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domingo, 11 de maio de 2014

DESCOBERTAS ARQUEOLÓGICAS


 


 
céu ainda está escuro quando o despertador obriga todos a levantarem da cama. Alguns são rápi­dos e logo estão prontos para as atividades de mais um dia. Ou­tros, é claro, têm mais dificulda­de para acordar e, por isso, preci­sam ser estimulados com um pouco de barulho e talvez “água fria”. O ambiente é descontrai do e há muitas brincadeiras, pois a maioria são jovens de vários paises que dedicam suas férias de verão a projetos arqueológicos no Oriente Médio.

Após um reforçado desjejum, que inclui ovos, pão, leite, frutas  e até pepinos crus, todos ajudam a colocar o equipamento nas vans (conhecidas em árabe como che­ruts) que os levarão ao campo de trabalho. Há muito para ser carregado e nada pode ficar para trás. Trenas, lápis, sacos plásticos, pi­caretas, pás e etiquetas são alguns dos muitos instrumentos utilizados. Tudo é rapidamente colocado nos veículos, que logo saem levando o grupo para as atividades no sítio arqueológico. E as­sim que começa um típico dia de esca­vações no Oriente Médio.

O   trabalho em si é bastante árduo e não se assemelha em nada àquelas ver­sões cinematográficas como a Múmia ou o clássico Indiana Jones. São horas a fio debaixo de uma lona que, além dos bo­nés e chapéus, é a única proteção para um sol de 40” C em média nessa época do ano. Mas o que leva jovens e profes­sores universitários a trocarem uma bela praia no verão pelo calor desértico do Oriente Médio? A pura (porém, forte) paixão pela história da civilização.

Para esses descobridores, a aventu­ra arqueológica não está em achar te­souros perdidos ou lutar contra uma máfia para resgatar o mapa das minas do rei Salomão. O fascínio do arqueó­logo está muitas vezes na descoberta de um pequeno tablete de argila cujas poucas inscrições podem conter a cha­ve para o entendimento de algum pon­to misterioso do passado. Até mesmo uns poucos cacos de cerâmica espalhados pela terra podem revelar muitas verdades acerca da história da humanidade.

 

DESCOBERTAS — Para um especialista em ciências bíblicas ou um leigo que se devota a estudar e amar as Escrituras Sagradas, o fascínio pela arqueologia do antigo Orien­te Médio é justificado pelo fato de que foi nessa parte do mundo que ocorreu a maioria dos eventos narrados desde o Gênesis até o Apocalipse. Esse limite geográfico contempla países como Egito, Lí­bano, Síria, Jordânia, Turquia, Iraque e Israel, entre outros.

Esses territórios, como se sabe, são um verdadeiro bar­ril de pólvora envolto em conflitos armados e interven­ção internacional. A recente guerra no Iraque destruiu, talvez para sempre, relíquias que jamais serão repostas. Nem o Museu Nacional de

Bagdá escapou da destruição cau­sada pelos saques. Evidentemen­te, tal situação dificulta bastante o trabalho e até impede o avanço de algumas pesquisas de campo. Porém, mesmo enfrentando bar­reiras, a arqueologia tem se de­senvolvido tremendamente nos últimos 200 anos. As últimas des­cobertas vieram como um prêmio aos que, a despeito das dificulda­des, insistem em desenterrar a história contada na Bíblia. Confi­ra algumas delas:

 

    Os ossuárjos de Caifás e Tia­go. Segundo o costume dos dias de Cristo, após a morte de um individuo, seu corpo era enfaixado e posto numa gruta, onde permanecia por vários anos em putrefação. Depois desse período, as leis de purificação judaicas exigiam que os ossos fos­sem retirados e, somente então, “se­pultados” em caixas de pedra (os­suários), que eram devidamente de­positados em vãos dispostos nas pa­redes dos túmulos familiares. Por mais estranho que pareça, o indiví­duo só era sepultado anos depois de sua morte. Cada caixa poderia con­ter uma ou mais ossadas. No seu exterior escrevia-se o nome de quem estava depositado ali. Vários desses ossuários já foram encontra­dos. Porem, dois deles merecem destaque por sua relação direta com o Novo Testamento.

O primeiro foi descoberto em novembro de 1990 e trazia os ossos de um homem de aproximadamen­te 60 anos, cujo apelido e nome completo estavam escritos por fora em aramaico. Seu apelido era “Qafa” e seu nome completo era “Yosef bar Qayafas”, ou, em portu­guês, “Caifás” e “José filho de Cai­fás”. Trata-se de uma referência cla­ra ao sumo sacerdote que partici­pou no julgamento de Jesus. A Bí­blia não fala que ele se chamava José, mas Flávio Josefo, historiador judeu do 1o. século d.C., confirma que esse era seu primeiro nome. Caifás era o sobrenome de família.

O segundo ossuário, de acordo com as indicações de Hershel Sahnks, editor da Biblical Arqueological Review, foi ad­quirido por volta de 1980 num mercado de antiguidades de Israel. Todavia, so­mente agora foi trazido a público, graças à perita observação de André Lamaire, um especialis­ta em inscrições antigas. Sua atenção foi chamada para o fato de que o nome do indivíduo se­pultado (cujos ossos não se en­contram mais na caixa) trazia urna inovação em relação aos exemplares até então encontrados.

E que todos os anteriores geralmente continham o nome do morto e, nalguns casos, sua filiação paterna ou sobreno­me, como no caso de “José filho de Cai­fás”. Esse ossuário acrescentava algo ao nome do falecido, que era Tiago. O tex­to escrito em araniaico do 1o. século diz:

“Tiago, filho de José, irmão de Jesus”. Muitos especialistas se mostram reticentes em considerar esse Tia­go e esse Jesus os mesmos perso­nagens citados na Bíblia (o que faria do achado a mais antiga referência extrabíblica ao Sal­vador), O próprio Lamaire estima que haveria pelo menos 20 Tiagos filhos de José dentre a população de 80 mil pessoas que havia em Jerusalém. Em toda a Palestina, esse número seria ainda maior, pois ambos os nomes eram muito comuns naquele tempo. Contudo, ele mesmo admite que a referência “irmão de Je­sus” é, no mínimo, intrigante. As coincidências começam a se afunilar demais quando se trata de um Tiago, filho de José e irmão de Jesus. Quais as possibilidades matemáticas de en­contrar duas pessoas com essas mes­mas características numa pequena al­deia de Israel? Além disso, é histori­camente insustentável que o nome de um irmão configure num ossuário ao lado do nome do pai, a menos que o irmão seja muito famoso ao ponto de inovar a tradição corrente.

“O ossuário é original; e a primei­ra parte da inscrição, ‘Tiago, filho de José’, é autêntica; mas a segunda me­tade da inscrição, ‘irmão de Jesus’, é uma imitação pobremente executada”, avalia Rochelle Altman, especia­lista em escritas antigas baseadas na fonética. Robert Eisenman, autor de um livro sobre Tiago e professor de arqueologia e religiões do Oriente Médio, acha que a caixa é perfeita de­mais para ser original.

Seja como for, esse achado, infe­lizmente danificado durante uma viagem para a América do Norte, ainda promete muita discussão nos círculos acadêmicos. Pelo menos dois livros dicutindo as implicações da descoberta já foram lançados nos Estados Unidos.

• A inscrição de Joás. Escrita em paleohebraico, essa placa de pedra retangular apresenta uma referência de 10 a 15 linhas aos reparos do Templo de Salomão. Se a peça, que ainda está sendo estudada pelos ar­queólogos, se mostrar autêntica, ela será a mais forte evidência extrabí­blica a confirmar algumas porções do Antigo Testamento, especialmen­te do livro de 2o. Reis.

Segundo o rabino Yaakov Meidan, especialista do Gush Etzion Institute, o texto hebraico da pedra possui uma forma fenícia de escrita que apontaria sua data de produção para algo em tor­no do 9o. século a.C. Detalhes da inscri­ção parecem referir-se aos reparos do templo feitos durante o reinado de Joás, que governou a Judéia de 836 a 798 a.C. Um fato que chamou a atenção nos exames preliminares foi a presença de salpicos de ouro fundido na superfície de pedra, os  quais poderiam ter sido causados por um incêndio como o que destruiu o templo em 586 a.C.

Não se tem ao certo o histórico de onde essa pedra foi escavada, o que aumenta a suspeita de fraude. Por outro lado, há sérias evidências  de sua autenticidade, e muitos especialistas acreditam poder se tratar de um grandioso achado da arqueologia. O grande problema, no  caso específico dessa inscrição, é que ela esbarra num problema político do Oriente Médio. Há séculos judeus e palestinos disputam o território de Jerusaçém e especificamente o chamado “Monte do Templo”, que, desdeo ano 691, abriga (no lugar do antigo templo judeu) o segundo maior edifício de oração islâmico do mundo, a Mesquita Al-Aksa. Nas proximidades, fica o Muro Ocidental ou das Lamentações, o locar mais sagrado do judaísmo, pois pois é único remanescente do segundo templo ou Templo de Zorobabel, que foi destruído pelos romanos no ano 70 dc.

Os palestinos (apoiados por todos os grupos árabes do Oriente) negam que aquele tenha sido o lugar autêntico do antigo Templo de Salomão, por isso faria deles os invasores de um local sagrado mais antigo que sua mesquita. Assim, as implicações políticas dessa evidência seriam bastante complexas, especialmente no tenso cenário que envolve Israel e o mundo árabe.

O tijolo de Babilônia. Bem longe do conflito e das tensões do Orien­te Médio, um impor­tante achado teve sua história localizada aqui mesmo no Brasil. Tra­ta-se de um tijolo babi­lônico com inscrições cuneiformes que con­firmam a existência de Nabucodonosor, rei de Babilônia, o qual é di­versas vezes cidado na Bíblia, especialmente no livro de Daniel.

Até meados de 1890, Nabucodonosor e até a própria cidade de Babilônia tinham sua existência negada por uma série de especialistas céticos. O livro de Daniel, nesse contexto, seria apenas uma novela judaica produzi­da no 2o. século a.C. Nada de seu en­redo seria de fato uma história real. Essa conclusão, no entanto, tornou-se sem sentido quando Babilônia foi finalmente desenterrada pela pá dos arqueólogos. Os alicerces e artefatos que surgiam testemunhavam clara­mente da suntuosidade do que havia sido aquele vasto reino. Em centenas de tijolos com escrita cuneiforme, o nome do principal rei e edificador da grande cidade aparecia com tremen­do destaque, dizendo: “Eu sou Na­bucodonosor, rei de Babilônia; eu er­gui este edifício”.

Tijolos contendo essa sentença e outras similares, podem ser vistos nos principais museus de arqueologia do mundo e um desses tijolos está hoje no Brasil em permanente exposição no Museu Paulo Bork de arqueologia que pertence ao Centro Universitário Adventista (Unasp), em Engenheiro Coelho, interior de São Paulo.

A aquisição do artefato foi, no mí­nimo, curiosa. Um brasileiro que tra­balhou no Iraque por muitos anos trouxe a pedra das ruínas como lem­brança dada por um soldado iraquiano. Depois de algum tempo, supôs que a mesma estaria melhor nas mãos de seu amigo Paulo Barbosa, que ex-professor do ensino médio numa rede particular de Vitória, ES. A partir de então, Barbosa passou a utilizar o ob­jeto como ilustração em aulas de reli­gião e história.

O tijolo possuia símbolos antigos dispostos em três linhas paralelas muito bem desenhadas que conti­nham uma inscrição do 6o. século a.C. Porém, não se sabia o significa­do do conteúdo, situação que perdu­rou por quase vinte anos, até à apo­sentadoria de Barbosa.

Mudando-se para a vizinhança do Unasp, Barbosa teve a oportuni­dade de apresentar o objeto a um dos curadores do museu arqueoló­gico, que, utilizando dicionários e léxicos especializados, traduziu o texto e encontrou claramente a ex­pressão “Eu sou Nabucodonosor, rei de Babilônia”. Confirmada a au­tenticidade do artefato, Barbosa re­solveu doá-lo ao museu, onde pode ser visto ao lado de vários outros objetos que fazem parte da única coleção pública de arqueologia bí­blica da América do Sul.

Apesar de todas as dificuldades, o trabalho dos arqueólogos não pode parar. E a cada ano, especial­mente no verão, as equipes partem para novas expedições, na esperan­ça de que da terra saia outra novi­dade acerca de um passado que diz muito sobre quem somos e para onde caminha a humanidade.

 

Sinais dos Tempos Julho-Agosto de 2003

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