Jesus
sai de uma acirrada discussão com os fariseus sobre o divórcio e se coloca a
caminho e logo atrás dele vem correndo um jovem, rico, que se atira de joelhos
aos pés do mestre e faz uma pergunta intrigante: “Bom mestre o que farei de bom
para herdar a vida eterna?”. Essa realmente é uma pergunta importante vinda de
um jovem rico para quem a eternidade e os problemas da vida estão tão
distantes.
A
resposta de Jesus é seca, dura, como que querendo acordar aquele jovem de um
sono. Jesus responde: “Porque me chamas bom, bom é apenas Deus”, “agora se
quiseres entrar na vida eterna obedece aos mandamentos”.
Aquele
rapaz possuía uma vida integra. Ele não só conhecia aos mandamentos como também
desde criança observa a cada um deles.
Esse
rapaz era um bom moço, orgulho de seus pais, honrava-os respeitava-os, eram um
rapaz rico cuja fortuna foi adquirida pelo meio mais lícito possível, pois
nunca roubara nem cobiçara as coisas alheias.
O
que Jesus desejava mostrar ao rapaz com a resposta que para alcançar a vida
eterna devia guardar os mandamentos? Estaria Jesus ensinando a salvação pelas
obras? Absolutamente que não! Jesus estava dando uma resposta judaica. Ele
respondeu como qualquer rabino judeu responderia. A resposta de Jesus deve ser
mais ou menos assim: Porque você me pergunta como herdar a vida eterna?
Vocês fariseus não vivem pregando que para se herdar a vida eterna basta
guardar os mandamentos? Então faz o que você ensina. Guarda os mandamentos e
terás a vida eterna.
Diante
da resposta de Jesus o rapaz coloca todo o desespero e insegurança de quem
depende de suas obras para a salvação de sua alma mas que conhece profundamente
a própria natureza pecaminosa: “Tudo isso eu tenho feito desde de pequeno mas
não posso crer que seja suficiente”
Diante
de tal desespero Jesus afirma ao rapaz que apenas uma coisa lhe faltava para
obter a vida eterna: “Vender tudo o que possuía e dar aos pobres e depois
seguir a Jesus”. Com essas palavras Jesus encerra a conversa e o encontro com
esse jovem rico que sai sem entender nada. Como que uma riqueza ganha
honestamente pode interferir numa busca sincera pela eternidade? Não seria
suficiente viver do modo íntegro diante de Deus e dos homens? Parece-nos que
aquele jovem saiu desapontado.
O
que fica para nós como lição desse encontro?
1- Pessoas que apresentam integridade
moral não tem garantido a coerência espiritual
O
jovem em questão era alguém de elevado caráter moral. Nem mesmo Jesus o questiona quando ele se coloca
como um rigoroso observador da Lei. Era um jovem que havia aprendido o valor de
uma tradição e seguia essa tradição com todas as suas forças. Esse jovem
guardou seu coração de muitos pecados de modo que era tido como respeitável em
sua sociedade e quem poderia dizer ao contrário?
Como
esse jovem existem muitos. Pessoas íntegras ao extremo. Excelentes pais, bons
cônjuges, cidadãos exemplares, colaboradores do bem e da ordem. São pessoas as
quais olhamos e pensamos: “no céu deve ter um lugar reservado a esse
camarada!”.
Embora
existam pessoas com um caráter ilibado, sobre a qual não pese nenhuma acusação
capital, pessoas irrepreensíveis no que tange a moral, temos que reconhecer que
muitas vezes a irrepreensibilidade moral não reflete a coerência espiritual. Se
não vejamos: aquele jovem mesmo com todas aquelas qualidades, quase merecendo a
canonicidade, ainda assim não possuía um relacionamento com Deus que lhe desse
segurança de uma vida eterna ao lado desse mesmo Deus. Embora sendo religioso
ao extremo, rigoroso em sua disciplina, esse jovem se encontrava longe do amor
de Deus. Deus para ele era apenas um juiz, um aferidor de qualidade, o qual ele
não tinha certeza de agradar.
Vejam
como é fácil cair nessa armadilha. Desejar o céu, que é a morada de Deus, sem
ter um relacionamento pessoal e intimo com ele que nos dê a segurança de que
esse relacionamento vai continuar por toda a eternidade.
O
jovem foi muito sincero ao confessar que apesar de todas as suas qualidades
ainda se sentia inseguro quanto a sua salvação, por que ao contrário do jovem,
também podemos observar pessoas que possuem o mesmo caráter mas acham que
merecem o céu porque existem muitos piores do que ele. Pessoas que não tem um
relacionamento com Deus, mas acham que Deus vai ter que engoli-los porque eles
alcançaram o céu através de seus méritos. Que vã ilusão.
Por
outro lado temos aqueles que pensam gozar de um relacionamento com Deus mas não
possuem qualquer qualidade moral, vivem se envolvendo nos mesmos pecados há
anos, confessam a Deus com a boca mas negam-lhe o poder pelas atitudes, porém
vivem se jactanciando de que vão para o céu.
Temos
falado até aqui que integridade moral não é coerência espiritual e a coerência
espiritual nada mais é do que viver conforme o Deus que professamos crer. É
justamente aqui que vemos a incoerência espiritual do jovem, pois quem deseja
esse Deus deve confiar nele e não nas riquezas.
2- Pessoas que desejam a eternidade
podem ficar apegadas as coisas terrenas.
O
jovem se mostrou muito interessado na vida eterna. Ele correu atrás de Jesus e
quando o encontrou se colocou de joelhos, essas atitudes são atitudes de alguém
que está interessado, buscando, procurando ansiosamente por algo. O que este
jovem procurava com tamanha avidez? Ele procurava o caminho do céu, a vida
eterna. Pode existir preocupação mais legítima do que esta? Creio que não. A
preocupação com a eternidade deve estar no coração de todas as pessoas, sejam
crianças, adolescentes, jovens, adultas e idosas. A eternidade está no coração
do homem.
Jesus
viu que o coração daquele jovem ansiava pela eternidade. Mesmo jovem se
mostrava zeloso em guardar a Lei de Deus, mas Jesus também observou que faltava
alguma coisa para aquele jovem, apenas uma coisa: ele precisava vender todos os
seus bens e dá-los aos pobres. Ao ouvir esta afirmação de Jesus o jovem se
entristeceu o foi embora. Eram muitas as suas riquezas, desfazer-se delas era
desfazer-se de toda a sua vida.
Jesus não era contra a
riqueza, nem tão tem essa palavra como plano para todos os seus seguidores, mas
quando as riquezas tomam o lugar de Deus em nossas vidas só há um jeito de
exorcizar a avareza é distribuir nossas riquezas para que o dinheiro não
encontre o caminho de nosso coração.
As
riquezas para aquele jovem era sua identificação, como já dissemos, perde-la
seria como perder a própria vida. Prova disso é que os evangelhos o identificam
como “um jovem rico”, ninguém sabe nem o nome dele. Sua riqueza era a sua
própria identidade.
Quando
Jesus pede para que sejam vendidas as suas riquezas, ele quis mostrar mais uma
grande contradição na vida desse rapaz: Como alguém pode estar tão
preocupado com a vida eterna e ao mesmo tempo tão apegado as coisas terrenas?”.
Meus
queridos, essa mesma contradição, em menor ou maior grau, também é encontrada
em cada um de nós. Eu não duvido que todos tenhamos o céu como grande alvo e
esperança, mas também não duvido que são muitas as amarras que nos prendem a
essa vida. Claramente podemos perceber nesse jovem a avareza reinando em seu
coração a ponto de preferi-la do que ao céu.
Quantos de nós também
não enfrentamos a avareza dominando nossa generosidade de modo que retemos
nossa contribuição missionária, nosso dízimo, nossa ajuda ao necessitado?
Quantos de nós também
não enfrentamos a avareza dominar nossa moral de modo que parte do dinheiro que
ganhamos é ilícito?
E
quantos de nós, mesmo desejando o céu, vivemos com a mente dominada pela
lascívia e impureza.
E
quantos vivem a ambigüidade de desejar o céu mas guardar em seu coração o ódio,
rancor, ira e a falta de perdão?
Quantas
e quantas vezes soltamos as asas de nossa imaginação tentando chegar ao céu mas
ficamos presos pelas amarras desse mundo?
Aquele
jovem precisava vender suas propriedades e dividir suas riquezas com os pobres,
e nós, o que precisamos fazer? O que é que nos falta? Do que nós precisamos
abrir mão para seguirmos Jesus verdadeiramente tendo a certeza de que realmente
temos um lugar no céu?
Aquele
jovem encerrou o diálogo e foi embora triste porque tinha muitas riquezas e as
amava demais para abandona-las, eu espero que a nossa história não termine
assim nesta noite. Que estejamos dispostos a abrir mão de tudo o que Jesus nos
pedir (arrogância, ganância, orgulho, prepotência, avareza, maledicência , lascívia,
impureza, rancor, ódio, falta de perdão, mágoa, inveja, ciúmes, contendas,
malícia) para que realmente nada seja mais importante do que o céu, para que
nada venha ocupar o lugar de Deus em nossa vida.
3-Pessoas podem se unir a Deus não por
sua bondade mas pela sua utilidade.
Quando
o jovem se aproximou de Jesus ele o chama de bom. Jesus responde que somente
Deus é bom. Será que de fato o jovem acreditava na bondade de Deus? Infelizmente
a bondade de Deus é muitas vezes reconhecida e proclamada, mas poucas vezes
vivida e experimentada. Desde a queda no Éden, a serpente vem tentando
mostrar que Deus não é tão bom assim, ele está sempre tentando nos privar de
algo. De lá para cá nossa visão da bondade de Deus ficou distorcida, somente
conseguimos entender a bondade de Deus quando ele não nos nega nada. Basta Deus
negar um de nossos desejos e toda a sua bondade é questionada.
Quando
aquele jovem chegou a Jesus, numa linguagem moderna, ele já tinha feito a vida,
estava com a vida feita, burro na sombra, futuro garantido. Existiria melhor
hora para se preocupar com a eternidade? Aliás quase todas as pessoas pensam
que a hora de se preocuparem com o eterno, espiritual e religioso é quando já
conseguiram uma posição confortável na vida. Assim foi com o jovem. Agora ele
podia se aventurar pois tinha como se financiar, se qualquer coisa desse
errada, ele teria dinheiro suficiente para bancar qualquer situação adversa.
Quando ele se aproximou de Jesus ele tinha por trás uma garantia. Agora quando
Jesus mexeu nessa garantia o jovem desistiu da caminhada.
De
fato Deus era bom para o jovem? Poderia ele se entregar aos seus cuidados? Na
verdade o jovem não acreditava na bondade de Deus e sim em sua utilidade.
Pensava o jovem que Deus não era tão bom a ponto de suprir os mínimos detalhes
de sua vida, mas era útil desde que era o único caminho que conhecia para a
eternidade.
Isto
me faz pensar na quantidade de pessoas que suportam a vida cristã, aturam a
Igreja, toleram a Bíblia e seus ensinamentos não porque vêem nisso a bondade de
Deus e sim a utilidade desse caminho que conduz a vida eterna.
De
fato, queremos o melhor de Deus mas não nos abandonamos em suas mãos e aos seus
cuidados, desejamos a vida eterna mas não abrimos mãos de nossos tesouros aqui
na terra, queremos viver nos céus com os irmãos mas nossas companhias na terra
são os ímpios que habitarão no inferno. Para muitas pessoas Deus é bom porque é
útil, mas quando não vemos em sua vontade uma utilidade que nos favoreça não
temos a menor dificuldade em dar as costas a Deus e seguir nosso caminho até
que uma outra utilidade comum nos uma com ele. Uma fé coerente é uma fé de
auto- abandono na bondade de Deus, que descansa nessa bondade. A eternidade
começa quando aceitamos descansar no amor e bondade de Deus.
Que
Deus abençoe a sua Palavra!
Amém!
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