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quinta-feira, 24 de julho de 2014

ARTIGOS SOBRE A TRINDADE - A NATUREZA HUMANA DE JESUS


A natureza humana de Jesus
Dois grupos de passagens bíblicas, aparentemente contraditórias, descrevem a natureza humana de Jesus

Por Wilson Endruveit                                                                                                     Revista Adventista, agosto 2004

Enquanto a divindade de Jesus é mais debatida fora dos círculos de nossa Igreja, Sua humanidade é um dos assuntos mais debatidos entre os adventistas do sétimo dia.
Até 1957, houve no adventismo forte consenso de que a humanidade de Jesus era igual à de toda pessoa após a queda de Adão (posição pós queda). Porém, mesmo durante aquele período, principalmente em meados dos  anos 1890, havia oposição ao conceito de “pós-queda”, como mostra George Knight no livro From 1888 to Apostasy, páginas 132-140.
A causa principal do debate acalorado  sobre a humanidade de Jesus foi a publicação do livro Seventh-day Adventists Anser Questions on Doctrine, em 1957. A posição “Pré-queda”, desenvolvida no livro  Questions on Douctrine, foi afrontada vigorosamente por M.L. Andreasen, a ponto de ele perder sua credencial. Após 1957,  Andreasen teve admiradores e oponentes, que alimentaram debates,  os quais continuam até hoje. De um lado, há o grupo “pré-queda” (posição pré-lapsariana) e do outro, o “pós-lapsariana).
O grupo “pós-queda” sustenta que a natureza de Jesus era como a nossa, e consequentemente, uma vez que Ele foi vitorioso tendo a nossa natureza, também podemos alcançar vitória perfeita sobre o pecado.  Infuenciados por Andreasen, muitos defendem a idéia de que a vitória perfeita do remanescente é absolutamente essencial para a vindicação de Deus e a iminência da segunda vinda de Cristo.
Os mais importantes defensores do conceito “pos-queda” são: M.L. Andreasen, Herbert Douglass, Robert Weiland, Thomas Davis, C. Mervyn Maxwell e Ralph Larson. Os defensores da posição “pré-queda” sustentam que Jesus era verdadeiramente homem, mas sem pecado. Nele, não havia apenas a ausência de atos  pecaminosos,  como também era isento da depravação  inerente ou tendências inatas para o pecado. Os mais importantes defensores dessa teoria escreveram o livro Questions on Douctrine, provávelmente R.A. Anderson, Le Roy Froom, W. E. Read, e mais redcentemente, Edward Heppenstall, Hans K. Larondelle, Raoul Dederen, Norman Gulley e outros.

Testemunho das Escrituras - Que di­zem as Escrituras a respeito da huma­nidade de Jesus? Ao analisarmos os fa tos, precisamos ser honestos. Há dois grupos de passagens biblicas, aparen­temente contraditorias, que descrevem a natureza humana de Jesus.
1. O primeiro declara que Jesus ti­nha uma natureza semelhante à nossa, dc acordo com as seguintes passagcns:
• Romanos 8:3: “Isso fez Deus en­viando o Seu próprio Filho em seme­lhança de carne pecaminosa.
Filipenses 2:7: “Antes, a Si mes­mo Se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-Se em semelhança de homens”
•   Hebreus 2:14, 16, 17 e 11. Jesus participou igualmente da carne e do sangue, e convinha que, em todas as coisas, Se tornasse semelhante aos irmãos.
2.   O segundo grupo de passagens salienta a singularidade de Jesus. ta­zendo-O diferente de nos e igual a Adão, antes da queda.
•   II Corintios 1:2 1: “Àquele que não conheceu pecado.” Como poderia Ele tomar a minha natureza e não co­nhecer o pecado?
• 1 João 3:3: “E nEle não existe pe­cado” Parece que as duas passagens desse grupo vão além da idéia de atos de pecado. Parecem sugerir que den­tro dEle, no intimo do Seu ser (ine­rente), não havia pecado. Jesus mesmo  sugere esse parecer nas passagens seguintes:

• João 14:30: O príncipe deste  mundo “nada tem em Mim’l Enquan­to Satanás tem algo em nós—pois, por natureza, somos filhos da ira (Efés. __ — Jesus declara que Satanás não tem nada nEle.
·         João 8:46: “Quem dentre vós Me convence de pecado?”
Pecado é transgressão da lei (1 João 3:4). Entretanto, Jesus o descreve como sendo mais que um ato. De acordo com o Sermão do Monte, quem é adúltero? Aquele que pensa de maneira impura. Pecado é atitude da mente, experiência interna, condição da natureza humana. Mais que um ato físico, pecado é uma atitude/con­dição da mente.
1 )e acordo com essas passagens, Jesus Cristo não tinha pecado, nem iimsnio em Sua mente, em Sua expe­riencia intima, no Seu coração. Não tinha más inclinações, nem tendên­cias mas.
lemos, portanto, dois grupos de passagens. Um declara que Jesus veio cm nossa semelhança carnal, e outro, que Jesus não conheceu peca­do. Não é de admirar que ambas as partes do debate sobre a natureza humana de Jesus apelem para as Es­crituras, em busca de apoio. Entre­tanto, a verdade não está em um lado, em detrimento do outro. Os dois grupos de passagens não são contraditorios. Eles se completam. Assim, concluimos que Jesus veio com a nossa natureza mas sem as tendências/propensões más. Para sermos tiéis às Escrituras, precisa­n~os incorporar dois aspectos em nossa compreensão da humanidade de Cristo: a semelhança (identifica-cão) e a singularidade. Ele é seme­lhante a nós, mas ao mesmo tempo ésingular desde o nascimento. “Era, como se cuidava, filho de José)’ Luc. 3:23. Jesus não teve pai humano. Seu nascimento foi sobrenatural; por­tanto, é impossível colocá-Lo num padrão humano, em circunstância de nascimento igual à nossa. “Mas o anjo lhe disse: Maria, não temas; porque achaste graça diante de l)eus. Eis que conceberás e darás àluz um filho, a quem chamarás pelo nome de Jesus. Este será grande e será chamado Filho do Altíssimo.
será isto, pois não tenho relação com homem algum? Respondeu-lhe o anjo: Descerá sobre ti o Espírito Santo, e o poder do Altíssimo te en­volverá com a Sua sombra; por isso, também o Ente santo que há de nas­cer será chamado Filho de Deus? Luc. 1:30-35.
Comparado com Adão, Jesus era igual a ele na ausência das inclinações más, e diferente dele porque apresen­tava os efeitos do pecado em Sua na­tureza humana. Cristo não veio com a estatura de Adão, nem tinha seu vigor mental e moral. Ele tomou sobre Si as fraquezas da humanidade degenera­da. Em estatura, vigor físico e mental, Ele veio igual ao homem de Seus dias, mas sem as tendências más.
Comparado a nós, Cristo teve uma natureza igual à nossa porque to­mou sobre Si os efeitos do pecado, ex­ceto o pendor para o mal. Nisso era diferente de nós. E se não foi exata­mente como nós, alguns perguntam:
Como podia Ele ser tentado em tudo, como nós? Não tinha Ele uma apa­rente vantagem sobre nós?
Antes de responder a essas per­guntas, vejamos o testemunho de E. 6. White sobre a humanidade de Jesus.

Testemunho de E. G. White – Como nas Escrituras, as declarações de E. G. White sobre a natureza humana de Cristo situam-se em dois grupos:
1. Um afirma que Jesus não tinha a natureza pecaminosa do homem (visão pré-queda).
“Ele tomou a forma humana, po­rém não a natureza pecaminosa. Na plenitude dos tempos deveria ser re­velado na forma humana. ... Deveria tomar a Sua posição à frente da hu­manidade, tomando a natureza mas não a pecaminosidade do homem? —   E. G. White, Signs ofthc Times, 20 de maio de 1901.
“Sede cuidadosos ao vos demo­rardes em pensar na natureza huma­na de Cristo. Não O apresenteis pe­rante o povo como um homem com as mesmas propensões para o peca­do. Ele é o segundo Adão. O primei­ro Adão foi criado como um ser puro e isento de pecado. Sem qual­quer mácula de transgressão sobre
deria cair, e caiu mediante a desobe­diência. Devido ao pecado, sua pos­teridade passou a ser gerada com propensoes inerentes à transgressão. Mas Jesus Cristo foi o Filho unigêni­to de Deus. Ele tomou sobre Si a na­tureza humana, e foi tentado em to­dos os pontos em que é tentada a na­tureza humana. Ele poderia ter peca­do, poderia ter caído, mas nem por um momento houve nEle uma má propensão” — E. G White, Seventh­day Adventist Bible Commentary, vol. 5, pág. 1.121.
Obviamente, Ellen White afirma que Jesus não tinha propensões peca­minosas em Sua natureza humana, nem atos pecaminosos em Sua vida.
“Nunca, de maneira nenhuma, deixai a mais leve impressão sobre as mentes humanas de que pairasse sobre Ele corrupção, mancha ou inclinação para o pecado, ou que Ele, em qual­quer hipótese, cedeu à corrupção. Ele foi tentado em todos os pontos como o homem é tentado, porém, é chamado de ‘aquela coisa santa’” — E. G. White, Seventh-day Adventist Bible Commen­tary, vol. 5, págs. 1.128 e 1.129.
Cristo era isento de pecado no sentido de que não tinha “inclinação para a corrupção”. Sua experiência pessoal também demonstrava que Ele não cedia à corrupção. Não havia pe­cado, tanto em Sua natureza como nas ações.
2. O outro grupo de passagens fo­caliza Jesus como sendo igual a nós (visão pós-queda).
“Teria sido uma quase infinita hu­milhação para o Filho de Deus, reves­tir-Se da natureza humana, mesmo quando Adão permanecia em seu esta­do de inocência, no Éden. Mas Jesus aceitou a humanidade quando a raça havia sido enfraquecida por quatro mil anos de pecado. Como qualquer filho de Adão, aceitou os resultados da ope­ração da lei da hereditariedade.” —   O Desejado de Todas as Nações, pág. 49.
“Cristo... [tomou] nossa natureza em seu estado deteriorado” —  Mensa­gens Escolhidas, vol. 1, pág. 253.
“Ele é nosso exemplo em tudo. É um irmão em nossas fraquezas, mas não em possuir idênticas paixões. Sen­do sem pecado, Sua natureza recuava do mal.” —    Testemunhos Para a Igreja, vol. 2, pág. 202.

Tentado em tudo como nós - Se Jesus não tinha propensões pecaminosas inatas, como pode Hebreus 4:15 afir­mar que Ele foi tentado em tudo como nós? Foram Suas tentações iguais às nossas? Não tinha Ele uma aparente vantagem sobre nós?
O Dr. Sakae Kubo, em uma de suas aulas a que assisti na Andrews University, fez comentários elucidati­vos sobre Hebreus 4:15, que achei apropriado incluir neste artigo.
“Jesus não precisava ter as pro­pensões pecaminosas com as quais nascemos. Precisava apenas vencer onde Adão caíra e nas condições de Adão. Satanás havia afirmado que Adão e Eva, antes do pecado, não eram capazes de guardar a lei. Cristo devia mostrar que o homem podia obedecer a Deus nas condições de Adão e Eva.” (Ler O Desejado de Todas as Nações, págs. 82 e 117.)
Mesmo sem tendências más ina­tas, Jesus poderia ter tido tentações iguais às nossas. O diabo apela às nos­sas más inclinações, ao passo que, com relação a Jesus, apelou às Suas boas inclinações. Mencionando coisas nobres, o inimigo tentava desviar Je­sus do plano de Deus.
Á luz do que foi dito, pode-se su­gerir que Hebreus 4:15 quer dizer que, em essência, Jesus foi tentado em tudo como nós, mas em formas ou maneiras diferentes.
À primeira vista, a primeira ten­tação de Jesus consistia em transfor­mar pedras em pães, mas o princípio básico em questão era se Jesus haveria de agir independentemente de Deus. Viveria Ele, à semelhança do homem, em completa dependência de Deus, ou menosprezaria a vontade do Pai, valendo-Se de Sua divindade em tem­po de prova? Era lícito satisfazer Sua fome, mas Ele não podia usar meios ilícitos, naquela ocasião, porque Deus havia planejado que Ele vivesse como o homem deve viver e vencer a tenta­ção exatamente onde Adão caíra, e em condição acessível ao homem.
A mesma tentação nos sobrevém em formas variadas e diversas. Ela nos assedia quando procuramos alcançar algum objetivo, quando procuramos satisfazer algum desejo, em contrapo­sição à vontade de Deus. O homem não deve “viver apenas de pão”  - isto é, satisfazer suas necessidades, mas viver “pela Palavra de Deus”, em harmonia com Sua vontade e Seus mandamen­tos. O objetivo primordial do homem não é a satisfação de suas necessida­des, mas o cumprimento da vontade de Deus. A mesma tentacão nos so­brevém quando somos tentados a ne­gar a Deus a fim de ganhar a subsis­tência, ou transgredir o sábado para obtermos salário melhor ou uma educação (titulo), casamento com in­fiéis, etc. Jesus enfrentou essa essência da tentação — a independência. A for­ma ou maneira dessa essência varia de acordo com tempo, lugar, sexo, etc.
A segunda tentação, ao contrário, consistiu na super-dependência: espe­rar que Deus fizesse o que não pro­metera. Satanás dirige essa tentaçao especialmente aos que dependem muito de Deus. Não somos tentados a pular do pináculo de um templo, mas a mesma tentação nos assedia quando somos tentados a expor-nos desne­cessariamente em situações perigosas, mesmo que seja por uma causa justa, ou quando nos recusamos a tomar as devidas precauções médicas; ou quando esperamos que Deus nos abençoe em nossos afazeres, sem que nos esforcemos; ou quando espera­mos que Deus resolva nossos proble­mas sem que Ele tenha prometido fazê-lo. “Não tentarás o Senhor teu Deus” por esperares que Ele faça o que não prometeu realizar.
A terceira tentação fala bem de perto a todos nós. Mas, novamente, a tentação de Jesus é muito maior do que a nossa. Satanás não nos oferece todos os remos do mundo, pois sabe que com bem menos pode satisfazer-nos.
Essa tentação sobrevém a nós quando somos estimulados a trocar nossa lealdade a Deus por alguma coi­sa ou alguém, simplesmente por mo­tivo de prazer, honra, posição tempo­ral, etc.
Uma vez que Jesus foi tentado como nós (velhos, jovens, ricos, po­bres, homens, mulheres, solteiros, ca­sados), pode simpatizar conosco em nossas tentações, que não são diferentes das dEle em essência, embora pos­sam diferir na forma ou maneira. Além disso, Ele não foi tentado como nós em essência apenas, mas em duas maneiras Jesus excedeu-nos na bata­lha contra o mal:
Primeiro, Ele nunca cedeu diante da tentação. Isto significa que Ele sen­tiu a força total de cada tentação de Satanás. Nós, ao contrário, cedemos antes de Satanás nos tentar com toda a força da tentação. Jesus, portanto sofreu tentações mais fortes que as nossas.
Segundo, “não vos sobreveio ten­tação que não fosse humana: mas Deus é fiel e não permitirá que sejais tentados além das vossas forças; pelo contrário, juntamente com a tenta­ção, vos proverá livramento, de sorte que a possais suportar. 1 Cor. 10:13.
Deus não permite que selamos tentados além de nossas forças. Colo­ca limites em torno de nós. Jesus, po­rém, foi alvo de tentações que não são comuns ao homem. Enfrentou tenta­ções adequadas para o segundo Adão. Seu poder divino foi desafiado por vá­rias vezes, e não Se valeu dele.
Para sentir o poder da tentação, Jesus não necessitava ter propensões pecaminosas como nós. A forca de tentações que lhe sohrevieram estava na possibilidade de Ele usar Sua divin­dade para resistir aos ardis cio inimigo.
Para Cristo, a principal tentação foi a mesma de todo ser humano —   o desejo de andar sozinho e depender de si mesmo, em vez de depender do poder divino.
Morris Venden ilustra a dinâmica central envolvida na tentação: Pessoas que dirigem autumóveis sem grande potência, não lutam com o desejo ir­resistível de dar grandes arrancadas ou dirigi-los em alta velocidade, pois sabem que sob o capô há um motor limitado. Porém, as mais tentadas a dirigir em alta velocidade são as que têm carros com motores de alta potência. Cristo era detentor de poder infinito, divino. Sua grande tentação consistiu em depender de Si mesmo em vez de depender do poder com­unicado pelo Pai.

Wilson H. Endruveit é reitor do SALT  no território da Divisão Sul-Americana.


Revista Adventista, agosto 2004

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