INTRODUÇÃO
A actual festa de Natal celebrada no dia 25 de Dezembro, eracompletamente desconhecida dos primeiros cristãos até aproximadamente ao iniciodo IV século. O dia que acabou por ser aceite como dia mais importante nacelebração do calendário Cristão, passou despercebido aos cristãos dosprimeiros 3 séculos, estes não se reuniam nem mesmo para um culto, o nascimentode Jesus não era mencionado. No entanto apercebemo-nos que dentro do impérioRomano pagão, o 25 de Dezembro constituía uma das suas festas principais,consagrada ao culto do Sol.
Antes de ser escolhido o dia 25 de Dezembro como dia paracelebrar o nascimento de Jesus havia já uma outra data que relembrava em certamedida esta comemoração. No dia 6 de Janeiro era comemorado a manifestação deCristo a esta terra, sendo dado mais importância ao seu aparecimento do quepropriamente ao seu nascimento.
A DATA DO NASCIMENTO DE JESUS
Os autores dos evangelhos não mencionam o dia do nascimentode Jesus, e nós hoje, também não temos indicações de outras fontes que nospossam esclarecer ou dar a certeza da verdadeira data. Os textos que lemos noevangelho de Lucas dão somente uma referência, diz-nos que os “pastores dormiamnos campos” Lc 2:8. Indicação que nos leva a deduzir que o nascimento de Jesusterá ocorrido entre os finais de Março até ao mês de Novembro, tempo no qual ospastores da palestina ficavam a pastorear os animais do campo. Fora disto nãoexiste qualquer autoridade bíblica para determinar esta data.
Foi na falta de indicações que vários cristãos da antiguidadetentaram deduzir através de especulações pessoais, que não tinham qualquervalor histórico, ou muito menos reconhecidas pelos pais da igreja. Tratava-sese tentativas individuais de cálculos, que divergiam largamente umas dasoutras.
Um exemplo é a data de 28 de Março. Partindo do facto que nolivro de Génesis diz que Deus separou a LUZ das TREVAS, Gn 1:4. E que ambosforam separados com períodos de tempo iguais, nesse sentido o nascimento domundo aconteceu numa data onde o dia e a noite têm o mesmo tempo de duração, eno calendário romano o equinócio da primavera dava-se no 25 de Março, Logo se25 de Março era o primeiro dia da criação, e como o sol foi criado no quartodia, logo o 28 de Março representava o nascimento de Jesus, o Sol da nossaJustiça. Mal 4:2.
Outras datas foram surgindo dando como certo o nascimento deJesus na primavera, isto porque se cria que o nascimento do mundo tinhaacontecido nesta altura.
Um outro cálculo interessante, partindo ainda do 25 de Marçodava como certo o nascimento para o dia 25 de Dezembro, isto porque Jesus teriasido concebido na primavera e nove meses depois dava-se o nascimento.
Até meados do IV séc. não havia ainda um consenso no cálculoexacto deste acontecimento. Podemos compreender também que nesta altura aigreja não dava ainda importância capital a data do nascimento de Jesus. Porvolta do final do II séc. Clemente de Alexandria, zomba daqueles que tentamdeduzir por cálculos a data do nascimento de Cristo.[1]
A FESTA DA EPIFANIA (Aparecimento de Cristo)
Damos conta que os cristãos dos primeiros três séculos não sónão davam importância à data do nascimento de Jesus como também não sentiam necessidadede festejar o nascimento de Jesus à terra. Para eles mais importante que issoera a morte e ressurreição de Cristo. Os domingos passaram a ser consideradosimportantes pois relembravam a ressurreição do seu salvador, à parte havia aPáscoa como comemoração da morte e ressurreição de Jesus.
Mesmo no cristianismo primitivo as festas consagradas aosapóstolos e aos mártires se referiam à sua morte e nunca ao seu nascimento. Umdos pais da igreja de nome Origenes no inicio de III Sec. Protesta contra o hábitoque consistia em festejar o dia de nascimento, segundo ele isto não passava deum culto pagão, pois mesmo na bíblia só os pagãos é que festejaram o seunascimento[2](O caso do Faraó e de Herodes) Gn 40:20 -Mt 14:6.
No entanto e com respeito à pessoa de Cristo, não mais sepodia continuar nesta atitude, ainda para mais sendo Ele maior que os apóstolosou mártires. Embora o seu acto redentor se conclui na sua morte e ressurreição,a sua aparição neste mundo devia ser considerada como o primeiro acto salvador,ideia reforçada com o apoio bíblico de Mateus e Lucas que relevam esteacontecimento.
Foram sobretudo os cristãos do oriente que primeiro meditaramsobre o mistério da manifestação de Deus no mundo sobre a forma de uma pessoahumana. Havia então diversas formas de representar esse acontecimento. Haviamcristãos que admitiam que somente por ocasião do baptismo, é que o Cristodivino se manifestou nesta terra na pessoa de Jesus, e que a sua essênciadivina não possuiu mais do que temporariamente a pessoa de Jesus, e isto sóaconteceu depois do baptismo, no momento em que Deus disse “este é o meu filhobem amado”.
Por outro lado e mais tarde, segundo a concepção eclesiásticaortodoxa, defendeu que Deus se manifestou realmente na pessoa histórica deJesus no momento do seu nascimento. Foram estas e outras questões cristológicasque precederam a reflexão sobre a celebração da festa cristã do Natal.
Na sua obra STROMATA I, mencionada a cima, Clemente deAlexandria menciona que os discípulos de Basilides, que viveu em Alexandria nosegundo século festejavam a 10 ou a 6 de Janeiro o baptismo de Cristo.[3]
O nome dado à manifestação de Jesus sobre a terra por hora doseu baptismo foi tirado do Grego EPIFANIA, nesta ocasião ainda não se associavaao nascimento de Jesus.
Podemos perguntarmo-nos porquê o inicio de Janeiro maisprecisamente o dia 6? Na realidade adata do baptismo de Jesus biblicamente falando é tão omissa como é a donascimento, na realidade o dia 6 de Janeiro era festejado no mundo pagão comofesta em honra do deus grego Dionísio, festa relacionada com a longevidade dosdias, festejada também em Alexandria como o nascimento do Éon, nascido davirgem Coré. Este dia era igualmente consagrado a Osíris, pois era na noite de6 de Janeiro que as águas do Nilo recebiam um poder milagroso. Foi por isso queos discípulos de Basilides escolheram este dia para celebrar o baptismo deCristo, a fim de dar a conhecer aos pagãos que o ser divino se manifestouverdadeiramente nesta terra e que Cristo nas águas do Jordão faz a suaaparição.
Constata-se que na metade do IV séc. a igrejafestejava a epifania no dia 6 de Janeiro e que já nesta altura esta festareunia não somente o baptismo, mas agora também o nascimento de Cristo. Daantiga festa do baptismo nada foi tirado, foi simplesmente acrescentado onascimento. Esta festa era dividida em duas partes, na noite de 5 festejava-seo nascimento, e no 6 o baptismo. Podemos dizer então que antes de celebrar oNatal no dia 25 de Dezembro, era em Janeiro que o nascimento de Cristo começoua ser festejado.
Este dado confirma-se pelo achado de um papiro[4]datando do IV século que não só continha informação da data como uma liturgiacompleta da noite de Natal.
De uma outra fonte vinda da Síria, chega-nos a descriçãodesta mesma festa por um tal de Éphrem[5],pai da igreja que viveu no IV Sec. Este chama a festa do 6 de Janeiro a maissublime de todas as festas cristãs, ele menciona que neste dia todas as casasestavam ornamentadas de coroas, e que este dia era vivido com muita alegria portoda a igreja, de forma especial ele descreve também a bonita festa nocturna, eno dia seguinte à adoração dos reis magos e o baptismo de Cristo no Jordão.
Podemos dizer com relação ao resumo destas e outras fontessobre esta festa, que havia muita luz, a adoração dos magos, baptismo de Jesus,e que em certa forma os pensamentos cristãos que giram à volta do Natal do 25de Dezembro eram já experimentados pelos primeiros cristãos na celebração daEpifania.
A questão de saber se Cristo realmente nasceu no 6 de Janeirotinha um papel secundário na celebração desta festa. O pensamento residia noacontecimento e não na data. Isto permitiu de uma forma imperceptível que sealterasse e que também fosse aceite outro dia desde que se mantivesse aquiloque era importante, ou seja o acontecimento.
A FESTA DO 25 DE DEZEMBRO
Não existe nenhuma certeza a nível histórico que certifique omomento em que a celebração da festa da epifania e do nascimento de Cristo se começarama festejar separadamente. Sabemos que no ano 336 na cidade de Roma estarealidade era já vivida[6].Possivelmente um dos grandes impulsos para esta separação teve a ver com oconcilio de Niceia em 325, onde a questão teológica foi debatida, sendodefendido pela igreja que Cristo era Deus desde o nascimento e não somentedepois do baptismo. Nesta altura mais do que uma questão de data, o importanteera evidenciar o nascimento em detrimento da noção de somente depois dobaptismo. Poderemos mesmo dizer que a questão debateu-se na base teológica.
Havendo necessidade de separar os dois acontecimentos eaproveitando a data das festividade pagã da adoração ao deus sol, o ImperadorConstantino entendeu unir o culto solar ao culto cristão.
Um dos principais argumentos a favor desta ligação da festapagã da adoração do sol, com a celebração Cristã do nascimento de Jesus, era o elementoluz, relembrando as palavras de Simeão que estava no templo por ocasião daapresentação de Jesus quando afirma: “porque os meus olhos já viram a tuasalvação,… Luz para a revelação aos gentios e para glória do teu povo deIsrael.”Lc 2:30-32.
E ainda o texto de Malaquias 4: 2 onde nos diz referindo-se aCristo que ele seria o sol da justiça.
Contudo embora as duas festas tivessem sido fundidas numa só,houve da parte de alguns responsáveis da igreja alguma rejeição, alertando os fiéispara não confundirem nem adoptarem costumes pagãos. Dois casos concretosilustram esta realidade, um de Agustinho e outro do papa Leão o grande.
“ Agostinho exortava os cristãos a não adorarem neste dia osol, como os pagãos mas a adorar Àquele que o criou[7]”
“ O papa Leão Grande reclamava com a fé errada daqueles que nonatal festejavam o nascimento do sol em vez do nascimento de Cristo.[8]”
Com este tipo de argumentação apercebemo-nos que a igrejatinha noção daquilo que o 25 de Dezembro representava no mundo pagão.
Embora o imperador Constantino ex. pagão tenha se convertidoao cristianismo abolindo os oráculos pagãos, os sacrifícios privados e cultosimorais praticados nos templos, nunca deixou de favorizar o culto ao sol, umexemplo claro disto foi quando mandou fazer duas estátuas que o representavamcom raios do sol, a quais continham uma inscrição que dizia: “ A Constantinoresplandecente como o Hélios”.
Foi na mesma linha de pensamento que ele mandou no ano 321que todos os cristãos adoptassem o domingo como dia semanal de repouso, dia esteque semanalmente os pagãos cultuavam o sol. A desculpa encontrada para conjugara ligação dos cultos, foi o argumento que no domingo Jesus ressuscitara, porisso a importância que o próprio Cristo dera ao domingo devia fazer deste dia,o que ficou conhecido como “o dia do senhor”[9].
A PROPAGAÇÃO DA FESTA DO 25 DE DEZEMBRO.
É importante perceber como é que a partir da segunda metadedo século IV, a festa do 25 de Dezembro se espalhou desde a cidade de Roma paratodo o mundo Cristão.
Na verdade não foi tão fácil a aceitação do 25 de Abril comoa data da celebração do nascimento de Cristo, houve da parte de muitos cristãosalguma residência em aceitar tal data, sobretudo porque estava ligada ao diapagão da adoração do sol. Outros continuaram a festejar o nascimento no dia 5de Janeiro e o dia 6 a adoração dos reis. Na síria e em Antioquia, aresistência mantinha-se chegando mesmo ao ano 375 sem que o dia fosseunanimemente aceite.
Mas subitamente as coisas mudaram, com o aparecimento de umgrande pregador chamado Crisóstomo, e com o seu famoso sermão de Natal de 20 deDezembro de 386 que muitos da sua igreja foram convidados 5 dias depois apoderem celebrar o nascimento de Jesus, e com esta liturgia, alguns documentosforjados e palavras persuasivas, convenceu o seu auditório a crer com toda acerteza que Cristo nascera nesse dia
Outros pregadores eloquentes em outras partes do mundoantigo, acabaram por fazer o mesmo tipo de trabalho, em Constantinopla no ano379 por Gregório de Naziancio, passando pelo Egipto e chegando mesmo a Jerusalém,tendo aí uma maior resistência.
Nos nossos dias a igreja católica, as igrejas protestantes,algumas ortodoxas caucasianas, como as de Constantinopla, Alexandria,Antioquia, Romena, Chipre, Grécia, Finlândia, festejam no 25 de Dezembro. Noentanto existem outras igrejas ortodoxas, como as de Jerusalém, Rússia, Servia,Bulgária, Geórgia, Polónia, e Checoslovaca, que festejam no 6 de Janeiro.
CONCLUSÕES
1- Aofestejar o nascimento de Cristo no dia 6 de Janeiro ou no 25 de Dezembro, oscristãos não celebravam nem celebram uma data reconhecida historicamente comosendo exacta, mas celebravam uma realidade importante, a manifestação de Cristoneste mundo.
2- Oimpulsionamento na obediência de celebrar o nascimento de Cristo, não veio doexterior, mas proveio de reflexões teológicas cristãs que evidenciavam o actosalvador de Cristo, em se despojar da sua divindade e se tornando homem.
3- Podemosconsiderar que o nascimento de Cristo, e a celebração deste nascimento estáperfeitamente enquadrado na fé neo-testamentária, sendo objecto duma festaeclesiástica.
4- Éimportante também perceber que a festa da epifania era vivida por motivosespecificamente cristãos, o pensamento central desta liturgia residia no factoque Cristo penetrou nas trevas como sendo a luz do mundo, argumento mais do quebíblico e que não se originou de forma alguma da festa do culto do sol. Nem nafesta pagã do solstício celebrada no dia 6 de Janeiro.
5- Finalmentepodemos perceber que houve um aproveitamento do imperador Constantino de podermesclar a datas pagãs com datas cristãs, tendo mesmo assim sofrido algumaresistência, por parte de muitos cristãos. Hoje dentro do cristianismo aceita-seo 25 de Dezembro, talvez com o mesmo espírito dos primeiros cristãos, ou seja adata não é o mais importante, mas o que importa é não passar está quadra semnos lembrarmos que o rei do universo nasceu viveu e morreu por cada um de nós.
FIM
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[2] Commentaire sur Mathieu XIV, 6 (Éd. Klostermann,p.30); « Sources chrétiennes» 162, Paris, 1970, p. 249. Voir aussiHomélies sur le Lévitique, VIII, 3; « Sources chrétiennes » 287 Paris,1981, p. 17.
[3] CLEMENT D’ALEXANDRIE, Stromata I,21 – 145,5 (Éd.Stahin,p.90), “Sources chrétiennes”, 30 Paris, 1951, p. 150
[4] Publié par G.BICKLELL no Mittheilungen aus der Sammlung der Papyrus,Erzherzog Rainer Rainer, 1887, t. II, p. 83-86. Ver USENER, Das Weihnachtsfest,2ª éd., 1911, p. 196.
[5] THOMAS J. LAMY, Ephraemi Syri Hymn et sermones, t. I, 7882. Outros DeNativitate domini sermones publicados por PETRUS MOBAREK (Benedictus); verUSENER, p. 202, n.9.
[6] A Chronographie de Filacalus de 354 (TH. MOMMSEN, Uber den Chronographen vonZahre 354 ; 1850, t. I, p. 631)
[7] Sermo in Nat. Dom. 7 et Sermo In Nat. Zoh. Bapt. PL, t. 38, 10007 et 1302
[8] Sermon XXVII, PL, t. 54. Voir “Sourceschrétiennes” 22 bis, Paris, 1964, p. 157 s.
[9] Notapessoal ”antes desta proposta, o sábado continuava a ser o dia de repouso paraos cristãos, não havendo argumentação nem autorização escriturística para oalterar.”
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