A mulher
Não é fácil determinar a condição da mulher na época de Cristo: é que
muitas informações nos são transmitidas por textos rabínicos posteriores.
Parece certo que o antifeminismo aumentou no decurso do séc. II da nossa
era, tanto no judaísmo como no cristianismo; antes dessa data, ele era muito
menos acentuado e é conhecido o sucesso encontrado, no séc. I, pelos fariseus,
nos meios femininos. É portanto perigoso — neste como em outros domínios —
extrapolar as informações que temos e dizer com certeza se a mulher que
apresentamos aqui é somente a de séc. II ou já a do I.
"Compra-se a mulher por dinheiro, contrato e relações
sexuais, constata um rabino. Compra-se um escravo pagão por
dinheiro, contrato e tomada de posse. Há então diferença entre a aquisição
duma mulher e a dum escravo? — Não!" Essa definição apresenta
bem a condição feminina: como o escravo, a mulher depende de seu senhor-marido
e tem que assumir todas as tarefas; não pode aproveitar-se nem dos rendimentos
do seu trabalho nem do que ela achar; só está sujeita aos mandamentos negativos
ou gerais da Lei e não aos que estão ligadas a um tempo preciso: senão, como
haveria de ocupar-se das crianças ou das tarefas do lar? Se não lhe é proibido
interessar-se pela Lei e pelas tradições, é muito desaconselhado, no entanto,
ensinar-lhe demais a respeito disso, pois "aquele que ensina a Torá à sua
filha ensina-lhe a prostituição"!
O lugar da mulher é em casa, ocupando-se dos filhos e da casa
e fiando a lã, na Judéia, ou o linho, na Galiléia: os textos prevêem a
quantidade mínima que ela deve fiar ou tecer por semana, quantidade esta que é
reduzida se ela amamenta um filho de menos de dois anos. Ela nada tem a fazer
fora de casa e se for obrigada a sair, deve guardar o anonimato mais completo,
por isso se usa o véu. Se ela conversa com alguém, por exemplo para pedir uma
informação, deve-se responder-lhe o mais brevemente possível; fora disso, não
se lhe deve dirigir a palavra, nem sequer para cumprimentá-la. Diante dum
tribunal, ela jamais é admitida como testemunha e menos ainda como juíza. Na sinagoga
ela tem seu lugar; no entanto, pode haver lá uma infinidade de mulheres, se não
houver dez homens adultos, é impossível celebrar o ofício.
Ela deve ainda aceitar que seu marido divida sua afeição
entre ela e outras mulheres, quer sejam esposas como ela, quer sejam
concubinas, ou até mesmo escravas. Notemos no entanto que a poligamia é muito
rara e isso em primeiro lugar por razões econômicas (ver p. 70).
Mas a mulher é também filha de Israel, o que lhe confere direitos. Tem
direito a um mínimo vital: seu marido é obrigado a lhe dar o necessário
em alimento, vestes e dinheiro para uso próprio, sem o que ela pode se queixar
perante um tribunal que, após inquérito, obrigará eventualmente o marido a se
divorciar: Ela também tem direito à dignidade: se ela cai na
escravidão, o marido deve fazer tudo para resgatá-la; se ela está doente, ele
deve conseguir-lhe os medicamentos necessários; enfim, ele não pode lhe impor
votos contrários à sua dignidade nem obrigá-la à prostituição. Finalmente, ela
não pode ser repudiada de qualquer maneira: o contrato de matrimônio é ao mesmo
tempo um freio para os desatinos do marido e uma garantia para a mulher (ver p.
70).
Tal é a situação jurídica que se deduz dos textos antigos, mas a realidade
é, de fato, menos sombria; principalmente na roça, se vêem mulheres ajudando os
maridos nos trabalhos da lavoura, outras se dedicando ao comércio. O amor conjugal
está longe de ser desconhecido e sabe transfigurar todas as leis, tanto assim
que em resposta a cada crítica ou razão para se desconfiar das mulheres, na
literatura antiga, pode-se citar um testemunho exatamente contrário.
Não esqueçamos tampouco as diferenças provenientes da situação
social, da possibilidade ou não de ter servos e servas. Em certas cidades, o
fato de as famílias judias viverem lado a lado com famílias pagas de
mentalidade greco-romana onde a mulher tem uma situação bem diferente, não deve
ter deixado de criar problema ou de influenciar os costumes.
FONTE: CADERNOS BÍBÇLICOS
FONTE: CADERNOS BÍBÇLICOS
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