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quinta-feira, 9 de junho de 2016

O SÁBADO NA BÍBLIA - CRISTO OU CONSTANTINO



Cristo ou Constantino?
O sábado nos livra do sistema dominador do mundo

por Trudy J. Morgan-Cole



Não me recordo de quando ouvi pela primeira vez o nome do imperador romano Constantino, mas tenho certeza de que foi na igreja e sem dúvida eu era muito jovem. Como a maioria dos que são ad­ventistas do sétimo dia desde o berço, aprendi muito cedo que Constantino foi o “sujeito mau”, na grande mudança do sábado para o domingo, que proclamou o “Venerável Dia do Sol” como o dia em que todos devem adorar. Natu­ralmente, Constantino não inventou a adoração do Sol ele tornou legal uma prática para a qual a igreja se desviara durante os dois séculos anteriores ao tentar incorporar os conversos pagãos e desassociar-se do judaísmo. Até agora, para a maioria dos adventistas, o nome de Constantino está indissoluvelmente ligado a esse erro fatal.
Não foi senão recentemente que comecei a refletir sobre as outras mu­danças que ocorreram após a conver­são de Constantino.
Durante os primeiros 300 anos de sua existência, a igreja primitiva estava longe de ser perfeita. Lutava contra a heresia e se acomodava aos costumes pagãos. Na realidade, alguns dizem que o principal objetivo de Constantino, ao oficializar o cristianismo, era unir as facções cristãs que estavam continua­mente discutindo umas com as outras.
Apesar d~ suas falhas, porém, a fé abastecida pelo sangue dos mártires se assemelhava bem mais à fé de Jesus do que a que temos visto durante muitos séculos desde então. Pelo menos três importantes valores da igreja primitiva começaram a desintegrar-se por volta da mesma época em que o cristianis­rno se tornou a religião do Estado.

Não-violência Nos três primeiros séculos, os cristãos, como o próprio Jesus, se opunham firmemente a qual­quer tipo de violência. Haviam seguido o exemplo de não-violência de Jesus, uma desobediência civil do tipo “ofere­ça-lhe também a outra [face]” (ver Mat. 5:39; Luc. 6:29)* ao resistir á autoridade “divina” dos imperadores romanos, e sofreram por isso. Os homens cristãos eram recomendados a não ser­vir no exército nem usar violência co­mo meio de resolver problemas.
Com a conversão de Constantino, o cristianismo de repente se aliou ao poder militar romano. Em 303 d.C., era ilegal um soldado do exército romano tornar-se cristão.’ A “cruz” que o exército de Constantino carregava como estandarte era uma lança com uma barra transversal.2 Ironicamente, o símbolo da morte de Jesus como inocente vítima da opressão foi transformado em arma do opressor. A igreja tomou a espada e com raras exceções a tem empunhado desde aquela época.
O cristianismo se propagou rapidamente nos anos que transcorreram entre a morte de Jesus e a conversão de Constantino, mas se expandiu através da pre­gação e do exemplo de amor. Somente quando o cristianismo se tornou a igreja romana do Estado foi que começou a imitação grosseira de conversões forçadas pela ponta da espada. A liberdade religiosa e o respeito pela liberdade individual foram vitimas da vitória de Constantino.

Materialismo Quando Jesus expulsou os cambistas para fora do templo, seu ato podia ser entendido sob mui­tos pontos de vista, mas pelo menos um de seus significados era que o materialismo e o comércio não têm lugar na casa de Deus. Atualmente, em um mundo onde corporações multinacionais e a mentalidade voltada ao consumidor têm saturado todos os aspectos de nossa sociedade, fico imaginando: Que “templos” Jesus purificaria se Ele chegasse ao local? Certa­mente, desde o tempo de Constantino, as igrejas cristãs têm acumulado poder e riqueza até um nível que pareceria muito estranho aos primeiros seguidores dAquele que não tinha “onde repousar a cabeça”. Mat. 8:20.

Abrangência O ministério de Jesus era de amor, aceitação e abrangência extremos, e a igreja primitiva continuou assim. Aos olhos de Jesus, as diferenças sociais não importavam. Um homem pobre, uma mulher, criança, ou pessoa fisicamente incapacitada todos eram tão preciosos para Deus como um homem saudável, rico ou poderoso. No Novo Testamento temos evidência de que a igreja primitiva se esforçava arduamente para manter essa igualdade:
“compartilhavam tudo o que tinham... [de modo que não havia pessoas ne­cessitadas entre eles”] Atos 4: 32 e 34. Os líderes da igreja lutavam para certificar-se de que isso continuasse a despeito do desejo natural das pessoas de discrimi­nar e olhar aos outros com desprezo. (Ver Tiago 2:1-9; 1 Cor. 11:17-22.) E dito que os pagãos comentavam: “Vejam como esses cristãos amam uns aos outros!” E o cristianismo era notável no mundo ro­mano por permitir que mulheres e es­cravos não só adorassem em igualdade com os homens livres, mas assumissem cargos de liderança. À medida, porém, que o cristia­nismo se uniu ao poder do Estado, e a igreja se tornou cada vez  mais hierárquica, eliminando a lembrança da mensagem radical de amor de Jesus. Igualdade e aceitação foram vítimas adicionais do regime de Constantino.

Reino de quem? Jesus veio para proclamar e estabelecer o reino de Deus, para nos mostrar como é Deus e como é a vida em Seu reino. Não foi uma missão fácil. Por volta da mesma época em que Jesus nasceu, judeus revolucionários se rebelaram contra o poder imperial de Roma, clamando:
“Não temos rei, senão Deus!” Mas o evangelho de João [19:151 registra que os judeus rejeitaram a reivindica­ção de Jesus como rei, com as palavras: “Não temos rei, senão César!”
Esta cena torna dolorosamente evidente que quando nós realmente temos um vislumbre de como é a au­toridade de Deus, conforme exemplificada na vida de Jesus, muitos de nós corremos dela assustados. Fugimos da autoridade de Deus para a de soberanos mundanos cujo sistema e regras nós compreendemos.
Embora a autoridade de Deus jamais seja totalmente compreendida, se­não quando a Terra for renovada, todos nós que aceitamos a Jesus, aceitamos o convite para viver de acordo com os va­lores do Seu reino. Isso foi o que a igre­ja primitiva procurou fazer, mas a conversão de Constantino foi um impor­ante contratempo para o reino de Deus e uma vitória para o sistema domina­dor. Quando a igreja aceitou a violência, o controle do Estado sobre a religião e as estruturas de poder secular, ela se
desviou do exemplo de Jesus tão certamente como quando ordenou o “Venerável Dia do Sol” em lugar do sá­bado de Deus.
Como povo que sempre rejeitou a decisão inovadora de legislar sobre a adoração no domingo para os seguidores de Deus, creio que os adventistas do sétimo dia devem também tomar posição contra as demais inovações de Constantino.

Símbolo de Senhorio  De fato, os dois conceitos adoração sabática e senhorio de Deus estão inseparavelmente ligados.
A adoração tem que ver com quem seguimos e de quem são os valores que aceitamos. Um dia não seria mais intrinsecamente sagrado do que outro, a menos que Deus assim o designasse. Quando aceitamos Sua soberana escolha de um dia dentre os sete para adoração, sustentamos um símbolo que diz: “Seguimos a Deus como nosso rei, não a Constantino ou qualquer outro imperador mundano.” Um símbolo, porém, aponta para maiores realidades. Como adventistas, temos nós colocado maior ênfase no símbolo, a adoração no sábado, sem atrair a atenção para a realidade destacada pelo símbolo os valores do reino de Deus?
A Igreja Adventista do Sétimo Dia, assim como a igreja cristã primi­tiva, adota tradicionalmente uma postura de não-violência e não-com­batividade. Em nossa era afligida pelas guerras, embora a igreja oficial­mente defenda essa posição, indivi­dualmente alguns adventistas com freqüência a questionam, colocando a lealdade nacional acima da fidelidade a Jesus, que nos recomendou a “amar nossos inimigos”l Temos feito maravi­lhoso trabalho defendendo a causa da liberdade religiosa; no entanto, mui­tos de nós particularmente interpretamos isso como “liberdade para aqueles que pensam e crêem como eu”, enquanto demonstramos intole­rância para com aqueles que percebe­mos ser “diferentes”. Nossa igreja começou como um movimento pobre e igualitário, bem semelhante à igreja cristã primitiva; mas, à medida que crescemos em tamanho, estrutura e força, será que temos nos deslocado rumo ao reino de Constantino, rumo ao sistema dominador de poder e materialismo?
Quando honramos o sábado de Deus, temos uma oportunidade maravilhosa de não apenas reconhecer a autoridade de Deus, mas comemorar os valores do Seu reino.
O sábado nos liberta dos laços do materialismo. A desaprovação tradi­cional adventista de comprar e vender no sábado não é legalismo sem importância, mas uma chance de declarar nossa liberdade da sociedade consumista. O grupo social ativista Adbus­ters promove anualmente um Dia de Nada Comprar. Seu objetivo é posicio­nar-se contra o consumismo e o materialismo.3 Quando pela primeira vez vi a propaganda do “Dia de Nada Comprar’, tive que rir. Eu comemoro semanalmente um Dia de Nada Comprar, e me alegro pelo fato de que durante 24 horas não sou um “consumidor”, mas um ser humano filho de Deus.
Da mesma forma, o sábado nos chama para fora do ambiente de tra­balho, do mercado, do sistema domi­nador do mundo, convidando-nos a depor nossas estruturas de poder, nossas soluções violentas para os pro­blemas, nossa distinção de classes e culturas, e juntos nos reunirmos igualmente como pecadores e investi­gadores. A tragédia é que muitas vezes saímos do ambiente de trabalho na sexta-feira à tarde e entramos na igre­ja no sábado de manhã para encontrar ali uma outra arena de luta pelo poder, distinção de classes e culturas, e maneiras irritantes e combativas de lidar com as divergências.
Se esta é nossa experiência no sábado, então nossas igrejas estão vivendo no reino de Constantino, não no de Jesus apesar de estarmos adorando no sétimo dia. Para Jesus, o sábado era um dia para curar, aliviar o sofri­mento, estender a mão aos excluídos da sociedade. (Ver Mat. 12:9-11; Luc. 13:10-16 e 14:15.)
Se realmente queremos declarar nossa lealdade ao reino de Deus, precisamos depor a espada romana, to­mar a cruz de Jesus Seu símbolo de não-violência, humildade, presteza e pacificidade e segui-Lo buscando maneiras novas e criativas de viver Seu amor nesta época materialista, violenta e sedenta de poder.

Todos os textos biblicos são da Nova Versão Internacional.


Referencias:
1. Emmanuel Charles C. McCarthy, “Christian Nonviolence: The Great Failure, The OnIy Hope~, citado em Wafter Wink, Engaging lhe Po­wers (Minneapolis: Fortress Press, 1992).
2. James Carroll, Convton6n&s Sword (Boston: Houghton Mifflin, 2001).
3.  http://adbusters.org/campaigns/bnd.


Trudy Morgan-Cole é escritora freelance em St. John’s, Newfoundland, Canadá.


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