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quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

AMOR PRÓPRIO



Amor próprio
Amar a si mesmo não é sinônimo de egoísmo

“A sensação de ser amado dá à pessoa a noção de existir, ao mesmo tempo em que agrega um valor positivo à existência”

Augusto César Maia é psicólogo clinico em Campinas, SP.
H

à pessoas que vivem se desmere­cendo, e são incapazes de tecer um comentário favorável sobre si mes­mas, ou até de receber um simples elogio. sem se sentirem desconfortáveis e achando que estão cometendo um pecado contra Deus. Alguns dão a impressão de que quem se arrisca na aventura do amor próprio se encontra, “obviamente”, numa posição egoísta. É bom deixar claro que ser egoísta não é sinônimo de amar a si mesmo. O egoís­mo é, na verdade, uma incapacidade de amar. E um bloqueio severo na afetividade.
O amor próprio do ser humano se desenvol­ve desde muito cedo na relação da criança com o seu meio. Nos primeiros momentos de vida da criança os pais atuam como espelhos, que devolvem determinadas imagens ao filho. Antes de adquirir qualquer noção de si mesma, a criança sente a percepção que os outros têm dela. A pri­meira experiência que vivencia é a do valor e do “desvalor” que os outros lhe conferem.
Se os pais estão sempre opinando sobre os fi­lhos a partir de uma perspectiva negativa, taxan­do-os de inúteis e incapazes, ou usando de zom­barias e ironias, formarão neles uma imagem ne­gativa de seu valor. O risco que se corre, ao co­locar na mente da criança uma imagem desvalo­rizada, é o de criar nela a incapacidade de perce­ber seu verdadeiro valor e de amar a si
mesma. O ser humano somente po­derá se amar quando se sentir realmente valioso para outra pessoa. Só amamos o que tem valor. Todo indivíduo pre­cisa de amor (valor) para se manter vivo. Quando uma pessoa e severamente privada do afeto paterno e/ou materno, abre-se uma grande ferida em seu in­terior, provocando pun­gente dor e grande vazio.
Como não suporta bem a dor, ela poderá se isolar e de­senvolver uma insensibilidade para com os outros. A negação do ou­tro alivia a dor.
Essa incapacidade de amar faz com que o indivíduo, em sua busca do último recurso para se manter vivo diante da grande dor, se feche, se centralize em si mesmo. Isso signifi­ca que ele só consegue ver, agir, pensar, fazer e viver em função de si mesmo. Tudo gira em torno dele, pois só enxerga a si.
Enfim, o egoísta se coloca no lugar do amor de Deus. Em vez de tudo e todos girarem em torno do amor de Deus, o egoísta vive como se o mundo devesse girar em torno dele. Ele é o centro de tudo, ocupando o lugar da cruz. E um usurpador de glórias. Para ocupar indevi­damente o trono, ele raciocina: “Já que não posso amar e ser amado, eu serei o amor!”
Portanto, para o egoísta é mais importante o que ele pensa. sente e deseja. Não tem rele­vância o que o pai, irmãos e amigos pensam. A tristeza ou a  alegria que o outro sente não faz a mínima diferença. É a polêmica do “não-­estou-nem-aí”. O outro que se vire.
O sutil perigo de tudo isso é que o mundo considera esse comportamento como uma ati­tude de “amar a si mesmo”. Muitos cristãos se deixam seduzir por essa idéia errônea de amor próprio, conforme os moldes seculares ou mundanos. Para eles, gostar de si mesmo é fa­zer tudo aquilo que vem à cabeça, não se im­portando com o que isso possa significar para o semelhante. Assim, perde-se a noção do limite de direitos e do respeito por si e pelo próximo. Porém, quem vive para o outro não se aliena de si. O ser humano existe na medida em que o amor do outro lhe valoriza, formando-se um círculo “virtuoso”: porque sou valorizado, habilito-me a valorizar; valorizan­do, sinto-me valorizado. Este círculo não só é le­gítimo, mas também imprescindível. É a con­dição indispensável ao desabrochar do desejo e da necessidade de querer algo melhor para si e para o outro.
É preciso que a pessoa se abra para receber o amor de Je­sus, que resgata nosso valor e nos torna dignos. Só crescemos à medida em que, sendo amados aprendemos que so­mos dignos e, portanto, capazes de amar a nos mesmos, ao próximo e a Deus.


Sinais dos Tempos    Maio-Junho/2002

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