Que relação existe entre os membros
da igreja e seus líderes? De que maneira a igreja pode disciplinar os membros?
Essas são questões que a igreja deve abordar em qualquer época.
Em meados do século m, as respostas a essas
perguntas foram proferidas por Cipriano, que possuíra muita riqueza e nascera
pagão em uma família culta, por volta do ano 200. Quando se tornou cristão,
renunciou ao seu estilo de vida, doou seus bens e o dinheiro aos pobres e
assumiu o voto de castidade. Com relação à sua conversão, escreveu: "O
segundo nascimento fez de mim um novo homem por meio do Espírito soprado do
céu".
Professor de retórica e orador
famoso, o eloqüente e devoto Cipriano destacou-se entre os membros da igreja,
tornando-se bispo de Cartago por volta do ano 248.
Embora tivesse conhecimento dos
clássicos gregos e romanos, Cipriano não era teólogo. De modo diferente de
Tertuliano, a quem admirava, Cipriano era um homem prático que se importava
pouco com as disputas teológicas de seus dias. Ele simplesmente queria a
unidade da igreja. Em uma igreja bem desunida, buscou unir os cristãos por meio
da autoridade dos bispos.
O imperador romano Décio perseguira os
cristãos, e alguns negaram sua fé. Décio não procurava fazer mártires, porque
sabia que o martírio simplesmente chamava mais a atenção para o cristianismo.
Em vez de matar os cristãos, os torturava, na esperança de que dissessem
"César é Senhor". Os que se rendiam e proferiam essa declaração
passaram a ser conhecidos como lapsi.
Os cristãos que se mantinham firmes,
denominados "confessores", normalmente desaprovavam os lapsi. Desse
modo, o concilio de bispos estabeleceu regras rígidas em relação à readmissão
dos crentes proscritos na igreja. Diante dessa disciplina, um sacerdote chamado
Novato deu início a uma igreja rival que oferecia admissão fácil aos lapsi.
Embora não tivesse sofrido por causa de sua
fé, Cipriano não conseguia suportar a divisão. Acreditava que os cristãos
dedicados deveriam passar pela penitência para provar sua fé. A penitência era
composta de um período de tristeza verdadeira, depois do qual a pessoa poderia
participar novamente da ceia do Senhor. Depois de o penitente ter
"cumprido seu tempo", ele comparecia diante da congregação vestido de
saco e coberto de cinzas para que os bispos pronunciassem o perdão. Cipriano
via isso como um sistema graduado: quanto mais grave fosse o pecado, mais
penitência a pessoa precisava cumprir. Sua idéia tornou-se popular e passou a
ser um dos mais poderosos — e, às vezes, mais abusivos — métodos de disciplina
da igreja.
No ano 251, Cipriano convocou o Concilio de
Cartago e leu Unidade da igreja, seu trabalho principal, que teve
profunda influência sobre a história da igreja. A igreja, conforme argumentou,
é uma instituição divina — a noiva de Cristo — e somente pode haver uma noiva.
Somente na igreja as pessoas poderiam alcançar a salvação; fora dela, há
somente escuridão e confusão. Fora da igreja, os sacramentos e os pastores — e
até mesmo a Bíblia — não tinham importância. O indivíduo não poderia viver a
vida cristã em contato direto com Deus; ele precisava da igreja. Uma vez que
Cristo estabelecera a igreja sob autoridade de Pedro, a Pedra, Cipriano disse
que todos os bispos eram, em certo sentido, sucessores de Pedro e, portanto,
deveriam ser obedecidos. Embora não declarasse que o bispo de Roma estava acima
dos outros, Cipriano via o episcopado como especial em razão da conexão de
Pedro àquela cidade.
Afirmações de Cipriano como "Fora da
igreja não há salvação" e "Ninguém pode ter Deus como Pai se não
tiver a igreja como mãe" encorajavam as pessoas a dar aos bispos lugar de
grande importância. O bispo era capaz de determinar quem podia fazer parte da
igreja, o que, com efeito, é o mesmo que ter o poder de dizer: "Você está
salvo; você não está salvo". Em vez de confiar na obra do Espírito Santo
por meio da igreja como um todo, Cipriano deixou implícito que o Espírito Santo
trabalhava por meio dos bispos.
Os bispos, naturalmente, ganharam poder com
a disseminação dessas idéias. Cipriano também promoveu a idéia de que a missa
era o sacrifício do sangue e do corpo de Cristo. Uma vez que os sacerdotes
agiam como representantes de Cristo, oferecendo novamente o sacrifício em todos
os cultos de adoração, isso somente serviu para lhes aumentar o poder.
Cipriano morreu durante a perseguição do
imperador Valeriano. Pelo fato de ter se recusado a oferecer sacrifícios aos
deuses pagaos, o bispo de Cartago foi decapitado em 258.
A igreja da época de Cipriano, caracterizada
pela desunião, apegou-se às suas idéias. O bispo não poderia ter previsto as
conseqüências dos meios pelos quais procurou manter a igreja unida. Na Idade
Média, alguns homens incrivelmente gananciosos e imorais exerceriam o ofício de
bispo, usando-o em benefício próprio, em vez de cuidar dos assuntos
espirituais. A estrutura hierárquica que criou a "união", também
provocou uma enorme divisão entre o clero e os leigos.
FONTE : OS 100 ACONTECIMENTOS MAIS IMPORTANTES DO CRISTIANISMO
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