Youtube

quinta-feira, 11 de outubro de 2018

O CÓDIGO DA VINCI E A NOVA ONDA DOS APÓCRIFOS





o Código Da Vinci e a nova onda dos apócrifos

POR MICHELSON BORGES

Constantino inventou a divinda­de de Cristo no Concílio de Ni­céia. Foi esse concílio que deter­minou que livros deviam ser in­cluídos no Novo Testamento. Jesus casou com Maria Madalena e teve uma filha. Uma organização secreta foi encarregada de preservar esse "se­gredo do Jesus verdadeiro". Calma, calma! Antes de achar que estou de­fendendo heresias, deixe-me dizer que esses absurdos são o pano de fundo de um romance policial que tem con­quistado legiões de leitores em todo mundo. E não é todo dia que um livro alcança a cifra de 15 milhões de exem­plares vendidos. Trata-se de O Código Da Vinci, de Dan Brown.

A história, que logo deve chegar ao cinema, tendo Tom Hanks como protagonista, é a seguinte: tudo come­ça com a morte misteriosa do curador do Museu do Louvre. Robert Lang­don, professor em Harvard e especia­lista em símbolos esotéricos, está em Paris a negócios e a polícia lhe pede para decifrar um código deixado pró­ximo ao cadáver. E é esse código que guia toda a trama e leva Langdon e a criptóloga Sophie Neveu em busca do Santo Graal. Os personagens pene­tram em um mundo secreto de misté­rio e conspiração, com o objetivo de desmascarar "séculos de engano", va­lendo-se de códigos secretos e manus­critos que a igreja supostamente tem tentado esconder do público, mas que o historiador Leigh Teabing quer di­vulgar a todo custo. (É bom que se saiba que a trama central desse livro já existe há séculos e pode ser encontra­da na literatura esotérica e da Nova Era, como em O Santo Graal e a Li­


nhagem Sagrada, de Michael Baigent, que serviu de referência para o ro­mance de Brown.)
Seria apenas mais um livro de fic­ção, como tantos outros, não fosse a alegação de que se fundamenta em fa­tos. Brown, baseado em livros apócri­fos gnósticos, sustenta que, após a crucifixão de Jesus, Maria e a filha de­les, Sara, partiram para a Gália (Fran­ça), onde teriam fundado a linhagem dos reis merovíngios. O autor diz ain­da que essa dinastia perdura até hoje na misteriosa organização conhecida como Priorado de Sião, entidade se­creta que tinha os Templários como braço militar. Há até a suposição de que Leonardo da Vinci, Isaac Newton e Victor Hugo tenham figurado entre os membros dessa organização.
Segundo Erwin Lutzer, autor do livro A Fraude do Código Da Vinci (Vida), "esse livro [de Brown] é um ataque direto contra Jesus Cristo, a igreja e aqueles de nós que O seguem e O chamam Salvador e Senhor. De acordo com o romance de Dan Brown, o cristianismo foi inventado para reprimir as mulheres e afastar


as pessoas do 'sagrado feminino"'. Brown chega a afirmar que os judeus, no Antigo Testamento, adoravam tan­to o Deus masculino, Jeová, como Sua "correspondente feminina", Shekinah. Séculos depois, afirma o autor, a igre­ja, "que odeia o sexo e a mulher", teria reprimido essa adoração à deusa.
Carlos Alberto di Franco lem­brou, em julho de 2004, no jornal O Estado de S. Paulo, algumas críticas de respeitáveis jornais estrangeiros a res­peito do livro de Brown: El Mundo chama-o de "um livro oportunista e pueril"; The New York Times, de "um insulto à inteligência"; Weekly Stan­dard, de uma "mixórdia de narrativas inimagináveis"; The New York Daily News declara que o livro contém "er­ros crassos, que só não chocam um leitor muito ingênuo". O problema é que muitos leitores ingênuos. Mi­lhões deles.
O Jornal do Brasil, do dia 16 de dezembro de 2004, publicou um arti­go de Ives Gandra Martins. A certa altura, ele declara: "No mundo da informação comprovada e dos aces­sos às fontes, como admitir que se consiga desvendar um segredo não revelado - de 2 mil anos! - de que Cristo teve uma filha? Ou que nas vi­das altamente investigadas de Boticel­li, Leonardo da Vinci, Boyle, Newton, Victor Hugo, Debussy e Cocteau seus investigadores não descobriram que eles eram grandes mestres de uma fantástica sociedade secreta denomi­nada Priorado de Sião, cuja função era guardar o segredo da filha de Je­sus? Todos os historiadores do mun­do não descobriram o que o oportu­nista Dan Brown descobriu em inves­tigações cujas fontes é incapaz de ci­tar. A história é pisoteada por alguém que, sem escrúpulos, mente deslava­damente, sobre tudo."

Os Uevangelhos" gnósticos - Um dos trechos mais polêmicos de O Código da Vinci é este: "E a companheira do Salvador é Maria Madalena. Cristo amava-a mais do que a todos os discí­pulos e costumava beijá-Ia com fre­qüência na boca." Essa citação prova­velmente tenha se originado no Evan­gelho de Filipe, um dos livros apócri­fos gnósticos encontrados em Nag Hammadi, no Egito, em 1945, e es­condidos ali no século IV, por um egípcio anônimo. De acordo com Darrell L. Bock, autor de Quebrando o Código da Vinci, o original tem lacu­nas e só traz a inicial (no alfabeto cop­ta) da palavra "boca". "O texto estáfragmentado e diz: 'E a companheira de (.u) Maria Madalena, (.u) a ela mais do que a (u.) os discípulos e (u.) beijá-Ia (u.) na b(u.):" Portanto, o que Brown faz é um tremendo exercício de imaginação.
Embora Brown sustente que seria estranho e até desonroso um judeu na época de Jesus ser solteiro, Amy WeI­bom, autora de Decodificando Da Vin­ci e mestre em História da Igreja pela Universidade Vanderbilt, escreve que no século I muitos homens devotados a Deus eram solteiros. Os exemplos, do profeta Jeremias ao apóstolo Paulo, são muitos. Em uma de suas cartas aos coríntios, Paulo se refere às mulheres de outros apóstolos, mas não de Jesus.
Todo o problema vem dos chama­dos "evangelhos" gnósticos. Eles retra­tam Jesus como um espírito superior, mas afirmam que Ele era um homem


como qualquer outro. E se Jesus foi um homem qualquer, qual o proble­ma de ter-Se casado e ter tido filhos?
Uma rápida comparação ent,re os quatro evangelhos bíblicos e os apó­crifos gnósticos mostra que entre eles há um abismo intransponível. O Evangelho de Tomé - outro dos livros gnósticos - afirma, por exemplo, que "quem não conheceu a si mesmo não conhece nada, mas quem se conheceu veio a conhecer simultaneamente a profundidade de todas as coisas': E as­segura que a salvação vem por meio do autoconhecimento, ou pela sabe­doria, não pela fé. Confundindo a im­portância do autoconhecimento ­num contexto freudiano - com salva­ção, mais e mais pessoas têm adotado esses livros não canônicos como sua Bíblia. Mas o conhecimento salvífico do qual fala a verdadeira Palavra de Deus consiste em conhecer a Deus e a Jesus Cristo (ver João 17:3).
Há outro aspecto dos apócrifos gnósticos que salta à vista dos que co­nhecem a Bíblia e sua mensagem. Os "evangelhos" de Tomé, Filipe e Maria Madalena não contêm uma linha se­quer sobre o significado do julgamen­to e da morte de Jesus na cruz. Ou seja, o evento central, no que diz res­peito à história da redenção, é total­mente ausente nesses livros que rei­vindicam a posição de evangelhos. Eles trazem apenas charadas que con­vidam seus leitores a reflexões espiri­tuais, não ao arrependimento - uma vez que, neles, o pecado não existe.
Pretender que os chamados "evangelhos" apócrifos tenham o mesmo peso e confiabilidade dos Evangelhos canônicos é desconhecer a história bíblica. Além de os apócri­fos gnósticos terem sido escritos de­pois dos quatro evangelhos, Mateus, Marcos, Lucas e João são os únicos re­latos que foram, ou escritos por teste­munhas oculares da vida de Jesus, ou corroborados por elas. Lucas não conviveu com Jesus, mas fez seu rela­to sob a supervisão do apóstolo Paulo e contou com a aprovação de Pedro. "O Espírito Santo primeiro guiou Mateus, depois Paulo e seu compa­nheiro Lucas, a seguir Pedro e seu companheiro Marcos e, por último, João, o apóstolo, para entregar à igre­


ja, durante sua vida, o Evangelho que Ihes foi entregue por Jesus': escreve David Alan Black, no instrutivo Por Que 4 Evangelhos (Vida), na página 10. Além disso, "as fontes mais aceitas sobre a trajetória de Jesus - os evan­gelhos sinópticos, de Mateus, Lucas* e Marcos - são consistentes com o que se sabe sobre a Palestina do século I, de forma que a chance de serem fruto da imaginação de seus autores é des­prezível", escreveu Isabela Boscov, na revista Veja do dia 15 de dezembro de 2004. E é bom deixar claro que a igre­ja primitiva já aceitava a inspiração divina dos quatro evangelhos muito tempo antes de Constantino convocar o Concílio de Nicéia. Graças ao histo­riador Eusébio, sabe-se que 20 decre­tos foram promulgados em Nicéia. Nem um único diz respeito ao cânon.
"Os evangelhos apócrifos, assim como os canônicos, foram, escritos por pessoas inquietas, numa época conturbada e difícil, em que as antiga~ respostas já não davam conta de acal­mar os espíritos", sustenta Érica Mon­tenegro, no artigo "Um outro Jesus", publicado na revista Superinteressante de dezembro de 2004. "É claro que os tempos, hoje, são muito diferentes. Mas, de novo, boa parte da humani­dade está inquieta e insatisfeita com as respostas que existem. Tem muita gente em busca de alguma coisa que torne nossa existência mais transcen­dente, mais valiosa. E esses textos es­critos por outros homens, numa bus­ca parecida, podem nos dar uma dica de onde começar a procurar."
Sem o saber, Érica chegou perto da descrição que o apóstolo Paulo faz de nossos dias: "Pois haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mes­tres segundo as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ollvi­dos; e se recusarão a dar ouvidos àverdade, entregando-se às fábulas." II
Tim. 4:3 e 4.                               

Revista Adventista. junho 2005



Miche1sol1 Borges é editor de notícias da Revista Adventista e da Lição dos Jovens.

(') Sir William Ramsey, célebre historiador e arqueólogo do século 19, esforçou-se por demonstrar que a história de Lucas estava cheia de er. ros. Após toda urna vida de trabalho e estudos. porém. ele esaeveu: "A história de Locas é insuperável quanto a sua fidedignidade." - lhe 8eQ. ring of Rocen! Discovenes on lhe Trostworthiness of lhe New Testamen! (Grand Rapids: Baker). pág. 81.



Revista


Sem comentários:

Enviar um comentário

VEJA TAMBÉM ESTES:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...