OS DOMINGOS PRECISAM DE FERIADOS.
Toda Sexta-feira à noite começa o Shabat para a tradição judaica. Shabat é o
conceito que propõe descanso ao final do ciclo semanal de produção, inspirado
no descanso divino, no sétimo dia da Criação.
Muito além de uma proposta trabalhista, entendemos a pausa como fundamental
para a saúde de tudo o que é vivo. A noite é pausa, o inverno é pausa, mesmo a
morte é pausa. Onde não há pausa, a vida lentamente se extingue.
Para um mundo no qual funcionar 24 horas por dia parece não ser suficiente,
onde o meio ambiente e a terra imploram por uma folga, onde nós mesmos não
suportamos mais a falta de tempo, descansar se torna uma necessidade do
planeta.
Hoje, o tempo de 'pausa' é preenchido por diversão e alienação. Lazer não é feito
de descanso, mas de ocupações 'para não nos ocuparmos'. A própria palavra
entretenimento indica o desejo de não parar. E a incapacidade de parar é uma
forma de depressão.
O mundo está deprimido e a indústria do entretenimento cresce nessas condições.
Nossas cidades se parecem cada vez mais com a Disneylândia. Longas filas para
aproveitar experiências pouco interativas. Fim de dia com gosto de vazio. Um
divertido que não é nem bom nem ruim. Dia pronto para ser esquecido, não fossem
as fotos e a memória de uma expectativa frustrada que ninguém revela para não
dar o gostinho ao próximo... Entramos no milênio num mundo que é um grande
shopping. A Internet e a televisão não dormem. Não há mais insônia solitária;
solitário é quem dorme.
As bolsas do Ocidente e do Oriente se revezam fazendo do ganhar e perder, das
informações e dos rumores, atividade incessante. A CNN inventou um tempo linear
que só pode parar no fim.
Mas as paradas estão por toda a caminhada e por todo o processo. Sem
acostamento, a vida parece fluir mais rápida e eficiente, mas ao custo fóbico
de uma paisagem que passa. O futuro é tão rápido que se confunde com o
presente.
As montanhas estão com olheiras, os rios precisam de um bom banho, as cidades
de uma cochilada, o mar de umas férias, o Domingo de um feriado...
Nossos namorados querem 'ficar', trocando o 'ser' pelo 'estar'. Saímos da
escravidão do século XIX para o leasing do século XXI - um dia seremos nossos?
Quem tem tempo não é sério, quem não tem tempo é importante. Nunca fizemos
tanto e realizamos tão pouco. Nunca tantos fizeram tanto por tão poucos...
Parar não é interromper. Muitas vezes continuar é que é uma interrupção. O dia
de não trabalhar não é o dia de se distrair -literalmente, ficar desatento. É
um dia de atenção, de ser atencioso consigo e com sua vida.
A pergunta que as pessoas se fazem no descanso é 'o que vamos fazer hoje?' - já
marcada pela ansiedade. E sonhamos com uma longevidade de 120 anos, quando não
sabemos o que fazer numa tarde de Domingo.
Quem ganha tempo, por definição, perde. Quem mata tempo, fere-se mortalmente. É
este o grande 'radical livre' que envelhece nossa alegria - o sonho de fazer do
tempo uma mercadoria.
Em tempos de novo milênio, vamos resgatar coisas que são milenares. A pausa é
que traz a surpresa e não o que vem depois. A pausa é que dá sentido à
caminhada. A prática espiritual deste milênio será viver as pausas. Não haverá
maior sábio do que aquele que souber quando algo terminou e quando algo vai
começar.
Afinal, por que o Criador descansou? Talvez porque, mais difícil do que iniciar
um processo do nada, seja dá-lo como concluído.
(Rabino Nilton Bonder)
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