Os fariseus fazem de modo sensacional sua entrada na história
no tempo de Alexandre Janeu (103-76): ousam opor-se a este rei sumo sacerdote
que lhes censura a influência sobre o povo; isto provocou o começo duma guerra
civil de seis anos, durante a qual milhares de judeus foram crucificados pelo
rei. Mas os fariseus saíram da guerra vitoriosos (ver p. 76) e exerceram grande
influência no reinado de Alexandra.
As origens deles são de fato mais longínquas: são relacionados
com o grupo dos hassidim e com Esdras, o sacerdote. Os hassidim são
os judeus piedosos (este é o sentido do termo hebraico) que, no tempo da
restauração nacional animada por Esdras, entendem que não basta reconstruir o
Templo, as muralhas e a cidade de Jerusalém, que é preciso também reconstruir
uma vida espiritual capaz de animar essas pedras, uma vida espiritual fundada
sobre o estudo da Lei para conhecer a vontade de Deus e sobre a oração. Esses hassidim
são os transmissores, se não os criadores, de numerosos salmos.
Durante a crise macabéia, esses piedosos não parecem unânimes: no começo,
estão do lado de Matatias, mas desde o tempo de Judas Macabeu, alguns deixam o
movimento, pois, a seu ver, a luta de Judas já tem um caráter mais político que
religioso.
Assim se vê esboçarem-se as diferenças entre três grandes correntes
judaicas. Os Saduceus exercem uma atividade política de compromisso com
o poder, para recuperar tudo que podem; os zelotas recusam todo
compromisso e lutam ativamente para expulsar o ocupante; os fariseus, próximos
ideologicamente destes últimos, recusam o engajamento político ativo e pensam
obter a salvação do povo e do país por sua piedade, favorecida por um estudo
sério da Lei. É por isso que, por exemplo, aceitam o sumo sacerdote Alcimo,
mesmo que ele já esteja imbuído do helenismo, porque com ele os sacrifícios
rituais podem recomeçar no Templo e Deus é, portanto, de novo honrado.
Sete espécies de fariseus
Os próprios fariseus sabiam, com humor ferino, distinguir
os bons e os maus dentre eles. Quatro textos do Talmud nos oferecem listas
diferentes dos diversos tipos (ver o artigo "Pharisiens" no supl.
Dict. Bible, col. 1074 ou R. ARON, Les années obscures de Jésus, Grasset,
1960, p. 151). Escolhendo livremente nesses quatro textos, eis alguns
extratos que apresentam sete categorias de fariseus:
Os "de costa larga": escrevem suas ações
nas costas para se fazerem honrar pelos homens.
Os "vagarosos": pretextam um preceito urgente a
cumprir para retardar o salário dos operários.
Os "calculadores" que assim refletem: já
que tenho em meu ativo muitos méritos, tenho com que pagar algum pecado.
Os "ecônomos": Que pequena coisa vou
executar para aumentar meus méritos?
Os "escrupulosos" que perguntam a si
mesmos: Que pecado oculto cometi para compensá-lo com uma boa ação?
Os "fariseus do temor" que agem como Jó.
Os "fariseus do amor" que agem como
Abraão: esses são os verdadeiros.
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Esta atitude de respeito para com o sumo sacerdote seja ele
quem for, ligada a uma desconfiança do poder político, vai continuar entre os
fariseus. Quando Pompeu vem ao Oriente e se lhe pede, em 63 a.C, para servir de
árbitro entre Hircano II e Aristóbulo II, o povo "pediu para não ter rei:
pois a tradição é que se obedeça aos sacerdotes do Deus que eles honravam e
esses homens (Hircano e Aristóbulo), descendentes dos sacerdotes, quiseram
levar o povo a mudar de governo para reduzi-lo à escravidão" (Antiguidades
judaicas 14,4). Esta delegação do povo é, de fato, a dos fariseus. Mais
tarde, Herodes Magno não conseguirá fazê-los prestar a ele o juramento de
fidelidade.
Esses fariseus, homens piedosos, conhecem bem a Lei,
esforçam-se primeiro por vivê-la eles próprios e consideram como seu dever difundi-la
ao seu redor, o que fazem, sobretudo na sinagoga (cf. p. 45). É lastimável que
se tenha chegado a caricaturá-los como hipócritas e não se deve tomar ao pé da
letra Mt 23: trata-se dum texto polêmico que muitos fariseus também aprovariam,
conscientes de sua imperfeição.
Desconfiança do poder e zelo pela educação das massas vão dar
aos fariseus uma audiência enorme junto do povo miúdo, a tal ponto que os
chefes deverão sempre levar em conta a sua opinião: o sumo sacerdote deve
submeter-se à decisão deles, mesmo num ato tão estritamente reservado como o
acesso ao Santo dos santos no dia do Kipur (cf. p. 51). Herodes Magno parece
ter mais consideração para com eles do que para com os Saduceus: ao subir ao
trono elimina diversos opositores, mas se contenta com impor uma multa aos
fariseus que recusam o juramento. No séc. I da nossa era, se os procuradores
parecem pender mais para o lado dos Saduceus, os fariseus encontram forte
apoio nos reis Agripa I e II; dado o seu lugar no Sinédrio, são eles
verdadeiramente os defensores do povo e se apresentam como o primeiro partido
que é ao mesmo tempo político e religioso.
Oriundos do povo, constituindo um partido do povo, os
fariseus procuram ser separados do povo (este é, ao que tudo indica, o
sentido do seu nome): eles o consideram por demais ignorante da Lei e sobretudo
impuro, por não respeitar suficientemente a Lei de santidade, expressão da
própria vontade de Deus. Desta Lei de Moisés, só uma parte foi posta por escrito,
sendo o resto transmitido oralmente de Moisés aos profetas e depois
aos sábios ou escribas (rabis), graças a um ensino esotérico que, no séc. I,
torna-se cada vez mais importante (ver Caderno Bíblico Nº 10). Essa Lei
oral tem o mesmo valor ou até mais que a Lei escrita. E é na medida
em que se respeita toda essa Lei, escrita e oral, que se adquirem os méritos
necessários à salvação e ao envio do Messias que estabelecerá enfim o Reino de
Deus, expulsando ao mesmo tempo os romanos e todos os outros ocupantes.
O farisaísmo era o único
movimento religioso que tinha profundidade bastante para resistir à catástrofe
de 70; é dele que em Jâmnia, na costa mediterrânea, renascerá o judaísmo
FONTE: CADERNOS BÍBÇLICOS
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