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segunda-feira, 11 de abril de 2016

TEMAS DIFÍCEIS DA BÍBLIA - A DOXOLOGIA DO PAI NOSSO




A DOXOLOGIA DO PAI NOSSO


Denomina-se Doxologia do Pai Nosso a parte final da Ora­ção do Senhor, ou sejam as palavras: “pois teu é o reino, o po­der e a glória para sempre. Amém.”

Esta doxologia tem sido questionada pelos eruditos da Crítica Textual, mas como estamos acostumados a usá-la e diante da sua beleza e solenidade, parece ser quase temerida­de ventilar este problema. Mas sendo ele real, precisamos tra­tar dele realisticamente. O Pastor Cristianini a ele se referiu, em artigo no Ministério Adventista, Maio-Junho de 1972, páginas 16 e 17; posteriormente, pela mesma revista, Janeiro-Feverei­ro de 75, o Professor Aécio Cairus do nosso colégio irmão da Argentina, tocou na mesma tecla, reconhecendo que ela não foi ensinada por Cristo, mas talvez por predileção pessoal, in­siste que estas palavras não devem ser retiradas.

Apresentarei o problema, porque todas as pessoas esclare­cidas devem conhecê-lo evidentemente, deixando a cada um o direito de seguir a orientação que melhor lhe convier.

Sempre me lembro do incidente passado na sala onde Cris­to foi julgado, com um grupo de turistas e a freira que nos ori­entava.

Depois de interessante e útil palestra relembrando episó­dios do julgamento de Cristo, ela pediu que todos juntos can­tássemos um hino católico, que nós desconhecíamos. Pastor Vyhmeister, líder do grupo, atalhou incontinenti, sugerindo que todos recitássemos a Oração do Senhor, o que foi feito sob a liderança da freira. Chegando á expressão livra-nos do mal, ela silenciou, enquanto todos prosseguimos na doxologia. Sem dúvida ela estava mais certa do que nós.

Para melhor compreensão deste estudo, são necessárias algumas rápidas noções de Crítica Textual, como classificação dos manuscritos, seu agrupamento em famílias e o que é uma variante.


1.     Classificação de Manuscritos.

À medida que novos manuscritos iam sendo descobertos, os estudiosos sentiram a necessidade de classificá-los, visando facilitar seu estudo e referências posteriores.

A primeira classificação foi feita por Johann Jacob Wettes­tem, na introdução de uma edição critica do Novo Testamento Grego, publicado em 1751-1752. Ele classificou os manuscri­tos unciais conhecidos, pelas letras do alfabeto latino e os mi­núsculos pelos números arábicos 1, 2, 3, 4, 5 etc. Os papi­ros ainda não eram conhecidos no seu tempo. Posteriormen­te, Tischendorf e Von Soden, prosseguiram neste processo clas­sificatório, mas estes estudos foram colocados de lado, especial­mente o de Von Soden devido à complexidade do seu processo. A classificação aceita hoje, mundialmente, é a de Gaspar René Gregory, que nada mais é do que a ampliação do processo come­çado por Wettestein.

Tischendort introduzira as letras do alfabeto grego para os unciais, desde que as letras do alfabeto latino já não eram suficientes para os manuscritos conhecidos no seu tempo.

Em 1900, em virtude do número de manuscritos unciais, haver superado as letras dos alfabetos grego e latino, Gregory sugeriu que os unciais fossem designados por números arábi­cos, precedidos de um zero, para não haver confusão com os minúsculos.

O único manuscrito classificado com letra do alfabeto he­braico foi o sínaítico, que recebeu a letra alef, isto para desta­cá-lo dos demais, a pedido de Tischendorf.

Os papiros foram classificados com a letra P seguida de um número P1, P2, P3, P4, P5, P6.

Dos manuscritos unciais os mais conhecidos são estes:
        A               -    alef ou 01
        A    
—        alexandrino ou 02
        B     
—        vaticano ou 03
        C     
—        efraímita ou 04

O número aproxiamado dos manuscritos existentes é mais ou menos o seguinte:

Unciais 250, minúsculos 2.700, papiros 80, lecionários 2.000.


II.     Famílias de Manuscritos

Os manuscritos são classificados em famílias, levando-se em consideração as semelhanças ou diferenças que apresentam. A finalidade desta classificação foi descobrir os manuscritos

mais antigos, porque mais se deveriam assemelhar aos originais. S5o quatro as principais famílias de manuscritos:

a)     Bizantina com sede em Antioquia;
b)    Ocidental com sede em Roma;
c)    Alexandrina com sede em Alexandria;
d)    Cesareense com sede em Cesaréia.


III.    Variante.

É a maneira diferente da mesma passagem se apresentar nos manuscritos. Expressando-nos de outra maneira. Quando os manuscritos que contém a Bíblia em seu idioma original di­ferem entre si em algum pormenor, o modo diferente de cada manuscrito chama-se “variante”. A finalidade principal da Cri­tica Textual é concluir qual seja a melhor variante, indubita­velmente a que tem mais probabilidade de ser a original e au­têntica.

O Novo Testamento Grego, normalmente, traz uma fo­lha com o Aparato Crítico, conjunto de sinais indicando as mu­danças que copistas, algumas vezes intencionalmente, porém, muitas outras despercebidamente introduziram no texto que estavam copiando. É papel primordial da crítica textual de­tectar estas variantes, escoimando o texto das omiss5es, mu­danças ou acréscimos que por acaso tenham aparecido.

Após esta digressão pelo reino da Crítica Textual, faça­mos alguns comentários sobre o término do Pai Nosso.

Quase todas as Bíblias evangélicas registram estas palavras finais, enquanto as Bíblias católicas jamais perfilharam este ca­minho. Modernamente há a tendência de eliminá-la nas Socie­dades Bíblicas, como podemos notar na American Standard Version (1901), na The New English Bible (1970), e em O Novo Testamento Vivo. A Almeida Revista e Atualizada no Bra­sil e o Novo Testamento na Linguagem de Hoje a colocam en­tre colchetes, como indicação de que esta parte não se encon­tra no texto grego que serviu de base para a tradução.

A Crítica Textual, depois de um estudo minudente e cons­ciencioso, concluiu que ela apenas se encontra nos seis seguin­tes manuscritos unciais: K, L, W, deita, teta, e Pi. Os peritos nesta matéria estão bem cientes de que estes manuscritos, dos 252 existentes, não estão entre os mais significativos. Dos 2.700 manuscritos cursivos, apenas 19 apresentam a doxologia. Pou­cas das inúmeras vers5es antigas, como a siríaca, copta, latinas, etíope, armênia, egípcia, gótica a consignam. Diante desta rea­lidade os entendidos da Crítica Textual da Bíblia aconselham os tradutores a suprimirem difinitivamente a doxologia.

O Comentário Adventista segue orientação idêntica ao declarar:

“Esta cláusula apresenta a doxologia do Pai Nosso. Im­portante evidência textual pode ser citada em favor da sua omis­são. Não consta da versão de S. Lucas desta oração (S. Luc. 11: 4). Contudo, o sentimento que ela expressa é escriturís­tico, em estilo paralelo com I Crôn. 29:11-13.”


Como Surgiu a Doxologia?

Algum copista, conhecedores de outras orações que conti­nham esta terminação, e crendo que o Pai Nosso estava incom­pleto, achou por bem acrescentá-la, na página que estava co­piando. Outros copistas, observando que a doxologia dava real­ce e beleza à oração, seguiram a mesma trilha, fazendo assim com que ela fosse proliferando em vários textos gregos, até che­gar ao Novo Testamento Grego de Erasmo e ao famoso Textus Receptus. Os manuscritos usados por Erasmo, segundo os estudiosos foram 13, pertencentes à família bizantina, que con­tinha a doxologia. Os manuscritos cesareenses também a tra­zem, mas ela não se encontra nas outras duas famílias.

Os comentaristas têm chegado à conclusão de que a Ora­ção de Davi de I Crôn. 29: 10-19, onde há uma doxologia de­ve ter influenciado algum copista a colocar uma idêntica na oração de Cristo. Note bem as palavras dos versos 11 a 13.

“Tua, Senhor, é a grandeza, o poder, a honra, a vitória e a majestade; porque teu é tudo quanto há nos céus e na ter­ra; teu, Senhor, é o reino, e tu te exaltaste por chefe sobre to­dos.

“Riquezas e glória vêm de ti, tu dominas sobre tudo, na tua mão há força e poder; contigo está o engrandecer e a tudo dar força.

Agora, pois, á nosso Deus, graças te damos, e louvamos o teu glorioso nome.”

Uma outra semelhante doxologia, apenas mais reduzida, é encontrada em II Tim. 4:18, rezando assim:

“A ele glória pelos séculos dos séculos. Amém.”

Para concluir este comentário, quero acrescentar as pala­vras do Professor Aécio Cairus:

“Toda evidência textual a favor da doxologia pode, pois, reduzir-se a estas duas famílias: cesareense e antioquiense. Por exemplo, a mui autorizada versão Peshitto (siríaca) é tomada também de manuscritos antioquienses. O interessante é que estas duas famílias ‘mancam da mesma perna’: suas variantes têm a tendência de serem expressões mais polidas e literalmente mais elegantes que as de outros manuscritos. Como a doxolo­gia é um agregado que dá mais polimento e elegância ao Pai Nosso, o testemunho antioquiense e cesareense é suspeito. Por outro lado, os manuscritos ocidentais têm a tendência para va­riantes longas e intercalações, pelo que o seu silêncio aqui re­sulta em testemunho contra, bastante forte.

“Outra evidência externa confirma as primeiras impres­sões: a Didaquê, espécie de manual eclesiástico do segundo século prescreve belas liturgias para todas as ocasiões, com do­xologia muito semelhante a de que nos ocupamos. Quando cita o Pai Nosso, fá-lo com esta doxologia, e a área de influên­cia da Didaquê foi justamente a costa oriental do Mediterrâ­neo (incluindo-se Cesaréia e Antioquia). Daria a impressão de que as palavras com que finaliza o Pai Nosso em nossa Bíblia se originaram com esta liturgia e foram incluídas involuntaria­mente (pela força do constante ouvir) pelos copistas cesareen­ses e antioquienses nas Escrituras.

“Conquanto as evidências aqui apresentadas não sejam a rigor definitivas, ilustram muito bem princípios que convêm conhecer. De qualquer modo, não há porque interromper o costume de usar estas formosas palavras quando oramos. O co­mentário ou utilização que delas faz a Sra. White, só garantem a sanidade e veracidade declarativas não a origem ou canoni­cidade, a menos que queiramos canonizar também os escritos pagãos que Paulo cita, para exemplo. Mas nos dão razões de sobra para utilizar a formosa doxologia sem a qual, para os que estamos habituados a ouvi-la, o Pai Nosso perderia algo de sua sonoridade.” O Ministério, Janeiro—Fevereiro de 1975, pági­nas 13e 16.


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