje aparenta ser mais fácil que no tempo em
que o Apocalipse foi escrito. Afinal, não existe por ai nenhum rei ou
presidente reclamando adoração e serviço. Há liberdade de consciência e de
culto.
O verdadeiro cristianismo, porém, nunca contou nem
contará com o consentimento e o louvor do mundo, pois Satanás é o real
inimigo do povo de Deus em qualquer época ou lugar. As condições aparentemente
favoráveis do momento não perdurarão indefinidamente. O Apocalipse afirma que
poderes despóticos e antagônicos estarão de volta, e a intolerância e
perseguição contra os que desejam servir correta e fielmente a Deus
caracterizarão os últimos dias da História (ver os capítulos 12, 13 e 17).
É imperativo que nos familiarizemos agora com as
orientaçôes da Palavra de Deus, e que nos apoderemos deste maravilhoso
vislumbre de glória, poder e majestade divinos que o Apocalipse nos oferece.
Mais do que no passado, a certeza do amor de Jesus, a confiança de que os
propósitos de Deus estão sendo e continuarão a ser plenamente cumpridos, e de
que finalmente a Igreja estará vitoriosa no reino celestial, precisam ser constantemente
reafirmadas e consolidadas em nossa experiência cristã. Só assim estaremos
seguros e marcharemos triunfantes para
o glorioso dia da volta de Jesus a este mundo. Só assim teremos as promessas
apocalípticas de alegria e felicidade eternas plenamente cumpridas em nós e
para nós. Só assim constataremos que realmente o Apocalipse é auxílio divino
na hora certa.
Sinais dos Tempos
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