Três festas exercem, em Israel, um papel importante; são momentos
em que o povo faz questão de se reunir para manifestar a solidariedade que une
seus membros e para celebrar as grandes intervenções do Senhor, libertador de
seu povo: são as três festas de peregrinação, Páscoa, Pentecostes e
Tabernáculos (ou Tendas). "Três vezes por ano, declara o
Deuteronômio, todos os vossos varões se apresentarão diante do Senhor vosso
Deus no lugar que ele tiver escolhido: na festa dos Ázimos, na festa das
Semanas e na festa das Tendas" (Dt 16,16). Essas festas parecem ser, no
início, celebrações ligadas ao ritmo da natureza: na primavera, os nômades
oferecem à divindade os primogênitos do seu rebanho (páscoa) e os camponeses
sedentários, as primícias da colheita da cevada (festa dos ázimos); a festa das
semanas situa-se no verão, no fim da colheita do trigo e a das Tendas, no
outono, no fim da colheita das frutas. No decurso dos séculos, essas festas
foram "historicizadas", quer dizer, é ligado a cada uma delas um
acontecimento histórico, como veremos.6
No séc. I, cada uma dessas festas dura uma semana completa,
sem contar o tempo de caminhada que vai de poucas horas a duas vezes quatro
dias, para quem mora na Alta Galiléia. Viaja-se a pé, em caravana, que reúne
os peregrinos de uma ou várias aldeias: assim corre-se menos risco de ter más
surpresas da parte dos salteadores!
Seria utópico pensar que todos os judeus fazem efetivamente
essas três peregrinações. Para os da Diáspora, é impensável; para os
camponeses galileus não é impossível, mas é bem pesado em termos de tempo e de
dinheiro, tanto mais que os Ázimos e as Tendas caem em pleno período de
colheita, ocorrendo esta mais tarde na Galiléia que na Judéia. Assim, a festa
mais freqüentada é a Páscoa.
A FESTA DA PÁSCOA
À festa agrária fora ligada a lembrança da libertação do
Egito. Depois, com o passar dos tempos, o que se celebra nesta ocasião é o
"aniversário" dos grandes acontecimentos fundadores e libertadores de
Israel: a criação do mundo, a realização da promessa de descendência para
Abraão, a libertação do Egito e a (futura) libertação messiânica. (Ver o
"poema das quatro noites", tirado do targum do Êxodo e citado em
Cadernos Bíblicos nº 25 — Os Salmos e Jesus. Jesus e os Salmos, em
preparo).
Por ocasião da Páscoa, 180 mil peregrinos se concentram numa
cidade que possui talvez 25 mil habitantes, mais provavelmente 45 a 50 mil.7 Não podendo todos esses peregrinos se alojar
na Cidade Santa, os limites da cidade são ampliados para esta circunstância,
abrangendo as aldeias da periferia.
Na tarde do dia 14 de Nisan, os chefes de família (família no
sentido estrito ou grupo de 10 a 15 pessoas, incluindo mulheres e crianças)
vêm ao Templo com um cordeiro para ser imolado. Como não há lugar suficiente no
pátio dos israelitas para acolher todo mundo, observam-se três etapas:
primeiro as pessoas se colocam em fila diante dos sacerdotes que têm por missão
recuperar o sangue dos animais e ir levá-lo ao pé do altar em sinal de oferta
a Deus. Depois cada um volta para casa e lá esfola o animal e o assa. Durante
esse tempo, a esposa já retirou de casa tudo que poderia se assemelhar a pão
fermentado (quer dizer, feito com fermento) e preparou pães não fermentados e
"ervas amargas" (saladas diversas). Então tem início a refeição da
festa. Por ocasião do Êxodo, ela fora tomada às pressas (Ex 12,11); doravante
faz-se a refeição estirado sobre divãs à moda romana. Neste jantar festivo, o
vinho é obrigatório: se alguém é pobre demais para poder consegui-lo, o Templo
lhe dá o suficiente para encher as quatro taças regulamentares. Durante a
refeição, são cantados pela família os Salmos do Halel (SI 113-118),
entrecortados de bênçãos dadas pelo pai de família ou por aquele que faz as
vezes dele, sobre as taças de vinho.
Os filhos, surpresos — ou simulando surpresa — diante deste
jantar extraordinário que se realiza ao cair da noite, fazem perguntas:
"Por que tudo isso? Em que esta noite é diferente das outras noites?"
Então o pai explica o sentido dos diferentes ritos e descreve sobretudo as intervenções
de Deus em favor do seu povo.
Sobre a semana que se segue, faltam-nos informações: são dias de regozijo
diante de Deus, durante os quais cada um se esforça por consumir o produto do
segundo dízimo; no recinto do Templo têm lugar assembléias de oração, no
estilo das celebrações sinagogais, com leituras diretamente em ligação com a
festa e mais extensas do que de costume. Muitos peregrinos aproveitam a ocasião
para oferecerem sacrifícios de comunhão, para escutar os rabinos afamados
explicar esta ou aquela passagem da Lei ou dar um conselho jurídico. A animação
é tal que o procurador romano, sempre preocupado em manter a ordem, deixa
Cesaréia marítima para vir controlar de perto a situação: do alto da fortaleza
Antônia onde reside (a menos que não fique no antigo palácio dos Asmoneus),
ele ocupa as primeiras salas para observar o que se passa no pátio do Templo e
para intervir caso haja a menor desordem. A presença do procurador e de reforços
policiais parece tanto mais necessária, porque na ocasião da Páscoa ou das
outras festas de romaria, personalidades políticas ou diplomáticas chegam à
Cidade Santa: Herodes Antipas (cf. Lc 23,7), Agripa, um oficial superior da rainha
da Etiópia (cf. At 8,27), a rainha de Adiabene que vai mandar construir para si
um túmulo na periferia de Jerusalém . . . Essas concentrações populares são
igualmente favoráveis aos golpes violentos dos zelotes. E Josefo nos informa
que os principais sinais precursores da revolta judaica de 66 tiveram lugar
precisamente por ocasião das peregrinações.
PENTECOSTES
Como o indica sua etimologia grega, esta festa começa 50 dias
após a Páscoa (cf. Dt 1 6,9). O livro do Êxodo chama-a de festa da colheita
(Ex 23,16) ou das semanas (34,22). Mediante uma ligeira modificação
vocálica, alguns fizeram dela a festa dos juramentos. À sua celebração
foi vinculada, com efeito, a Aliança do Sinai; parece que desde o séc. I da
nossa era, ela se tinha tornado a festa' da renovação da Aliança (e sem dúvida
não é por acaso que o autor dos Atos coloca neste dia a vinda do Espírito
Santo).8
Nos inícios da era cristã, os diferentes grupos religiosos
não concordam entre si quanto à data da sua celebração; assim é que certos
grupos como os fariseus terminam a festa no momento em que outros como os
Essênios ou o autor do livro dos segredos de Henoc a começam.
TENDAS
Para Josefo, é esta "a mais santa e a maior das
solenidades judaicas" (Antiguidades VIII, 100). Sua origem é
também rural, como no caso das festas precedentes: celebra o fim das colheitas
frutíferas e tem todas as aparências de uma festa das vindimas com a alegria e
os riscos de embriaguez que isto comporta! "Mas o Levítico (23,43) denota
uma evolução e relaciona-a com a história: a festa deve relembrar que Deus fez
os filhos de Israel morar em cabanas quando saíram do Egito. A dedicação do
templo de Salomão coincide com esta festa (1 Rs 8,65-66), já lhe dando assim
uma relação especial com o santuário, lugar da Presença e da proteção divinas.
Segundo o Targum, as cabanas deviam efetivamente fazer recordar as nuvens
protetoras da epopéia do deserto. Esdras (3,4) nos fala que os repatriados
celebram a festa logo que o altar é reconstruído, antes mesmo de estarem colocados
os alicerces do novo templo, e Neemias (8,13-18) descreve uma celebração
segundo o ritual de Lv 23,40-43, com leitura quotidiana da Torá (cf. Dt
31,10)".9
Esta festa é a mais espetacular de todas: para celebrá-la,
cada família deve construir nos arredores imediatos de Jerusalém uma cabana de
folhagens, na qual ela vai morar uma semana. Certos ritos eram muito populares
como a procissão dos sacerdotes cada manhã, até Siloé, acompanhados por todo o
povo levando palmas (os lulav), ao som do shofar (longo chifre de
carneiro que serve de trombeta), a libação da água sobre o altar (cf. Jo 7,37)
talvez para pedir o retorno das chuvas, a procissão em torno do altar e o
acender quatro grandes candelabros de ouro no pátio das mulheres (cf. Jo 8,12)
que iluminavam a cidade inteira.
OUTRAS FESTAS
Ao lado dessas três grandes festas de peregrinação, existiam
outras como o Yom Kipur ou Dia das expiações (que ficou célebre
pela "guerra de Kipur" em 1973!). Era celebrada alguns dias antes da
festa das Tendas. Não é um dia de alegria, mas ao contrário, de tristeza e de
jejum, no qual se pede a Deus que apague todas as faltas de seu povo; durante
24 horas o povo se abstém de qualquer alimento e se reúne no Templo, onde o
sumo sacerdote realiza solenemente o rito da expiação pelas suas faltas e
pelas de todo o povo: é o único dia do ano em que o sumo sacerdote é obrigado a
presidir a liturgia (a não ser que ele esteja impuro, mas para evitar isso,
fica preso durante a semana anterior!); é o único dia em que ele penetra no
Santo dos santos para aí depor um incensório e lançar, contra a pedra que
outrora serviu de suporte à arca da aliança, o sangue do carneiro oferecido em
holocausto pelas faltas ocultas dele próprio e do povo; o dia, enfim, em que é
solenemente conduzido para o deserto o bode Azazel, portador de todos os
pecados de Israel. Os ritos, já descritos em Lv 1 6, são abundantemente
comentados e ampliados na literatura antiga. Notemos que a teologia da epístola
aos Hebreus é construída sobre esse rito
Rosh Hashana é a festa do Ano
Novo. Celebrada dez dias antes do Yom Kipur, é uma festa austera que prepara a
celebração do perdão.
A Dedicação ou Hanuká, em
dezembro, celebra o aniversário da purificação do Templo, após a vitória de
Judas Macabeu em 1 64 a.C. (1Mc 4). Josefo a denomina "a festa das
luzes" (cf. Jo 10,22).
Os Purim ou as sortes comemoram a libertação do
povo narrada no livro de Ester. Tornou-se o equivalente do
"carnaval".10
O sábado
As festas de Deus (Lv 23,4) são, literalmente, entrevistas que Deus
concede a seu povo para santificar o tempo. O sábado exerce a mesma função, mas
segundo um ritmo semanal.
Sua origem é muito complexa.11 As legislações sacerdotais que o codificaram
definitivamente durante o Exílio (Lv 23,3; Ex 31,12-17) ajuntaram duas
instituições, distintas na origem, mas ambas muito antigas: um dia de festa
semanal e um dia de folga obrigatória (nos textos antigos — Ex
23,12; 34,21 — esse dia de repouso não é chamado sábado). Por que esse ritmo de
sete dias? Isto parece estar ligado ao calendário lunar dos antigos
semitas do sul da Mesopotâmia, onde o mês não estava ligado às fases da lua,
mas à sua posição em relação à constelação na qual ela se encontra na aurora.
O valor religioso do sábado foi desenvolvido em duas
direções. Uma insiste no aspecto humanitário e social: o homem, especialmente o
escravo, deve poder descansar; esse aspecto libertador do sábado está associado
à libertação dada por Deus por ocasião do Êxodo (Dt 5,14-15; Ex 23,12). O sábado
foi também associado à criação: no sétimo dia Deus cessou (de intervir), literalmente
fez sábado (Ex 20,11; Gn 2,2-3).12
A prática do sábado foi codificada cada vez mais
estritamente no decorrer dos tempos, tendendo às vezes a se tornar uma espécie
de absoluto escravizando o homem. Jesus não fará senão restituir-lhe seu
significado primitivo quando declara: "O sábado foi feito para o homem e
não o homem para o sábado" (Mc 2,27).
A ORAÇÃO QUOTIDIANA
De manhã, antes de qualquer
atividade, e à tarde, os homens adultos deviam rezar. Voltados para o Templo de
Jerusalém, recitavam uma prece de bênção, depois o Shemá, bem como as
primeiras e as últimas das Dezoito bençãos ou Shemoné Esré que
certamente já estavam em uso
FONTE: CADERNOS BÍBÇLICOS
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