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sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

A PALESTINA NO PRIMEIRO SÉCULO - A SOCIEDADE JUDAICA





A terra pertence a Deus que a dá a seu povo; todos são iguais diante dele . . . Fora preciso inventar instituições como o ano sabático ou jubilar, para relembrar esta igualdade social (cf. p. 32) pois ne­cessariamente a cultura, a riqueza, a profissão criavam diferenças. Por outro lado, para os judeus, a lei civil não é outra senão a Torá, a Lei re­ligiosa: os que são seus guardiães ou seus intérpretes, os sacerdotes e também os escribas têm, pois, por força das circunstâncias, um lugar mais importante. "Entre outros povos — escreve Josefo — outras con­siderações permitem determinar a nobreza; entre nós, porém, é a pos­se do sacerdócio que é prova duma ilustre origem" (Autobiografia I,1). Neste apanhado das diferentes categorias sociais, começaremos por­tanto pelo clero.
O clero
NO ÁPICE DA HIERARQUIA: O SUMO SACERDOTE
Desde o retorno do Exílio em 538 a.C, não havendo mais reis, o sumo sacerdote tornara-se pouco a pouco a chave de abóbada da so­ciedade judaica. É ele o responsável pela Lei e pelo Templo e é ele, por ofício, o presidente do Sinédrio. É o único que pode orar e expiar por todo o povo, o único que pode entrar, uma vez por ano, no coração do Templo, no Santo dos santos, para a Expiação (cf. p. 52) e a sua morte era considerada como expiatória, pois nesta ocasião os assassinos eram agraciados.
Por causa das suas funções, o sumo sacerdote goza de grande dignidade, o que lhe vale uma situação financeira confortável: cada tarde, é o primeiro a escolher a sua parte entre as oferendas feitas ao Templo e destinadas aos sacerdotes. O Templo é também uma fonte de renda para ele; era, com efeito, um centro de comércio muito importante: por causa das regras de pureza em vigor quanto aos animais que se devem oferecer em sacrifício, os peregrinos são praticamente obrigados a comprar essas vítimas no próprio Templo; além disso, compra-se muita madeira de valor, perfumes e outros objetos de luxo, únicos dignos do Senhor. Ora, todo esse comércio pertence à família do sumo sacerdote ou então é confiado a grandes comerciantes que oferecem propinas para participarem do negócio. Gomo esses meios nem sempre satisfazem os apetites do sumo sacerdote e os de sua família, às vezes ele se serve de outros: apropria-se pela força das pe­les dos animais degolados, que deveriam pertencer aos outros sacer­dotes, vai aos sítios roubar o dízimo que lhes é igualmente destina­do ... Ou usa a intriga, a chantagem, e até o assassinato . . .
Esse comportamento, como se pode adivinhar, não favorece em nada a popularidade do sumo sacerdote, tanto mais porque ele está cada vez mais sujeito ao poder romano. Os Selêucidas e depois Pompeu se permitiram nomear um sumo sacerdote quando o posto estava vago, pelo menos o nomeavam por toda a vida. Herodes Magno e de­pois dele os procuradores ousam destituí-lo quando lhes apraz: ao pas­so que em mais de um século (entre 200 e 36 a.C.) só houve treze su­mos sacerdotes, em um século (de 36 a.C. a 67 d.C.) houve vinte e seis! Isto significa que para continuar no ofício é absolutamente ne­cessário agradar ao príncipe. No entanto, entre esses vinte e seis su­mos sacerdotes temporários, vinte e cinco provêm de quatro famílias: isto demonstra o poder político e econômico dessas famílias e as intri­gas entre elas! Elas formam a ossatura do partido saduceu (ver p. 76). O sumo sacerdote é ajudado nas suas funções por certo número de funcionários chamados chefes dos sacerdotes: o Comandante do Templo, responsável pelo culto e pelo policiamento no santuário e que substitui o sumo sacerdote em caso de necessidade, os chefes das vin­te e quatro secções semanais, os sete vigilantes do Templo, responsá­veis por toda a' manutenção e os três tesoureiros. Todos esses cargos são ocupados pelos membros da família ou pelos amigos do sumo sa­cerdote.


O Sinédrio

O grande Sinédrio (do grego synédrion, sentar-se juntos) é a corte suprema de Israel. Suas origens remontam sem dúvida à época persa e suas primeiras menções ao reinado de Antíoco III (223-187). Foi instituído no tempo de João Hircano (134-104).
Como nas cidades helenísticas, é um conselho que assiste o sumo sacerdote, chefe supremo da nação que é seu presidente. Compreende 71 membros: anciãos, os sumos-sacerdotes depos­tos, sacerdotes Saduceus e depois, cada vez mais, escribas fari­seus.
Herodes Magno limitou seus poderes, mas sob a ocupação romana estes foram restabelecidos e até mesmo ampliados. Cor­te de justiça, julga delitos contra a Lei, fixa a doutrina e finalmen­te controla toda a vida religiosa. Tem-se discutido muito, sem chegar a uma certeza, para saber se ele tinha, na época de Jesus, o poder de executar um condenado. Em todo caso, para pronun­ciar uma condenação à morte, eram necessárias duas sessões com 24 horas de intervalo. Ele tinha uma guarda à sua disposição (cf. Jo 18,3.12).
Após a catástrofe de 70 d.C, ele se reconstituirá em Jâmnia (ver p. 93) mas será então uma instituição completamente dife­rente na sua competência e no seu espírito.
Em toda a Palestina, havia pequenos sinédrios de três membros, entre os quais o juiz (Mt 5,25).



OS SACERDOTES
Em número de 7 mil mais ou menos, os sacerdotes são encarre­gados de oferecer os sacrifícios no Templo e de conservar a sua parte central. Mas não há necessidade de tanta gente para atender às ne­cessidades habituais do culto. Eles são, pois, divididos em 24 classes ou equipes, que ficam de serviço cada qual uma semana, cada uma na sua vez. Cada manhã desta semana, escolhia-se pela sorte aqueles que teriam uma função particular no culto (cf. Lc 1,9). Somente por ocasião das três grandes festas de peregrinação é que todas as classes estão de serviço ao mesmo tempo: cada sacerdote, portanto, exerce seu sacerdócio no Templo cinco semanas por ano; o resto do tempo ele não tem nada que fazer, exceto sentar-se de vez em quando no tri­bunal de seu domicílio na qualidade de conselheiro, quando se julga um caso que exige a presença dum sacerdote (Ver Caderno Bíblico Nº 14 p. 62).
Esse clero é pobre. Suas rendas são constituídas de dois elemen­tos: a parte retirada dos sacrifícios (cinco semanas por ano) e o dízimo. Mas desde muito tempo, certo número de judeus esqueciam de pagá-lo e é difícil imaginar aliás, como os pequenos camponeses, esmaga­dos pelos impostos, ou os diaristas, conseguiriam pagá-lo. É provável também que os que são marginalizados por ser desprezado seu ofício (ver p. 60), não tenham vontade de oferecer 10% de sua renda! Assim, para sobreviverem, os sacerdotes têm de encontrar um ofício: são car­pinteiros, talhadores de pedra (Herodes Magno mandou que mil sacer­dotes recebessem formação profissional acelerada antes de ampliar o Templo), comerciantes, açougueiros (ofício que todos eles praticam du­rante o culto) . . . Alguns se dedicam ao estudo e se tornam escribas.
Bem próximos do povo miúdo, tanto pelo salário quanto pelas condições de trabalho e de vida, muitas vezes não mais instruídos que ele, os sacerdotes comungam as idéias do povo. No momento da guer­ra judaica, muitos, ao que parece, farão causa comum com os zelotes: esperam que a saída dos romanos lhes trará melhor situação financei­ra e uma elevação de nível social.
Esse sacerdócio é hereditário; transmite-se aos filhos sob duas condições: que a esposa seja uma verdadeira judia e não uma bastarda e que o filho seja física e mentalmente normal.



OS LEVITAS
Os levitas são os verdadeiros subproletários do Templo. São aproximadamente 10 mil, divididos eles também em 24 classes, com cinco semanas anuais de serviço. Mas seu salário, por esse serviço, parece inexistente: jamais tiveram direito à parte retirada dos sacrifí­cios e o dízimo que outrora lhes estava reservado (Nm 18,8-32) foi-lhes confiscado, não se sabe quando, em benefício dos sacerdotes. Fora de seu tempo de serviço, exercem, como os sacerdotes, os mais variados ofícios.
No Templo, estão divididos em dois grupos: os levitas músicos que se instalam entre o pátio dos levitas e o dos sacerdotes e animam as liturgias com seu canto e seus instrumentos, e os levitas porteiros que guardam e mantêm limpo o Templo (com exceção do pátio dos sa­cerdotes), controlam o acesso aos diferentes círculos de santidade, ga­rantem o policiamento e a guarda no santuário. Esses dois grupos são rigorosamente distintos, pois, em princípio, aquele que cumprisse a ta­refa destinada ao outro grupo poderia ser punido com a morte! Na época que nos interessa, cada um dos grupos se põe a reclamar uma promoção social que acabará acontecendo em 64 d.C: os músicos te­rão direito à veste distintiva dos sacerdotes, ao passo que os porteiros poderão aprender os hinos, como os músicos. Esta promoção concedi­da por Agripa II, que pretende rebaixar os sacerdotes, é muito mal re­cebida pelo povo, hostil a qualquer mudança.

O povo
Sacerdotes e levitas formam uma das doze tribos de Israel, aque­la que é consagrada a Deus. As outras tribos — ou o que delas resta — formam o conjunto do povo socialmente bem diversificado.
OS ANCIÃOS
Essa palavra ancião engloba situações bem diversas como o ter­mo nobre na pena dos nossos jornalistas. Quase não existe relaciona­mento entre os chefes duma aldeia que vivem exatamente como todo mundo e o pequeno grupo de anciãos que compõem o Sinédrio de Je­rusalém. São esses últimos e seus pares que nos interessam agora: formam a aristocracia leiga de Israel, uma aristocracia bem reduzida em número, mas muito rica, graças a grandes propriedades (que no entanto nada têm a ver com os latifundia romanos) ou ao comércio; em 66 d.C. três desses anciãos se comprometem a abastecer sozinhos a cidade de Jerusalém, por 21 anos, de trigo, cevada, vinho, óleo, sal e madeira.
Esses grandes proprietários e negociantes necessariamente es­tão ligados com o principal mercado, quer dizer o Templo e seus diri­gentes, os sumos sacerdotes. Estão associados também com o poder romano que sabe uni-los a si atribuindo-lhes postos de conselheiros e portanto um certo poder. Para Roma, esses conselheiros são excelen­tes arrematantes dos impostos indiretos: sua própria fortuna é a ga­rantia de que de qualquer forma o imposto entrará para os cofres do império; por outro lado, bem administrado, o imposto se torna fonte de renda suplementar para os arrematantes. O nobre que recusasse esse serviço seria primeiro objeto de pressões amigáveis, depois de chanta­gem e, eventualmente, de confisco de sua propriedade! Em caso de oposição ao poder, corre-se até risco de vida: Herodes matou 45 nobres que tomaram partido contra ele antes da sua chegada e esta prática não é desconhecida pelos romanos, mas eles se contentam muitas vezes com exilá-los confiscando seus bens!
Esses anciãos, apesar de terem riquezas e serem "os primeiros em dignidade", sentem a falta de uma coisa que é o ápice da glória na Palestina: o acesso ao Templo, reservado aos descendentes de Levi. Por não poderem comprar o sacerdócio, procuram suas migalhas: as famílias mais afortunadas e sobretudo as mais antigas conservam cio­samente o privilégio de oferecer, em certos dias, a lenha necessária para os sacrifícios e sobretudo, por derrogação especial, os meninos desta aristocracia podem se juntar aos levitas músicos para acompa­nhar os ofícios: ficam então entre o pátio dos levitas e o dos sacerdo­tes, ao passo que normalmente deveriam ficar no das mulheres.
Muito ciosa dos seus privilégios, unida aos sumos sacerdotes como também a Roma, esta oligarquia é, segundo todos os testemu­nhos, saducéia. Parece, no entanto, que na Galiléia o partido de Hero­des também tenha entrado nesse círculo.
A CLASSE MÉDIA
Temos poucas informações sobre esta classe social de comer­ciantes e de artesãos: Em particular, as raras indicações que se tem sobre sua situação financeira provêm mais da lenda que da realidade. Globalmente, sua prosperidade depende do Templo. Os artesãos que trabalham diretamente para ela, — padeiros, alfaiates, perfumistas . . . — são muito bem remunerados. Alguns se especializam nos bibelôs para os peregrinos ou nos mais diversos objetos de luxo, dos quais se faz grande uso por ocasião das festas. Há ainda todos os ofícios ligados á acolhida e à hospedagem dos peregrinos: hotelaria, abasteci­mento, transporte e vendas de mercadorias necessárias.
O consumo deve ser muito elevado em Jerusalém, pois cada ju­deu é obrigado pela Lei a gastar aí em regozijo diante de Deus o se­gundo dízimo (Dt 12,1 7-18). Mesmo que nem todos os judeus obede­çam a essa norma (ver p. 57), pode-se pensar que os peregrinos que vêm da Palestina ou de fora fazem questão de cumpri-la. Esta soma deve ser gasta em alimentação, vestes ou perfumes e objetos de luxo, mas não pode servir para oferecer sacrifícios: pode-se imaginar o lucro auferido pelos comerciantes da capital, claramente favorecidos em re­lação a seus colegas provincianos. Teoricamente, é claro que se pode levar esse segundo dízimo em gêneros para gastá-lo em Jerusalém, mas é tão complicado que preferem vender seus produtos na própria aldeia e vir à Cidade Santa com o dinheiro para comprar — mas com uma notável diferença de preço — aquilo que se precisa ou que se quer: os preços são muito mais altos na cidade do que na roça, che­gando a ser o triplo no caso dos figos!
O POVO
Quanto mais se desce na hierarquia social, mais são raras as in­formações precisas: em todas as literaturas do mundo, fala-se pouco dos pequenos! Distinguem-se entretanto algumas categorias.
Os pequenos proprietários agrícolas contentam-se, com freqüên­cia, de consumir seus produtos ou de fazer alguma troca para obter o que lhes falta: isso evita as taxas nos mercados. Na Judéia e na Samaria, parece que as lavouras são pequenas, de tipo familiar. Muitas ve­zes, só o filho mais velho pode herdar o sítio, e os outros filhos se tor­nam operários ou se expatriam. Na Galiléia, as propriedades parecem mais extensas; isso se deve a razões históricas: por volta de 150 a.C, todos os judeus fugiram dessa província (1 Mc 5,23.45); os pagãos re­cuperaram essas terras, aumentando suas propriedades, mas quando João Hircano reconquistou a Galiléia, esses pagãos tiveram de se con­verter ou partir.
Os artesãos ou mais exatamente os que trabalham por conta pró­pria num trabalho que não é agrícola, nos são muito mal conhecidos. O que se sabe com mais certeza é que muitos desses ofícios são mal vis­tos, e até mesmo desprezados. De acordo com as fontes rabínicas anti­gas, o curtidor exala tanto mau cheiro que perde toda dignidade, a tal ponto que sua esposa pode separar-se dele quando quiser (raro caso em que o marido pode ser obrigado ao divórcio), o tecelão é tão menti­roso que não é admitido a dar testemunho, como também não o são a mulher e o escravo; o pastor é considerado ladrão, ele próprio devido à sua alimentação pessoal, e seu rebanho, porque entra muitas vezes nas pastagens dos outros; o médico pratica uma medicina de classe, descuidando os pobres sem dinheiro ... A lista negra das profissões é tão comprida, que se tem a impressão de que resta pouco espaço para as profissões honestas.1
Os operários e diaristas: basta sobrevir uma colheita insuficiente, basta uma administração errada do seu negócio, basta que algum con­corrente tenha mais êxito e a pessoa perde sua independência, vendo-se obrigada a colocar-se a serviço dum patrão, seja por dia — mas a si­tuação é então extremamente precária — seja de modo mais estável como braçal numa lavoura de grande ou médio porte. Pode-se traba­lhar também numa empresa de transporte ou junto a um grande artesão; pode-se conseguir emprego na casa dum nobre, na corte, ou enfim conseguir admissão num dos grandes canteiros de obras (ver p. 33).

Todo esse pequeno povo forma a parte importante de Israel, tra­balhadores que ganham salários minguados, que são desprezados pela casta dos escribas e dos fariseus, e são chamados ham ha'ares, o povo da terra, os incultos . . . Todavia, bom número de escribas exercem es­sas humildes profissões e esse povo é o principal apoio dos fariseus, pois é ele quem mais sente na carne o peso da ocupação romana: so­fre pacientemente, aguardando a intervenção libertadora de Deus.

OS MISERÁVEIS
Acontece também, infelizmente, que em conseqüência de maus negócios, de acidente ou de doença, alguém se torna incapaz de traba­lhar: mais ou menos excluído da comunidade torna-se mendigo, ladrão ou escravo.
Os mendigos vivem de preferência em Jerusalém, onde os pere­grinos são mais generosos; com efeito, parte do segundo dízimo pode servir para a esmola, que é uma obra muito meritória diante do Se­nhor. Entre eles, encontram-se muitos "leprosos", isto é, todos aque­les atacados de doença de pele e são considerados como impuros.
Mas pode-se também tentar a sorte como ladrão, seja em Jeru­salém, seja ao longo das estradas onde se vai roubar os viajantes im­prudentes. Embora o termo bandido abranja os ladrões e os zelotes (ver p. 77), parece certo que os ladrões formam um grupo que aumen­ta cada vez mais nos anos 60 d.C, aproveitando-se da instabilidade política. Já por volta de 35 a.C, tais ladrões importunavam tanto Hero­des, que ele desencadeara uma verdadeira guerra contra eles.
Os escravos judeus. O ladrão que é preso e não consegue ressar­cir os danos que causou, como também o judeu que pediu emprestado e não pode restituir, corre o risco de perder a liberdade, tornando-se escravo. Só podem tornar-se escravos o varão israelita adulto e sua fi­lha de menos de doze anos, mas não o filho nem a esposa. A filha adquire a liberdade aos doze anos, a não ser que seu senhor a despose, o que suprime imediatamente sua condição de escrava. O homem fica escravo no máximo seis anos (ver ano sabático, p. 31). O senhor o compra por uma soma que varia entre uma e dez minas (100 a 1000 dias de salário). O escravo judeu é juridicamente igual ao filho mais ve­lho do senhor; quanto à alimentação, à moradia e ao vestuário, deve ser tratado do mesmo modo que o senhor, o qual é obrigado, além do mais, a manter a família de seu escravo; os trabalhos por demais humi­lhantes lhe são vetados, por exemplo: lavar os pés do senhor, despi-lo antes do banho ou mesmo levar ao banho público a água de que se serviu. Finalmente, esse escravo judeu tem muita semelhança com um operário respeitado, que tem garantia de trabalho, e vende sua força braçal por seis anos. Sem dúvida, ele não é livre, mas pode, no caso de receber herança ou descobrir um tesouro, resgatar-se quando quiser. Isso só vale, evidentemente, se o senhor é também judeu; o senhor pagão tem outros princípios, normalmente mais duros, mas a família de um judeu vendido a um pagão tem o dever estrito de resgatá-lo.
O escravo pagão pode também tornar-se propriedade de um ju­deu, mas sua condição é então completamente outra: é comprado por toda a vida e o preço segundo suas qualidades, pode chegar até 100 minas; normalmente vale 20. É totalmente propriedade do senhor; portanto, nada pode possuir e tudo quanto pudesse encontrar ou rece­ber como indenização por um ferimento pertence ao senhor: portanto, está na impossibilidade de economizar para se resgatar, ao passo que isso é possível entre os romanos. O senhor pode tratar esse escravo como quiser e mandá-lo fazer o que quiser; as únicas limitações a esse respeito são certas mutilações infligidas ao escravo, que lhe valem a li­bertação imediata, e o assassínio voluntário do escravo, que é conside­rado crime e punido como tal. Contudo, por razões de pureza ritual, um pagão não pode morar na mesma casa com um judeu piedoso, nem sobretudo preparar suas refeições ou servi-lo à mesa: o senhor tem, pois, um ano de prazo, a partir da compra, para circuncidar seu escravo (mas ainda é indispensável que o interessado o aceite!) ou revendê-lo a um pagão. Esta circuncisão não o assemelha ao escravo judeu: supri­me a impureza fundamental e isto é quase tudo. As condições de tra­balho e de vida permanecem, efetivamente, as mesmas, pois o escravo é dispensado de todos os atos religiosos que têm lugar num momento preciso do dia ou do ano (prece ao nascer do sol, peregrinações...) e todos os preceitos positivos ("Tu deves fazer..."), pois todos esses preceitos prejudicariam a possibilidade de utilizá-lo. Ao contrário, cer­tas regras que não impedem o trabalho, como a oração depois da re­feição, são obrigatórias. A única grande aquisição obtida pela circunci­são é o direito ao repouso no sábado, que o senhor é obrigado a con­ceder


 FONTE: CADERNOS BÍBÇLICOS

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