A MULHER IDEAL: UMA REFLEXÃO HOMILÉTICA
INTRODUÇÃO
Este
artigo tem como tema de estudo a mulher ideal. Se você tivesse que opinar a
respeito, o que diria? Como a descreveria? Destacaria seus atributos físicos
como medidas, cor de pele, de olhos ou de cabelo? Ou valorizaria bastante suas
habilidades e qualidades morais? Ou salientaria sua posição social, sua
educação e seus recursos financeiros?
Na
Bíblia Sagrada, Deus nos deixou uma descrição da mulher ideal. Ela se encontra
em Provérbios 31:10-31. É apresentada na forma de uma poesia acróstica com
vinte e dois versos, cada um contendo duas linhas poéticas. Para facilitar a
memorização do poema, cada verso começa com uma das vinte e duas letras do
alfabeto hebraico, na devida ordem. É claro que na tradução isso se perde.
A
mulher aqui retratada é uma dama de certa posição, que além de diversas
habilidades, possui servas a seu dispor e dinheiro para investir. Por essa
razão, relativamente poucas mulheres possuirão seu padrão de vida e poderão
realizar o que ela faz. Contudo, precisamos saber também que, sendo um livro de
religião prática que trata da conduta, Provérbios tem o propósito de demonstrar
os resultados da fé em ação1.
Portanto,
ao apresentar várias amostras de comportamento, recomenda que aquelas que
demonstram sabedoria sejam imitadas, tanto quanto possível. Assim, nesse relato
da mulher ideal, existem alguns aspectos que servem como modelo para as demais
mulheres, não importa a época ou o lugar em que vivam. Vamos examiná-los.
1.
A MULHER IDEAL É UMA BOA ESPOSA
O
texto inicia designando-a como “mulher virtuosa”, embora algumas traduções
bíblicas prefiram a expressão “uma esposa excelente”2, que reflete, de modo
mais abarcante e fiel, o que o autor pretendia dizer. Como esposa exemplar, por
meio de palavras e ações, ela faz bem a seu marido e não o mal (v. 12). Não é
implicante, nem crítica, mas fala com sabedoria e bondade (v. 26). Também não o
pressiona para gastar mais do que tem, nem esbanja o que possuem. Trata-o com amor,
atenção e respeito, sempre e não conforme o humor do momento3.
A
conduta dela demonstra que em seu lar não há batalha entre os sexos. Seu estilo
de vida coopera para que ele seja respeitado, estimado e bem-sucedido na
comunidade. De fato, seu marido é um dos mais nobres homens do lugar e se
assenta como um dos juizes nas portas da cidade (v.23). Por tudo isso, ela
conquistou a total confiança dele (v. 11). Tal descrição tem por objetivo
mostrar as qualidades de uma boa esposa, para estímulo das próprias mulheres, e
para indicar aos homens o perfil de companheira que devem buscar para esposa4.
2. A MULHER IDEAL É UMA BOA DONA-DE-CASA
A Bíblia de Jerusalém, considerada como a melhor tradução
para a língua portuguesa, traz o seguinte título para este texto: “A perfeita
dona de casa”. Embora a espécie de responsabilidades das mulheres difira de
acordo com sua condição na sociedade em que vive, cada mulher tem o seu
trabalho. Nos tempos antigos, até uma princesa fazia trabalhos domésticos.
A mulher virtuosa não pensa que as deveres domésticos sejam
um fardo, uma eterna mesmice, um tédio, antes, trabalha com coragem, entusiasmo
e persistência. Possui uma mente bem disposta e mãos diligentes5. O lar é sua
esfera de ação e sua missão é tornar seu lar feliz6. Ela não é preguiçosa (vs.
4-6, 27), pois se levanta cedo e trabalha o dia inteiro (vs. 15, 18). Além
disso, é precavida (vs. 4 e 7) e confiante (v. 7).
Ela tem muita saúde e força de vontade. É determinada, tem
iniciativa (vs. 17, 25) e sabe administrar bem seus recursos de maneira a gerar
novas riquezas. Com o dinheiro que adquiriu com seu trabalho compra um pedaço
de terra e o limpa e nele planta vinhas, o que o torna mais valorizado (vs. 16)7.
Além disso, administra bem sua casa. Distribui a tarefa entre os criados (v.
15) e não deixa faltar o agasalho (v. 21).
Como naqueles tempos, não era fácil encontrar roupas prontas
para comprar e se tornava muito dispendioso contratar alguém para
confeccioná-las, esperava-se que a esposa fosse uma boa costureira, preparando
tanto as roupas comuns como aquelas usadas em dias especiais. Essa habilidade,
que era ensinada de mãe para filha através das gerações8, é uma das qualidades
da mulher virtuosa. Logo, suas roupas são luxuosas, feitas de ótimos tecidos e
belas cores e sua casa é um lugar belo e atrativo, enfeitado com tapetes e
cobertas coloridas no chão, nas paredes e nos leitos, como era o costume das
famílias ricas nos países do oriente (vs. 21-22) 9.
Ela também não deixa faltar mantimento e, como um navio
mercante, faz provisão de tudo que é necessário para sua família (v. 14). Não
se preocupa com o dia de amanhã (v. 25) porque tem em sua mente o consolo e a
satisfação de quem cumpre seu dever. Em sua velhice se alegrará de haver sido
diligente em sua juventude10. É verdade que desfruta de muitas coisas boas,
todavia, tudo foi conseguido com muito esforço e trabalho duro.
3. A MULHER IDEAL É ESPIRITUAL
Quando esteve aqui na Terra, Jesus ensinou que nosso dever
mais importante é amar a Deus de todo o coração e ao próximo como a nós mesmos
(Mc 12:29), o que indica, entre outras coisas, o amor a si mesmo é parte
integrante da vida de um cristão. Também o é de uma personalidade
emocionalmente equilibrada. Quem não gosta de si mesmo está em dificuldades e
não poderá amar seu semelhante, como Deus deseja. A mulher desse relato é
espiritual e, como tal, ama a Deus, ama a si mesma e ama ao próximo.
“Ela se relaciona bem com Deus” (vs. 8 -10). Abriga em seu
coração o temor do Senhor e esse é o segredo de sua vida exitosa. Mas o que
significa temer a Deus? Ao longo do texto sagrado o temor do Senhor é
apresentado como algo positivo, benéfico e imprescindível para a formação de um
caráter cristão. Ter o temor do Senhor abrigado em nosso coração significa
conhecê-Lo (Pv 2:5; 9:10), o que nos levará a admirá-Lo por Sua grandeza, por
Seu caráter, pelo que Ele é e pelo que tem feito (Sl 33:4-8), a reverenciá-Lo
(Hb 12:28) e louvá-Lo (Sl 22:23; 115:10, 11, 13; Sl 118:3-4), a confiar Nele
(Sl 115:11) e a Ele nos submeter, obedecendo com alegria aos Seus mandamentos
(Sl 112:1)11. A mulher ideal tem esse tipo de relacionamento com Deus. O temor
do Senhor é seu valor primordial e o que dá verdadeiro valor a todas às demais
virtudes12.
“Ela se relaciona bem com seus semelhantes” (vs. 8 e 13). No
relato, nós a vemos cuidando bem de sua família, dos criados e até dos pobres
de sua comunidade. Freqüentemente o sucesso financeiro das pessoas também
conduz a uma completa falta de compaixão pelos menos capazes e pobres. Mas não
nesse caso. Essa mulher se preocupa com eles e os socorre em suas necessidades13,
sendo generosa para com eles. Além disso, ela atua como mestra, aconselhando e
ensinando sabedoria, não de forma crítica ou áspera, mas com a bondade do céu
(v. 26).
“Ela está de bem consigo mesma” (vs. 8 e 13). Isso pode ser
constatado porque ela, além de valorizar o que é bom e belo, é vigorosa no
corpo, elegante no vestir-se, digna,
animada e bondosa em seu
comportamento e devotada e honrada em sua religião. Enfim, cultiva todas as
excelências femininas14.
4. A MULHER IDEAL É BEM-SUCEDIDA
Ela é o deleite de sua família. Seu marido a considera a
melhor mulher do mundo, e diz isso a ela, enquanto que seus filhos não se
cansam de elogiá-la (vs.28-29). Não há conflito de gerações em seu lar. Ela tem
sucesso na vida e sucesso no lar15.
Ela colhe o que semeou (v. 31). Uma das grandes leis da vida
é que colhemos o que semeamos (Gl 6:7). Cada dia, cada momento, por meio de
nossas palavras, de nossas ações, de nosso comportamento, estamos semeando
sementes do bem ou do mal e, mais cedo ou mais tarde, haveremos de colhê-las;
freqüentemente aqui mesmo, nesta vida. A mulher ideal semeou sempre e somente o
bem e, agora, é retratada como a colher o que lhe é devido. É respeitada,
apreciada e elogiada pelo marido, pelos filhos, pela comunidade e, mediante as
Escrituras, pelo próprio Deus.
CONCLUSÃO
Ao descrever a mulher ideal, o texto nada diz quanto à sua
aparência física. Não diz se é alta ou baixa, robusta ou esguia, se é loira ou
morena, se os seus olhos são azuis, verdes ou castanhos, porque embora os
aspectos físicos possam ter os seus encantos, a beleza, a graça e o charme são
passageiros e de pouco valor, quando comparados com a beleza moral. “Elegância
de formas, simetria na fisionomia, dignidade nas maneiras, beleza no rosto,
todas essas coisas são vãs. A enfermidade as deforma; o sofrimento as macula e
a morte as destrói”16. Em contraste com aqueles valores encantadores na
aparência está o verdadeiro valor, o temor do Senhor, que é o lema do livro de
Provérbios.
Embora muitos provérbios deste livro tenham sido sobre
mulheres de vida imoral e mulheres contenciosas (2:16; 3:3-13; 6;24-25; 11:22;
21:9, 19; etc.) , cuja companhia é indesejável, suas últimas palavras são um
elogio às mulheres virtuosas. Este texto é um verdadeiro espelho para as
mulheres cristãs, que seriam ricamente abençoadas se freqüentemente olhassem
para ele.
Mas, por que Provérbios, escrito, sobretudo, para os homens,
termina exaltando a mulher virtuosa? Primeiramente porque é um livro sobre
sabedoria, que aqui é personificada como uma mulher, por um lado porque é um
nome feminino e, por outro, porque a mulher é um excelente exemplo da variedade
de aplicações práticas da sabedoria. Esta é melhor ensinada e vivida no lar e
resulta numa vida equilibrada, e que é dada atenção aos assuntos domésticos bem
como aos empreendimentos dos negócios e às obras de caridade, e nos inspira a
sermos fervorosos no uso do tempo e dos dons que Deus nos deu, de modo que
outros também sejam beneficiados por ela.
Desse modo, vemos a sabedoria em ação no dia-a-dia e assim
captamos lições concretas e não apenas a teoria. Ao mesmo tempo este poema vai
de encontro à literatura do mundo antigo, que costumava ver a mulher
simplesmente como algo decorativo, com charme e beleza, mas sem substância, e
constitui-se num modelo para aqueles, homens e mulheres, que desejam
desenvolver uma vida de sabedoria17.
Em segundo lugar, uma vez que a sabedoria aqui ensinada se
origina no temor do Senhor, que é o tema de Provérbios, o livro encerra com o
exemplo prático de alguém cuja virtude principal é justamente o temor do
Senhor. De fato, Provérbios, que depois de uma breve introdução na qual são
mencionados os objetivos do livro e seu público-alvo (1:1-6), começou com o
temor do senhor (1:7), e depois retornou a ele diversas vezes (1:29; 2:5; 8:13;
9:10; etc.), agora termina com uma mulher que o possui (31:30) e que por isso
também revela aquelas qualidades que foram exaltadas por todo o livro e é
apresentada como um exemplo a ser seguido.
E, finalmente, porque de todas as pessoas com quem um homem
se relaciona, quem mais pode contribuir para que em sua vida ele reflita as
orientações do livro de Provérbios e se torne um sábio é a mulher temente a
Deus: primeiro na qualidade de mãe e, depois, de esposa. Portanto, a descrição
da mulher virtuosa encerra com “chave de ouro” as instruções precedentes,
dedicadas todas ao homem18 e nos ensina que Deus quer que cada mulher de Sua
igreja tenha o Seu temor no coração e dê prioridade em conquistar aquelas
qualidades
que o céu aprova. Deseja que não viva para si, mas que a sua
influência de modo a beneficiar a todos que puder.
FONTE: Emilson
dos Reis
NOTAS
DE REFERÊNCIA
1 Virgínia Everett Davidson, “Provérbios que servem de
orientação”, Lição da Escola Sabatina – Adultos, 4º Trim. (Tatuí, São
Paulo: Casa Publicadora Brasileira, 1991), 3.
2 Derek Kidner, Provérbios – introdução e comentário,
Série Cultura Bíblica (São Paulo: Vida Nova e Mundo Cristão, 1980; reimpresso
em 1982), 92 e 177. A expressão hebraica para “mulher virtuosa” inclui
prudência, fidelidade, laboriosidade, generosidade e iniciativa. – Matthew
Henry, Comentário exegético-devocional a toda la Biblia, 13 vols.
(Viladecavalis, Barcelona: CLIE, 1988), 2:374.
3 Ibid.
4 Ibid., 2:373.
5 R. N. Champlin, O Antigo Testamento interpretado
versículo por versículo, 7 vols. (São Paulo: Hagnos, 2001), 4:2693.
6 Joseph S. Exell, The Biblical Illustrator, 23
vols. (Grand Rapids, Michigan: Baker Book House, s. d.), 5:688.
7 F. D. Nichol, ed., Seventh-day Adventist Bible
Commentary [SDABC], 7 vols. (Washington,
DC: Review and Herald), 1953-1957, 3:1070. Nos tempos antigos, muitas
atividades econômicas eram parte das funções de uma mulher, como esposa e mãe:
prover alimento e vestuário para a família e para si mesma, engajar-se em
compra e venda e efetuar negócios que requeriam prudência e bom gerenciamento.
– The Interpreter’s Bible, 12 vols. (Nashville, New York: Abington
Press, 1955), 4:956.
8 Champlin, 4:2693.
9 Ibid., 4:2694
10 Henry, 2:375-376.
11 Emilson dos Reis, “Temor e medo de Deus: um estudo
homilético sobre a relação com o divino nas Escrituras”, Parousia, 2°
semestre de 2004: 64-65.
12 Henry, 2:375.
13 SDABC, 3:1071.
14 Exell, 5:688-690.
15 Na tradição judaica, este poema era recitado pelos
maridos e pelas crianças na hora da refeição na sexta-feira à noite. – Frank E.
Gaebelein, ed., The Expositor’s Bible Commentary [TEBC], 12 vols. (Grand Rapids,
Michigan: Zondervan Publishing House, 1991), 5:1128.
16 Adam Clarke, citado em Champlin, 4:2695.
17 TEBC, 5:1130.
18 Henry, 2:372.
FIM
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