Youtube

domingo, 13 de outubro de 2013

NEM SIMÃO PEDRO NEM SIMÃO BARJONAS!



Simão Barjonas
(Pedro/pedra/seixo ou rocha?)

Quanta tinta, como se costuma dizer, esta personagem bíblica já fez correr para justificação de tão diferentes interesses ligados ao seu nome! O sistema papal afirma ter nela as suas raízes.
O problema do primado de Simão Barjonas repousa sobre dois textos das Escrituras, a saber: 1. João 1:42; 2. Mateus 16:18. Iremos abordar à luz da Bíblia e da história da Igreja estes dois textos e as suas implicações, tentando compreendê-los, sem qualquer partidarismo religioso.

1. SIMÃO, O HOMEM

Passaremos a identificar mais de perto este homem: provavelmente seria mais velho do que Jesus. Ele tinha um irmão cujo nome era André – cf. João 1:40. Como profissão, era pescador – cf. Mateus 4:18; o seu nome natural era Simão Barjonas, significando este apelido: filho de Jonas. O que dá: Simão, filho de Jonas – cf. Mateus 16:17. O seu estado civil: casado – cf. Mateus 8:14; ele morava numa pequena localidade chamada Betsaida – cf. João 1:44. Eis aqui o perfil de um verdadeiro homem do povo.
Quando analisamos a sua personalidade tal qual a encontramos descrita nos evangelhos apercebemo-nos de alguns traços de carácter que definem admiravelmente este homem, tais como:

1. Impulsivo

2. Pronto a crer como a duvidar

3. Temerário e, ao mesmo tempo, tímido

4. Fervoroso e, em simultâneo, cobarde

Enfim, qualidades e defeitos que existem em qualquer um de nós - humanos tal como ele - nem mais nem menos.

2. SIMÃO, NO EVANGELHO DE JOÃO

Recordemos o texto joanino: “E levou-o a Jesus. E, olhando Jesus para ele, disse: Tu és Simão, filho de Jonas; tu serás chamado Cefas (que quer dizer Petros)” – João 1:42. Recordamos, para já, que a palavra "Cefas" é aramaica e, o que se encontra escrito entre parêntesis é grego. Dito isto, a palavra, deverá ser, para já traduzida por outra palavra grega equivalente, ou seja "Petros". Veremos mais abaixo, qual a tradução para a nossa língua, desta palavra grega. Jesus acrescenta-lhe um sobrenome, apelido - Cefas - palavra aramaica, língua em que Jesus se expressava (1). Invariavelmente, será chamado, nas Sagradas Escrituras: 1. Simão Barjonas; 2. Simão Cefas; 3. Simão, Petros.

O contexto indica-nos que o seu irmão André o levou até à presença do Mestre. Aqui, neste primeiro encontro passa-se algo de muito estranho - Jesus acrescenta-lhe um sobrenome, apelido que, certamente, não será desprovido de qualquer sentido!

Como acabámos de ver acima, quando descrevemos o homem - Simão - pudemos constatar algumas das suas características, as quais englobam defeitos e virtudes! Seria por causa desta variedade de características que Jesus achou por bem acrescentar-lhe este sobrenome, apelido?
Que significado tem o nome para um israelita? Somos informados que “a essência de uma pessoa concentra-se no seu nome. Um homem sem nome é desprovido não só de significado, como também de existência. O nome contém uma dinâmica, um poder que exerce uma ação constrangedora sobre aquele que o usa” (2). Como acabámos de ver, o nome tem uma relação direta com o carácter da pessoa. Por outro lado, subjacente a esta noção de nome, está, não só, esta primeira ideia de – caráter, personalidade – como também, a de um novo nascimento!

Na realidade, o texto e contexto que nos ocupa vão exatamente nesta direção! O que aqui está a acontecer é exatamente o mesmo que sucedeu no diálogo de Jesus com o doutor da Lei – Nicodemos – cf. João 3:1-10. O processo não é novo, pois nas Escrituras, um rei guerreiro ao declarar guerra a um outro e, caso o vencesse, várias coisas poderiam acontecer ao vencido: 1. morto; 2. vassalo ou escravo levado pelo vencedor. Neste preciso caso, o vencedor mudava o nome ao vencido. Um escravo não era mais nem menos do que alguém que tinha a vida suspensa, isto é, existia sem existir, visto que, tecnicamente, deveria estar morto. A sua existência devia-se, unicamente, à benevolência do vencedor, nada mais.
A palavra de Deus ilustra, perfeitamente, em muitas situações o quanto acabámos de dizer. Vejamos, a este propósito, alguns desses exemplos:
* Faraó – O rei do Egipto destronou-o em Jerusalém e impôs ao país uma contribuição (tributo) de cem talentos (3) de prata e de um talento de ouro. Em seu lugar, pôs no trono de Jerusalém a Eliaquim, irmão de Joacaz, a quem mudou o nome para Joaquim (…) – II Crónicas 36:3,4. (sublinhado nosso)
* Nabucodonosor – “(…) o rei de Babilónia levou-os cativos para Babilónia. Em lugar de Joiaquim, o rei de Babilónia proclamou rei seu tio Matatias cujo nome mudou para Sedecias” – II Reis 24:16,17 (sublinhado nosso)
Estes relatos falam-nos de monarcas vencidos e tornados vassalos dos vencedores. Mas não acontecia somente a este nível! Aconteceu também com certos nobres da corte. E para ficarmos entre nomes conhecidos, lembremo-nos do profeta Daniel e dos seus amigos! O texto bíblico relata a deportação destas personagens bíblicas para Babilónia nestes termos: “O rei deu ordem a Aspenaz, chefe dos criados, que lhe trouxesse jovens israelitas, descendentes de raça real ou família nobre (…). Entre estes Daniel, Hananias, Misael e Azarias (…). O chefe dos criados impôs-lhes novos nomes: a Daniel, o de Baltasar, a Ananias, o de Sidrac, a Misael, o de Misac e a Azarias, o de Abed-Nego” – Daniel 1:3-7. (Sublinhado nosso).

Portanto, dentro deste preciso contexto, é como tivesse acontecido uma ressurreição, ou melhor, um novo nascimento! De certa maneira, esta forma de proceder encontramo-la na história da Criação. É relatado no livro do Génesis que Deus faz passar perante Adão todos os animais. E para quê? Claro, para que este lhes desse um nome! Vejamos o texto em questão: “Então, o Senhor Deus (…) conduziu-os até junto do homem, afim de verificar como ele os chamaria (…)” – Génesis 2:19. Assim, em termos teológicos, de certa maneira, este também participou na Criação, visto que “os animais e as plantas começam a existir realmente a partir do momento em que se lhes dá o nome”(4).

Ainda para realçar a importância do nome, recordemos um outro episódio do Antigo Testamento: O futuro rei de Israel, David, foge da presença do rei Saúl para os montes. Certo dia, cheio de fome, tal como os que o acompanhavam, desce ao povoado e solicita víveres a um fazendeiro abastado, cujo nome era – Nabal. Este recusa ajudar David. Este, furioso, reúne os seus homens e prepara-se para arrasar com tudo o que pertencia ao fazendeiro. Entretanto, a mulher deste ao saber da intenção de David e dos seus, apressa-se a vir interceder a este a favor do marido – I Samuel 25:1-24.
Como é que ela o irá fazer e quais foram os seus argumentos? O texto, claramente, dá-nos a conhecer a forma como esta se dirige a David: “Que o meu senhor não faça caso desse perverso Nabal, porque é um néscio e um insensato como o seu nome o indica (…)” – I Samuel 25:25. (Sublinhado nosso). O nome deste homem - Nabal - tinha o significado de: loucura – o que condiia com o seu carácter. Possuir era, simultaneamente, ser possuído por este!

Voltemos a Simão. Desta forma era necessário qualificar a personalidade, o caráter daquele homem chamado Simão Barjonas! Sim, no caso deste homem algo não batia certo, algo estava desajustado! Na verdade, o seu nome não correspondia, de modo algum, à sua personalidade, ao seu caráter! O seu nome era Simão, filho de Jonas! Mas, qual o seu significado? Este era simplesmente: "Deus ouviu" (5). Será que este Simão era, na realidade, um homem que sabia ouvir? O que nos revelam os evangelhos? Que dizer, por exemplo, da sua inconstância? Certa vez, Simão Barjonas confessou-se a favor do Mestre, dizendo: “Mesmo que tenha de morrer Contigo, não Te negarei (…)” – Mateus 26:35. Mais tarde, acerca deste mesmo Mestre, ao qual tinha prometido fidelidade, disse: “(…) não conheço este homem” – Mateus 26:72!

Saber ouvir é, por inerência, saber: escutar; e, saber escutar, significa: obedecer! A este propósito, recordemos o que nos diz a carta aos Romanos quando caracteriza a entrada do pecado no mundo: - “Porque como pela desobediência de um só, muitos se tornaram pecadores, assim também, pela obediência de um só, muitos se tornaram justos” – Romanos 5:19 (sublinhado nosso). Aqui encontramos uma ação e o seu contrário expressa por um mesmo verbo: obedecer.

No grego, a palavra "peitharcheô": a) encontra-se associada, no português, ao verbo: obedecer, seguir o conselho de (6). Este verbo encontramo-lo nalguns textos das Sagradas Escrituras, nomeadamente em: 1- Actos 5:29,31,32 - “Pedro e os demais apóstolos responderam: «Importa mais obedecer a Deus do que aos homens» (…) A fim de conceder a Israel o arrependimento e a remissão dos pecados (…) que Deus tem concedido àqueles que Lhe obedecem”; 2- Tito 3:1 - “Aconselha-os a que se sujeitem aos magistrados e às autoridades, que lhes obedeçam (…)”. (Sublinhado nosso); b) ou em formas verbais a esta ligadas – peithô (7) - com o mesmo significado; veja-se: 1. Gálatas 5:7 – “(…) Quem vos impediu de obedecer à verdade?”; 2. Hebreus 13:17 – “Sede submissos e obedecei aos que vos guiam (…)”; 3. Tiago 3:3 – “Quando pomos o freio na boca do cavalo, para que nos obedeça, dirigimos todo o seu corpo”.

O texto de Romanos apresenta-nos, nesta área uma interessante curiosidade. A tradução portuguesa do referido texto, apesar de apresentar este verbo ele não existe no original grego! A expressão que o apóstolo Paulo utilizou e que foi traduzida para a nossa língua por "obediência" é - Upakouô - que significa: a favor da voz de, ceder (8); e para a palavra – Desobediência – é - Parakouô - que significa: ao lado da voz (9).
Até aqui, tudo bem. Mas, perguntar-se-á, que relação tem o que acabámos de ver com o nome de Simão Barjonas? Sabia que a palavra que Paulo usou, traduzida por – obediência - tem como base o verbo - ouvir? A palavra - Upakouô (obediência) - compõe-se do prefixo – Uper (a favor de) (10) + o radical – Akouô (ouvir) (11). Por sua vez, a palavra – Parakouô (desobedecer) - compõe-se do prefixo – Para (ao lado de) (12) + o mesmo radical. Logo, todo aquele que é favorável a ouvir, esse é obediente; por outro lado, todo aquele que permanece ao lado de ouvir, consequentemente, devido à sua atitude, é desobediente!

Se tivermos isto em consideração como contexto de avaliação, o homem Simão, cujo nome significa – Deus ouviu – tinha um nome que não se ajustava, de modo algum, à sua personalidade! Devido à sua inconstância, Simão demonstrou, muitas vezes, que permanecia numa situação de "Parakouô", isto é, permanecia ao lado do ouvir, ou seja, de desobediência!
Vejamos a segunda parte do texto - João 1:42. Aqui Jesus diz: “chamar-te-ás Cefas” –. Cefas (Kephas), palavra aramaica que é traduzida para a língua grega por: Petros - que significa em português: dureza, insensibilidade (13). Sob esta panorâmica, pensamos estar em condições para interpretar o pensamento de Jesus e compreender o sobrenome ou apelido dado a Simão Barjonas. Assim, parafraseando o texto de João 1:42, é como se Jesus tivesse dito: - o teu nome de nascimento é, com efeito, Simão, que significa: aquele que sabe ouvir! Mas, como a tua personalidade é diferente, pois ela caracteriza-te como - insensível e inconstante - traços que nada têm que ver com este teu nome, então dar-te-ei um sobrenome, apelido, que esteja mais em consonância com a tua verdadeira personalidade, ou seja - Cefas/Petros - (seixo rolante duro, inconstante, de equilíbrio instável), em suma, o resultado em todo aquele que, tal como tu: não sabe ouvir!
Experimentemos colocar em pé, na vertical, um seixo que encontramos na rua ou no campo para vermos o que acontece. Será que conseguimos? Certamente que serão infrutíferos todos os nossos esforços para o conseguir! E qual a razão? Ela é simples - devido ao seu equilíbrio instável! Em breves segundos, se o largarmos, estará totalmente deitado no chão! Assim era Simão: ora em pé, ora caído! Eis a característica da sua personalidade! Eis o sobrenome, apelido, alcunha que, segundo Jesus, mais condizia com a personalidade deste Seu discípulo, este que se passaria a chamar: Cefas/Petros (seixo instável, rolante)!

Acerca deste sobrenome, alcunha é-nos dado a conhecer que: “Kephas não era um nome próprio, mas a designação de uma realidade (…)” (14). Isto quer dizer que, no contexto em que foi aplicado, a palavra – Cefas/Petros – não deverá ser traduzida por - Pedro. Em abono da verdade, diga-se, desde já, convenhamos que sentido terá mudar de um nome para o outro se aquele que se coloca não tiver uma qualquer significação? Assim, reiteramos que a significação última da palavra aramaica Kephas (Cefas), por sua vez vertida para a palavra grega Petros, não corresponde, de modo algum, ao nome Pedro, em português. Assim, o verdadeiro nome, sobrenome, alcunha, deste homem, segundo Jesus, é – Simão, Cefas (Petros), o instável, aquele que reage sem ouvir, o que em certas ocasiões dá o dito por não dito, tal como muitos textos revelam claramente o caráter deste homem.

3. SIMÃO, NO EVANGELHO DE MATEUS

Neste evangelho, encontramos o seguinte texto: “Também Eu te digo: Tu és Petros (seixo instável) e sobre esta Petra (rocha) edificarei a Minha Igreja (…)” – Mateus 16:18. (Sublinhado nosso). No evangelho de
João, como vimos, propõe-nos o termo aramaico Kephas e a sua respetiva tradução - Petros. Neste, foi conservada a matriz de duas palavras gregas: Petros e Petra.
Que significarão estas duas palavras tão parecidas à luz do que vimos até aqui – Petros e Petra? Para já, vejamos o seguinte comentário explicativo: “O substantivo feminino Petra designa no grego profano preferentemente uma <rocha> grande e firme (…). O substantivo masculino Petros é aplicado geralmente a blocos rochosos e isolados, bem como a pedras pequenas, tais como a pederneira e a pedra de arremessar” (15). À medida que avançamos parecem claros os respetivos significados das palavras propostas pelo evangelho:
* Petros = Pedra pequena de arremessar;
* Petra = Rocha grande e firme.
À luz desta informação, façamos uma pequena pesquisa bíblica. Esta palavra: Petra (Rocha) – aparece apenas cinco vezes no Novo Testamento: 1. Mateus 16:18; 2. Romanos 9:33; 3. I Coríntios 10:4; 4. I Pedro 2:8; 5. Apocalipse 6:15. A nível da tradução encontramos algumas variantes sobre a mesma palavra, o que não deixa de ser bastante significativo e, ao que parece, demonstra certa incoerência de tradução da mesma palavra, pois varia conforme o contexto onde se insere! Vejamos o quadro comparativo:
Texto bíblico
Tradução proposta
1 - Mateus 16.18
“(…) Tu és Petros (Pedro), e sobre esta Petra (Pedra) edificarei a minha Igreja (…)”.
2 - Romanos 9.33
“(…) uma Lithos (pedra) (16) de tropeço, uma Petra (Rocha) de escândalo; (…)”.
3 - I Coríntios 10.4
“(…) porque bebiam da Petra (Pedra) que os seguia; e a Petra (Pedra) era Cristo”.
4 - I Pedro 2.8
“E uma Lithos (Pedra) de tropeço e Petra (Pedra) de escândalo”.
5 - Apocalipse 6.15
“(…) esconderam-se nas cavernas e nos Petra (Rochas) das montanhas”.


Aqui encontramos a palavra – Petra – ora traduzida por: “Rocha”, ora por “Pedra”! Pelo que pudemos ver até aqui, será natural que traduzamos o texto de Mateus da seguinte maneira: “(…) Tu és Petros (pedra pequena, seixo de arremessar), e sobre esta Petra (rocha grande e firme) edificarei a minha Igreja (…)”.
Quão bom seria que nos abeirássemos dos textos originais, respeitando o que eles dizem, e não fazendo dizer o que queremos que digam! É devido a exemplos destes, traduções tendenciosas e afins que, infelizmente assistimos ao nascimento de todo o tipo de igrejas.
Na verdade, o que o Senhor disse a Simão Barjonas foi que se chamaria Simão Petros (pedra, seixo de arremessar), um sobrenome, alcunha, que correspondesse com a sua conhecida instabilidade emocional, e nunca para se operar uma simples troca de um sobrenome por outro - Barjonas por Pedro! Mas, imaginemos por um instante que Jesus quisesse chamá-lo pelo nome próprio de Pedro! O que quereria Jesus dizer com este novo nome? Jesus estava a caracterizar quem e o quê? Como compreender esta atitude de Jesus? Dar um nome por dar, sem que este tivesse qualquer significado! O nome - Pedro - tal como o conhecemos, significa o quê? Caso cheguemos a alguma conclusão, define o quê? E se o compararmos com o contexto até aqui desenvolvido, que sentido terá este nome próprio – Pedro - para que este substituísse o sobrenome de - Barjonas?
Para colocarmos ainda mais em destaque este raciocínio façamos uma simples comparação com outro caso paradigmático, embora em contexto diferente:
Texto bíblico
Tradução proposta
Marcos 3:16,17
A Simão, a quem pôs o nome de Petros (Pedro)”. V. 17 - E a Tiago, filho de Zebedeu, e a João, irmão de Tiago, aos quais pôs o nome de Boanerges, que significa: filhos do trovão” - (sublinhado nosso).

O que é que vemos aqui? Jesus procede com os filhos de Zebedeu, tal como fez com Simão! A ambos acrescenta-lhes um sobrenome, alcunha. Vejamos com mais pormenor:

A Quanto a Simão – tal como já o vimos, este sobrenome, alcunha tinha por finalidade fazer jus àquilo que Simão era - “(…) um homem inconstante”; (17)

A Quanto a Tiago e a João – somos, de novo esclarecidos sempre no mesmo propósito, pois este sobrenome, alcunha era “(…) um simples qualificativo para o seu ímpeto” (18). (sublinhado nosso).

Para que não tenhamos qualquer dúvida acerca do caráter e impulsividade destes irmãos, leiamos um episódio, passado com eles, para nos apercebermos até que ponto estes tinham os nervos à flor da pele, como se costuma dizer. As Escrituras assim o revelam desta maneira: “Vendo isto, os discípulos Tiago e João disseram: «Senhor, queres que digamos que desça fogo do céu e os consuma?» Mas Ele, voltando-Se repreendeu-os” – Lucas 9:54,55. Portanto, uma vez mais reiteramos que: as palavras - Petros e Boanerges - não são - nomes próprios - mas qualificativos de uma personalidade - uma qualidade de carácter nada mais (19)! Pois, se fossem nomes próprios, como vulgarmente se aplica a Simão, então, perguntamos, porque é que este só é aplicado à pessoa de (Simão) e não a estes dois irmãos? No mínimo é injusto, visto a situação ser a mesma! E depois, se Jesus não quisesse dizer isto mesmo, isto é, qualificar o caráter destes, para que lhes iria acrescentar este sobrenome, apelido ou alcunha? Só mudar por mudar? Nós não estamos sozinhos nesta conclusão. Ora vejamos: - “(…) o propósito não era mudar-lhes o nome, em sinal de domínio sobre eles” (20).
Assim sendo, perguntamos: Se, ao nos referirmos a Simão Petros, chamamos-lhe sempre – Pedro - (nome incorreto e que nada significa, pois Jesus não mudou um nome por outro como já vimos); então por que é que, ao citarmos estes dois irmãos – Tiago e João – nunca o fazemos pelo seu respetivo sobrenome, apelido, alcunha - Boanerges (Filhos do trovão)? Parece-nos incoerente. Quando queremos citar João ou Tiago nas Escrituras, citamos os seus nomes e não o seu sobrenome, apelido, alcunha, dada por Jesus para caraterizar o caráter destes, tal como acontece quando citamos Simão Barjonas, citando sempre o seu sobrenome, apelido, alcunha - Cefas/Petros - incorretamente traduzido por- Pedro.

4. O HOMEM SIMÃO BARJONAS
As sagradas Escrituras relatam que um centurião romano de nome Cornélio, orava a Deus a solicitar ajuda pois queria conhecer mais acerca de Deus. Um ser celeste veio ter com ele, em resposta às suas orações e ordena-lhe o seguinte: “Envia homens a Jope e manda chamar a Simão, que tem por sobrenome Petros (Pedro)” – Actos 10:5. Como podemos ver, em primeiro lugar utiliza o seu verdadeiro nome de nascimento - Simão. De seguida encontramos o seu sobrenome, o apelido, a alcunha, pela qual também era conhecido!
Estaremos a ser radicais? Pensamos que os textos nos revelam, exatamente, esta vertente – basta querer vê-la! Um caso parecido com este é o do filho do patriarca Abraão – Isaque! Este sim, é um nome próprio! Mas, qual a sua origem? A Palavra de Deus esclarece-nos. Uma promessa tinha sido feita a Abraão e Sara, sua mulher; estes iriam ter um filho em determinada altura, segundo o calendário divino - cf. Génesis 18:14. Vejamos o relato bíblico: 1. “(…) Sara, tua mulher, terá um filho (…)” – v.10. E como reagiu Sara? “(...); riu-se Sara para consigo (…)” – v. 12. (Sublinhado nosso). E porquê? Ela mesma o explica: - "(...); na verdade gerarei eu ainda, havendo já envelhecido?" - v. 13.
O tempo passou e na altura própria tudo aconteceu como estava previsto - Génesis 21:2. E como se chamou esta criança? Abraão colocou-lhe o nome de - Isaque - v.3. Porquê este nome e não outro
qualquer? A razão é muito simples! Só porque riram da promessa, esta falta de fé estaria para sempre diante deles, na pessoa do seu filho! Este nome - Isaque - (Yishak’el) "tem como raiz o verbo (Sahak = rir)” (21). O que é que este pequeno episódio nos mostra? Uma vez mais, revela um traço de caráter, pela negativa. A propósito é dito: - “o filho da promessa está, pelo seu nome, associado ao rir de Abraão e de Sara (…)” (22). Portanto, cada vez que pronunciassem o nome do filho, eles recordar-se-iam da sua falha de caráter. Cada vez que chamassem - Isaque - na nossa língua, estavam a dizer: “Ó Isaque (risota), vem cá”; ou ainda “Ó Isaque (risota), vai ali comprar ou fazer isto ou aquilo”, etc, etc. Neste caso, tal como dissemos, trata-se de um nome próprio, não de um sobrenome, apelido ou alcunha. Se ainda restar quaisquer dúvidas, bastará perguntar: - Como é possível, à luz do texto de Mateus, a mesma personagem – Simão Barjonas – ser, em simultâneo: a) Petros (pedra pequena, pedra de arremessar); b) Petra (rocha grande e firme)? Só mesmo querendo fazer dizer aquilo que o texto não diz!

CONCLUSÃO

Para concluirmos este pequeno estudo, recordaremos aqui a resposta do papa João Paulo II ao ter sido interrogado sobre a figura do papa, quando disse: “(…) Pedro é aquele que não apenas não voltou a renegar Cristo, como não repetiu o seu infausto: Não conheço esse homem, mas perseverou na fé até ao fim: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo. Deste modo tornou-se a rocha, mesmo se, talvez, como homem não fosse mais que areia movediça". E, logo de seguida acrescenta dizendo: - "O próprio Cristo é a rocha e Cristo edifica a Sua Igreja sobre Pedro (...)" (23). (Sublinhado nosso).
Para o pretenso sucessor de Simão Barjonas (Petros), este seu antecessor “não é mais do que areia movediça”! Quem, sensato, faria tal coisa? Como é que sendo Jesus “a Rocha (…) edifica a Sua Igreja sobre Petros (Pedro), areia movediça”?! (Sublinhado nosso). Quem trocaria, a rocha como alicerce, por seixos rolantes, instáveis ou, pior ainda, por "areia movediça" para construir a sua casa? Será que Jesus optaria pelo alicerce Petros - "areia movediça" - para fundar a Sua Igreja? Continuamos, em nome do bom senso, a crer que não!

Portanto, tal como nós, este pretenso sucessor de Simão Barjonas não vê no sobrenome, apelido, alcunha (Petros) o nome próprio Pedro - mas, unicamente, um traço de caráter - qualificando-o de: "areia movediça" - nada mais! Assim, este homem deverá ser chamado de Simão Barjonas e não Pedro. Porquê? Porque, em português, não só não é uma fiel tradução da palavra grega Petros, como também não comporta qualquer significado.


FONTE: Pr. Ilídio Carvalho
______________________

1. Bo Reicke, História do Tempo do Novo Testamento, S. Paulo, ed. Paulus, 1996, pp. 16,17

2. O peso de um talento sofre pequenas oscilações entre os diferentes autores, oscilando em números redondos, entre os 34 e os 41 kg - cf. André Chouraqui, A Vida Quotidiana dos Hebreus no Tempo da Bíblia, Lisboa, ed. Livros do Brasil, s.d., p. 155

3. Edmond Jacob, Théologie de L'Ancient Testament, 2ª ed., Suisse, ed. Delachaux et Niestlé, 1968, p. 33; cf. Gerhard Von Rad, Théologie de l’Ancien Testament, 3ª ed., Genève, Ed. Labor & Fides, 1971, Vol. I, p. 161

4. Mircea Eliade, Histoire des Croyances et des Idées Religieuses, Paris, Ed. Payot, 1976, p. 175
5. A. Van Den Born, “Simeão”, in Diccionário Enciclopédico da Biblia, 2ª ed., S. Paulo, ed. Vozes, 1977, col. 1439
6. Isidro Pereira, S.J., Dicionário Grego-Português e Português-Grego, 5ª ed., Porto, 1976, p. 443
7. F. Wilbur Gingrich e Frederick W. Danker, Léxico do Novo Testamento Grego / Português, S. Paulo, Edições Vida Nova, 1984, p. 162
8. Isidro Pereira, S.J., op. cit, p. 588; 2ª parte, p. 205
9. William Carey Taylor, Introdução ao Estudo do Novo Testamento Grego, 8ª ed., Brail, Ed. Juerp, 1986, p.192, nota 529
10. Idem, p. 232
11. Isidro Pereira, S.J., op. cit., p. 22
12. William Carey Taylor, op. cit., p. 232
13. Isidro Pereira, S.J., op. cit., p. 458
14. Oscar Cullmann, “Pedro” in Gerhard Kittel, A Igreja no Novo Testamento, S. Paulo, Ed. ASTE, 1965, p. 298
15. Oscar Cullmann “Pedra” in Idem, p. 323
16. “A palavra – Keyphâ – é muitas vezes usada no sentido de – lithos (pedra) – Idem, p. 324
17. Gunther Dehn, Le Fils de Dieu, Genève, Ed. Labor et Fides, 1953, p. 57
18. "Todos os discípulos tinham sérias falhas de caráter quando Jesus os chamou ao Seu serviço. (...). <mau génio, vingativo, espírito de crítica, tudo se encontrava no discípulo amado. Era orgulhoso e ambicioso". - Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, Sacavém, ed. Publicadora Atlântico, cap. XXX (Nomeou Doze), s.d, p. 278
19. Manuel de Tuya, O. P., Bíblia Comentada - Evangelios, 3ª ed., Madrid, Biblioteca de Autores Cristianos, Profesores de Salamanca, 1977, Vol. V, p. 508
20 Ibidem
21. Gerhard Von Rad, La Genèse, Genève, ed. Labor et Fides, 1968, p. 234
22. Frank Michaeli, Le Livre de La Genèse, Chap. 12 à 50, Genève, Ed. Delachaux et Niestlé, 1960, p. 57
23. João Paulo II, Atravessar o Limiar da Esperança, Lisboa, ed. Planeta, 1994, p. 8

Sem comentários:

Enviar um comentário

VEJA TAMBÉM ESTES:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...