“SEJA ENTREGUE A SATANÃS”
Comentário Exegético de I Cor. 5:5
Introdução
A tradução Revista e Atualizada no Brasil apresenta:
“Entregue a Satanás para a destruição da carne, a fim de que o espírito
seja salvo no dia do Senhor.”
Sendo este um dos textos mais citados pelos nossos oponentes, crentes na
imortalidade da alma, com o prova da dicotomia que fazem entre corpo e alma,
ele necessita de uma análise detida,
para se chegar á conclusão exata do que Paulo queria dizer.
Os que ensinam doutrinas não defensáveis pela Bíblia, se valem de versos
difíceis de serem explicados para nos confundirem e rejeitarem as mensagens
que pregamos. Não nos devemos impressionar com as artimanhas dos inimigos da
verdade, por mais especiosas que sejam, porque temos a verdade e esta não teme
nem ataques nem confrontos.
Comentários Gerais
Em nenhum Dicionário ou Comentário Bíblico, encontramos uma explicação
defendendo a extravagante idéia, do corpo ser destruído em conseqüência do
pecado e a alma ser salva para o reino de Deus.
Para uma impressiva compreensão desta passagem devemos conhecer bem o
contexto, porque este nos ajuda a entender o motivo da declaração paulina.
No primeiro verso do capítulo cinco lemos:
“Geralmente se ouve que há entre vós imoralidade e imoralidade tal, como
nem mesmo entre os gentios, isto é, haver quem se atreva a possuir a mulher de
seu próprio pai.”
O relato do apóstolo nos dá
a entender que ele ouvira esta desagradável história, provavelmente, através
dos escravos da casa de Cloé (ver I Cor. 1: 11). Concluimos, que das notícias
indignas que ouvira, relatando o procedimento reprovável de alguns membros da
igreja de Corinto, o caso mais escabroso era um pecado de incesto. Certa pessoa
mantinha relações sexuais com a mulher de seu pai, evidentemente sua madrasta.
O vocábulo grego traduzido por imoralidade é “pornéia”, que significa
prostituição, falta de castidade, fornicação. Em grego a palavra designava
qualquer relação sexual proibida. A palavra “pornográfica” muito usada, entre
nós, para designar gravuras ou literatura obscenas nos indica porque ela é apropriada
para as mulheres decaídas. Paulo usando “pornéia” e não “moicheia” adultério,
talvez indique, que o pai daquele homem já houvesse falecido. Não havendo
nenhuma censura, por parte do autor da epístola à mulher, tem levado os comentaristas
a concluírem que ela não era cristã.
A surpresa ao apóstolo, de acordo com o verso dois, é que esta pessoa, apesar
de seu pecado ser público e.vexatório para a incipiente comunidade cristã, ela
continuasse desfrutando da comunhão da igreja. Ele censura duramente os membros
da igreja. por sua complacência em face deste notório escândalo. Baseado em
sua autoridade apostólica, mesmo ausente (estava em Éfeso como nos indica o capítulo
16 verso 8) o afastamento
do faltoso ou a sua excomunhão da igreja.
O torneio frásico para indicar esta disciplina — “seja entregue a Satanás para destruição da carne” tem
trazido alguma perplexidade aos comentaristas, porque ele parece destoar com a
harmonia que existe entre as doutrinas bíblicas.
Para a boa compreensão desta sentença é necessário atentar para os
seguintes itens:
1o.) No original não se
encontra a palavra corpo (soma), mas carne (sarks). Esta palavra grega tem
vários significados, entre eles o de natureza ou tendência carnal. Por isso a
tradução inglesa — Authorized Version — apresenta
com propriedade I Cor. 5: 5 assim: “Entregue ao domínio de Satanás o homem
que assim pecou, para a destruição de suas cobiças carnais; a fim de que seu
espírito se possa salvar no dia do Senhor Jesus.”
29) Nosso pródromo em crítica textual bíblica, o exegeta Arnaldo
Cristianini escreveu:
“O pensamento paulino era
que o autor de tão infame pecado fosse imediatamente excluído da comunhão da
igreja, entregue á sua própria sorte, sofresse fora da proteção de Deus, sob o
domínio do príncipe das trevas, e viesse a cair em si, a arrepender-se e,
finalmente, a ser recuperado na fé e salvar-se por ocasião da vinda de Jesus.”
Para comprovar suas afirmações ele cita alguns autores, que aqui
transcrevemos:
Huberto Hohden: “Na qualidade de representante de Jesus Cristo, excluiu S.
Paulo da comunidade eclesiástica o pecador impenitente e escandaloso,
entregando-o ao reino de Satanás, isto é, ao mundo dominado pelo príncipe das
trevas, para que este castigo o faça cair em si (arrepender-se).”
P. Matos Soares: “Seja o tal entregue a Satanás, seja separado da comunhão
da igreja, para a morte da carne, isto é, para ser atormentado no seu corpo por
Satanás por meio de doenças, causadas pelos seus próprios vícios, de modo que,
assim castigado, se venha a voltar para o bem, e sua alma seja salva.
Do autor batista A. B. Rudd em seu Comentário
às Epístolas aos Coríntios:
“Esta passagem não é difícil de entender. Paulo já tinha juízo formado
sobre o caso, e dá instruções concretas à igreja. Sem entrar em todos os
pormenores destas instruções, resume-as como segue: ‘O autor de tal ato
incestuoso não é digno de ser membro de vossa igreja; portanto, em nome de
nosso Senhor Jesus e com Sua autoridade, separai-o formalmente da comunhão e
deixando-o assim no mundo cujo príncipe é Satanás, ficará sujeito à influência
dele, que pode infligir-lhe no corpo moléstias que resultam logicamente dessa
espécie de pecado. Esse castigo servirá para despertar o arrependimento no transgressor e importará
assim em sua salvação.”
A obra Exposicão da Primeira Epístola
aos Coríntios, págs. 51 e 52, do presbiteriano Charles R. Erdman, nos
declara:
“A falta era gravíssima. O ofensor
vivia maritalmente com a própria madrasta... Paulo, como se presente estivera
na congregação, descreve o ato solene da disciplina como já estando a
realizar-se: ‘Considerai-me, pois, presente no vosso meio, a sentenciar, em
nome de Cristo e com a vossa aquiescência, a excomunhão do autor da infâmia,
bem como a sua entrega a Satanás, para que lhe imponha sofrimentos capazes de
quebrar a força de sua cobiça pecaminosa, e assim venha a sentir arrependimento,
seja restaurado à condição anterior, e se salve no dia do Senhor!...
“O que mais importa, porém, é observar que o sofrimento, qualquer que
fosse sua natureza e procedência, teve como escopo reconduzir a culpada
ao arrependimento, como uma advtertência de que o alvo supremo de qualquer ação
disciplinar na igreja é a reabilitação dos ofensores.”
Cristianini conclui suas asseverações desta parte declarando:
“Não indica no texto que o corpo perece e a alma se salve. Dizem as
Escrituras que Deus lançará na geena tanto o corpo como a alma. A salvação,
como a perdição, abrange o homem
integral.” — Revista Adventista, Julho de 1958, pág. 37.
Confirmando, que os comentaristas, apenas com palavras diferentes, insistem
na mesma tecla, eis o que se encontra em The
Interpreter’s Bib/e, vol. 10, pág. 62, ao comentar I Cor. 5:5:
“Na verdade, o apostolo entrega o homem a Satanás,
tendo em vista a destruíção de
sua natureza carnal.
Isto também tinha seus precedentes: Paulo é fruto do seu tempo. Com a história
de Jô e muitos outros exemplos em mente, ele partilhava da crença geralmente
aceita, de que os poderes sobrenaturais do mal, estão sempre a postos para
tentar e destruir os fiéis, assim como já foi provado, testado e tentado. Muito
mais atormentariam eles os que fossem desligados da comunhão da igreja. As
conseqüências poderiam tomar várias formas, tais como enfermidade e sofrimento
e até mesmo a morte. Tais idéias eram comuns tempos e não são desconhecidas da
mitologia grega. Elas ainda exerciam uma poderosa influência na mentalidade
judaica (Lucas 13: 1-5). Paulo e a comunidade judaica partilhavam dessas
opiniões. Portanto, invocando sua autoridade apostólica, e no sagrado nome do
Senhor Jesus ele entrega o homem a Satanás, para que através do sofrimento seu
espírito pudesse ser salvo no Dia do Juízo. A porta não é cerrada para
sempre. Tendo lugar uma mudança de coração, a restauração pode ocorrer.
Contudo a disciplina é essencial. Os grandes padrões da moralidade cristã devem
todos os meios que a disciplina seja em primeiro lugar persuasiva em seu
método de lidar com aqueles que se têm desviado. Que a fraternidade, a amizade
e a assistência cristã façam o máximo possível.”
Este estudo estaria incompleto se não acrescentássemos aqui o que diz o
Comentário Adventista (SOA BC) sobre
o texto de 1 Cor. 5:5:
Seja entregue a Satanás. Só existem dois remos espirituais neste mundo: o de Deus e o de Satanás.
Se alguém deixa o reino de Deus, naturalmente passará a participar do reino de
Satanás (ver 5. João 12: 31; 16: 11; II Cor. 4:4). Aquele pecador ousado e
arrogante se havia, por seu próprio procedimento pecaminoso, se afastado do
reino de Deus, e isso deviam os irmãos da igreja reconhecer, expulsando-o da
igreja. Comparar com I Tim. 1: 20.
Para destruição da carne. As
Escrituras chamam as práticas imorais de “obra e da carne”. (Gál 5: 19; Col. 3: 5). Os
cristãos são admoestados a não viverem segundo a carne (Rom. 8: 13). A “destruição da
carne” pode, pois, ser compreendida como uma mortificação dos desejos carnais.
A idéia do sofrimento físico, que Satanás muitas vezes inflige, pode também
estar incluída no sentido. Paulo denominou a sua própria enfermidade de
“mensageiro de Satanás”. (II Cor. 12: 7). Satanás é o autor das doenças e
sofrimento. Portanto a pessoa (ímpia, o autor do incesto,
devia ser deixado sofrendo as conceqüências do seu procedimento indigno).
O espírito. Por ocasião da ressurreição os homens
receberão novos corpos. O corpo que agora temos voltará ao pó (Gên.3:19).
Seja salvo. A finalidade da sentença aqui descrita
é correcional. Isto era verdade também no caso de Himeneu e Alexandre, que
Paulo ‘entregou a Satanás’ para que aprendessem
a não blasfemar ( I Tim. 1: 20). A disciplina da Igreja destina-se a
despertar o transgressor. levando-o a reconhecer sua situação
perigosa e revelar-lhe a necessidade de arrependimento e contrição. Uma vez corrigido e humilhado
pela disciplina pode o pecador retornar a uma vida de virtude e fé. O alvo da
punição da igreja não deve nunca ser a vingança, mas recobrá-lo da ruína. O
membro excluído devia ser alvo de profunda simpatia por parte da igreja e
ingentes esforços deveriam ser feitos para conseguir sua restauração
espiritual (ver S. Mateus 18: 17; Rom. 15:1; Gál. 6:1-2; Heb. 12:13).”
Um ponto final poderia ser colocado neste comentário, pois creio que a
declaração de Paulo está bem clara, mas atendendo também àqueles, que gostam
de multiplicar exemplos comprovatórios, vamos transcrever o de M. C. Wilcox, do
livro Questions and Answers, pág. 179:
“É certo que a igreja de Deus, se ela está
na situação em que deve estar, é lugar sagrado, seguro, abençoado; mas uma
pessoa como a descrita em nosso texto perdeu todos os direitos à igreja, e o
Senhor queria que ele não continua-se sob a proteção da igreja. e
experimentasse o que significava
ficar fora e lutar sozinho contra Satanás. Isso devia a igreja fazer a fim de levar o pecador ao arrependimento, e
assim pudesse ser salvo — não salvo em
sua carne concupiscente, mas salvo em sua vida espiritual. A julgar pela
segunda epístola, parece claro que o homem se arrepende, e Paulo pede à igreja
que o receba, para que não seja devorado de demasiada tristeza. II
Cor.2:6-11.”
Da
expressão — “a fim de que
o espírito seja salvo no dia do Senhor”, o vocábulo espírito merece esta
referência.”
Os dicionários
gregos que mais se notabilizam, como os de Liddell e Scott, Arndt e Gingrich,
apresentam para a palavra “pneuma” além dos sentidos comuns de sopro, ar,
respiração, vento, vida, etc, o de ser vivente, pessoa.
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